22/11/2011
O Festival da Internacional Cultura Digital acontece entre os dias 2 e 4 de dezembro, no Rio de Janeiro. Realizado em 2009 e 2010 com apoio do Ministério da Cultura, o festival hoje é apoiado pela Petrobras e, principalmente, tem suas próprias pernas e se articula com os coletivos de cultura digital de todo o país. Com participação livre e gratuita, traz, este ano, uma mostra de experiências com mais de 100 projetos. São iniciativas escolhidas por uma chamada pública, entre quase 400 propostas enviadas por pessoas de mais de 20 países em todos os cinco continentes. Também vai haver debates, palestras, performances, exibições e encontros de comunidades como a Transparência Hacker — que vai de Ônibus Hacker para o Rio de Janeiro.
O que todo este povo estará fazendo lá? Criando o mundo do pós-digital, onde o digital está por todos os lados e pode, muito mais que consumido, ser usado para criar coisas, revolucionar a função da propriedade intelectual, ampliar o acesso e a troca de conhecimento, ser usado para entender o mundo e atuar sobre ele. Veja um pouco do que deve acontecer no início de dezembro, no Rio de Janeiro, na entrevista abaixo com Felipe Fonseca, o efeefe, um dos curadores do festival. Neste Video para Dançar vocẽ também pode entrar no clima do evento.
ARede – Muitos labs vão participar este ano. Nesse sentido, parece que todas aquelas coisas das quais vocẽ fala há algum tempo — Rede//Labs, pós-digital, DIY, internet das coisas — se espraiaram pelo festival? Mudou a maneira de ver as coisas que havia até ano passado?
Efeefe – Vejo as duas coisas… uma delas é que tem mais gente pensando e criando espaços ligados à cultura digital que se aventuram mais pela experimentação, em vez de ficarem só no acesso ou no “estúdio multimídia”. Tem uma coisa aí de imaginário, de mais gente pensando além do conteúdo e entendendo a rede como terreno fértil para interferir nos futuros nos quais vamos viver.
Acho que muita coisa mudou nesse ano, para o bem e para o mal. Talvez seja possível interpretar que uma das consequências positivas e inesperadas da reviravolta no Ministério da Cultura foi que muitos grupos independentes precisaram correr atrás de autonomia, e nessa busca – mesmo que conturbada e precária -, voltaram a refletir sobre o a própria vocação e posicionamentos.
ARede – Tem muita diferença entre o que os projetos brasileiros estão vendo e o que os internacionais estão vendo? Quais?
Efeefe – Os cenários são radicalmente diferentes. Por aqui estamos em plena disputa de modelo de desenvolvimento, nessa coisa de capitalismo tardio, de emergência de uma nova classe média. Existe a sensação de que estamos crescendo, e isso nos dá um monte de horizontes, de maneira até um pouco caótica. Sentimos que o campo está aberto, mas também sentimos na pele as grandes disputas acontecendo – grupos de mídia, a briga do direito autoral, o atrito no PNBL.
Acho que estamos nessa corda bamba entre o otimismo ufanista e uma sensação de que estão nos sacaneando. Dos projetos brasileiros selecionados, tem as usuais iniciativas compensatórias (inclusão digital, etc.), mas começam a surgir coisas experimentais (labs, oficinas, etc. – Cotidiano Sensitivo, Lab Macambira, e muitos outros), alguns de empreendedorismo baseado em tecnologias livres (Brasuino, etc.) e outros de posturas ou estruturas críticas do desenvolvimento dependente (Meganão, Fora do Eixo, etc.).
Uma coisa especial ali é o Lab de Cartografias Insurgentes, que está trabalhando todo o ferramental de mapeamento e afins para apoiar grupos sociais penalizados com a transformação do Rio em atração turísitca mundial com os megaeventos que vêm por aí.
Os europeus estão em outro momento, vivendo a pura crise – e aí pode ter uma coisa crítica muito mais forte do que temos por aqui, com a galera do FCForum por exemplo, ou projetos como o Protei, que criou estruturas móveis para limpar o vazamento de óleo do Golfo do México e agora está sendo adaptado a outros contextos etc. Tem também a conversa sobre a emergência da Internet das Coisas, e como influenciar para que não seja dominada somente pelos interesses das corporações. São realmente diversos projetos, mas sinto que os brasileiros ainda têm essa pegada mais otimista, até pelo momento histórico.
ARede – Além de muitos labs, tem coisas bem legais! Lab100linhas e Gerador de Energia com Lixo Eletrônico, por exemplo. O medidor de qualidade do ar. Waste2NO. Sonhando Satélites. Enfim, formas de olhar e interferir no mundo. Isso é outra marca de parte dos projetos?
Efeefe – Já venho falando essa coisa de emergirem usos das tecnologias que não se baseiem só em nego sentado usando o orkut… Essa pegada para a qual eu tô pegando emprestado um termo recente do WIlliam Gibson, eversão – http://desvio.cc/blog/evertendo-gibson . Esse é o próximo passo, as redes aparecerem na vida que passa longe dos computadores, e interferirem nela.
ARede – Há também projetos que têm a ver com espaço, mas de outra maneira. Alguns, com vigilância na rede e fora dela — Agentes Invisíveis, Alerta Móvel de Contra Vigilância. E tem os que pensam as cidades e mapas. Dream Machine, Vurb, Internet of People. E tem as cartografias, as mais variadas formas de mapear coisas, pessoas, cidades… O que essas experiências podem dizer a uma cidade que vai sediar grandes eventos? Além desse óbvio link, o que elas dizem sobre o uso das tecnologias para se apropriar do espaço físico?
Efeefe – Ops, cheguei a comentar acima. Tenho certeza que as redes vão aparecer cada vez mais até como infraestrutura urbana, que gera dados públicos, que pode dinamizar um monte de processos que a gente ainda nem imagina. A principal disputa aqui é sobre como vão se desenvolver essas coisas – se vão pelo lado proprietário, fechado, restrito; ou se definem um caminho de abertura e participação pública. Eu acredito que pela relativa novidade desses assuntos no Brasil e pelo nosso histórico recente, temos condições de liderar essas conversas e dar exemplo para o mundo. Mas ainda falta entender melhor essas coisas e explicitar essa potencialidade. Acho que o Festival pode ser uma boa oportunidade pra isso.
ARede – O que vc mais gosta na seleção?
Efeefe – O Lab que tô montando 😉
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