O projeto Casulo leva oficinas culturais para os bairros Real Parque
e Jardim Panorama, na cidade de São Paulo, para formar futuros agentes
de transformação que colaborem no desenvolvimento de suas comunidades. Fabiana Veríssimo de Alencar*
Os projetos sociais que têm o
objetivo de apoiar comunidades carentes na zona sul, inevitavelmente se
instalam no Jardim Ângela e no Capão Redondo, regiões da cidade de São
Paulo que ganham muita visibilidade devido ao grande sensacionalismo da
mídia. Esse sensacionalismo acaba tirando a visibilidade de outras
regiões igualmente carentes e necessitadas de recursos.
É o que acontece com as comunidades do Real Parque e do Jardim
Panorama, que ficam situadas na região sudoeste de São Paulo. Pelo fato
de se localizarem próximas à região do Morumbi, nunca tinham sido
atendidas por políticas públicas ou programas sociais, até a chegada do
Casulo.
Guiné: Jovens realizam
ações nos CEUs e casas
de cultura.
O projeto Casulo, fundado em 2003 por um grupo de empresários paulistas
do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), é um programa de
desenvolvimento comunitário que, tendo o jovem como agente estratégico
de transformação, tem a intenção de colaborar para desenvolvimento
local.
O seu público alvo são jovens de 12 a 24 anos e o Casulo aposta que,
por meio das oficinas culturais que são a sua porta de entrada, eles
possam ampliar o seu olhar e serem futuros multiplicadores, através de
ações culturais de intervenção na comunidade, elaboração e
implementação de projetos.
Wagner Luciano da Silva, o Guiné, de 31 anos, coordenador geral do
Casulo, e Luis Fernando Guggenberger, 26 anos, coordenador de
desenvolvimento institucional, falam um pouco sobre os resultados que o
Casulo tem apresentado na comunidade e entre os jovens. Segundo Guiné,
“os resultados são vistos devido à nova postura dos jovens no que diz
respeito à articulação de ações culturais que eles vêm desenvolvendo em
outros espaços como os Centros Educacionais Unificados (CEUs) e Casas
de Cultura.”
O coordenador acrescenta que eles desenvolveram um trabalho de pesquisa
para entender um pouco mais a comunidade, porque o Real Parque e o
Panorama são escondidos pelos dados por fazerem parte de uma região que
tem o maior PIB do país. “O jovem começa a entender que a região dele
não é atendida por políticas públicas ou projetos sociais por conta
disso,”diz Guiné.
As oficinas realizadas no Casulo são de teatro, danças brasileiras,
grafite, hip hop, break, percussão, comunicação comunitária dentro do
espaço multimídia, produção de texto, vídeo, inclusão digital, formação
em software livre e administração de sistemas de segurança.
O Jovens Urbanos, idealizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas em
Educação, Cultura e Ação Educativa (Cenpec) e Itaú Social, funciona
dentro do espaço multimídia, onde os jovens tiveram uma capacitação e,
depois, pensaram um projeto de intervenção social. Um foi o do Rádio
Poste e o outro o do Jornal Inter Comunitário. Segundo Guiné, “o Casulo
atua a partir das demandas que o jovem traz”.
O projeto foi criado em 2003,
por empresários paulistas
“A Rádio Poste surgiu como referência do Educom.Rádio. A idéia era ter
um equipamento que fosse portátil para ser levado pros becos e vielas
do Real Parque e Jardim Panorama. Funciona por meio de uma antena que
transmite as ondas da programação para duas caixas que ficam
distribuídas em pontos estratégicos da comunidade e tem um receptor
para receber essa onda e exibir a programação da rádio. A vantagem é de
fugir um pouco da legislação. Já que se trata de uma Rádio Poste, então
não interfere no dial”, explica Guiné.
Dentro do espaço multimídia, um grupo de jovens foi capacitado para
trabalhar na parte de comunicação do projeto, onde eles mesmos
desenvolveram o folder institucional do projeto, sites, atividades com
software livre e a parte gráfica.
“Estamos falando de um projeto que tem a intenção de transferir a sua
gestão para a comunidade. Na comunicação, a gente percebe alguns jovens
que têm talento para, no futuro, atuar na gestão do Casulo, ou em
outros projetos dentro da comunidade. Temos a escolha de não nos
fecharmos só num tipo de software, proprietário ou livre, para que
esses jovens tenham a liberdade de escolher e, um dia, quando eles
forem para o mercado de trabalho, possam ser profissionais
diferenciados”, afirma Luis Fernando, coordenador de desenvolvimento.
O espaço multimídia tem também a oficina inclusão digital que trabalha
com o público a partir de 12 anos, com a intenção de iniciar o jovem na
era digital. “Queremos que o jovem perceba o computador como uma
ferramenta para aquilo que ele possa vir a realizar no futuro. Para ele
não ser um dependente da máquina, mas sim alguém que domine as
ferramentas de tecnologia para desenvolver ações e projetos através
dessas tecnologias” diz Luiz Fernando.
O programa de formação de jovens professores em parceria com a
faculdade Instituto Normal Superior Singularidades propõe que os
professores de ensino fundamental e infantil não tenham só a formação
do magistério, mas o curso normal superior, que é mais completo e mais
focado na sala de aula.
As oficinas culturais são
a porta de entrada do projeto.
O jovem ganha a bolsa para fazer o curso e a ajuda de custo para xerox,
transporte e alimentação. Em contrapartida, o Singularidades exige o
estágio desde o primeiro semestre nas organizações locais como as
escolas municipais de educação infantil (EMEIs), escolas municipais de
ensino fundamental (EMEFs) e no Casulo.
Márcia Licá, de 20 anos, moradora do Real Parque, faz faculdade de
normal superior no Instituto Singularidades e foi contratada como
estagiária pelo Casulo para cuidar do núcleo da biblioteca. ”Eu já
estou há muito tempo aqui no projeto. A biblioteca do Casulo é
circulante, estamos sempre fazendo empréstimos de livros para pessoas
da comunidade. Então se percebeu que se precisava de duas estagiárias
para ficar o dia inteiro. Por isso fui contratada”, conta Márcia.
Ela também fala um pouco sobre as melhorias que o projeto Casulo trouxe
para a sua comunidade. “O Casulo veio com uma estrutura muito bacana,
aqui tem tudo que em outros projetos não tem, e a comunidade precisa
aproveitar isso”, diz Márcia. “A gente não quer que esse projeto seja
assistencialista, queremos que as pessoas participem com vontade. Não
queremos fazer caridade para ninguém. Eu vi o projeto como uma brecha
do sistema por onde entrar, porque a elite montou esse projeto. Eu vi o
Casulo como uma oportunidade para melhorar a minha comunidade e a
minha vida,” acrescenta Márcia.
Através do Casulo, Márcia, outros jovens como ela, crianças e a
comunidade em geral podem saber mais sobre seus direitos e como
reivindicá-los, se fazendo valer das brechas que o sistema abre.
*Repórter comunitária da Rádio Biboca, em São Paulo.