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O Comitê para a
Democratização da Informática (CDI) lançou, no dia 2 de dezembro, a
campanha Fust Já!, para pressionar o Ministério das Comunicações a
tomar providências imediatas para a liberação dos recursos do Fust. Até
o dia 7 de janeiro, 2.040 pessoas haviam entrado no site da campanha
www.fustja.org.br e enviado sua reivindicação. A liberação de parte dos
recursos, no entanto, é decisão já tomada pelo ministério. Desde o
início de outubro, o ministro Hélio Costa afirma, em declarações
públicas, seu empenho para aplicar em telefonia rural o dinheiro a ser
arrecadado em 2006. Se a campanha não teve influência direta nessa
decisão, pode ter o mérito de ampliar a discussão sobre o destino do
dinheiro recolhido ao fundo desde agosto de 2000; demandar
transparência em sua gestão e a destinação de recursos para projetos de
inclusão digital. A rede CDI, onde surgiu a idéia de lançar a campanha
Fust Já, tem comitês regionais em 30 cidades e é formada por cerca de
mil Escolas de Informática e Cidadania. Sua proposta é realizar, até
março, uma oficina envolvendo entidades que atuam com tecnologia da
informação e comunicação para inclusão, a fim de elaborar um programa
mínimo e ampliar a ação. Essa articulação será imprescindível para que
a campanha se torne conseqüente, porque há empecilhos, na própria lei
que criou o fundo, ao direcionamento dos recursos a entidades do
Terceiro Setor ou ao provimento de conexões em banda larga (veja mais). Rodrigo Baggio, diretor-executivo da rede CDI,
acredita no potencial da internet para disseminar a idéia, e trabalha,
como revela nesta entrevista, para que a campanha se torne uma frente
da sociedade civil. Patrícia Cornils
"Usamos o conceito de passeata virtual".
ARede – O que é a campanha Fust Já?
Rodrigo Baggio – É uma frente de entidades que querem a
liberação imediata dos recursos do Fust. No CDI, nós trabalhamos muito
com a pedagogia de Paulo Freire e ele fala muito na pedagogia da
indignação, em como é importante a gente exercer essa indignação
cidadã. E isso surgiu no último encontro da rede CDI, em novembro, onde
estavam 200 lideranças da rede, que decidiram buscar mais informação
sobre a questão do Fust. As operadoras recolhem o equivalente a 1% das
contas telefônicas, há cinco anos, para o Fust, que deveria ser o fundo
da inclusão digital, deveria ser um exemplo de boa prática na área de
inclusão digital para a América Latina. O conceito de universalização
das telecomunicações, de beneficiar hospitais, bibliotecas, escolas
públicas, projetos de inclusão digital é uma grande idéia. Só que o
Fust vira uma frustração, porque o fundo nunca foi utilizado. Nem se
sabe exatamente quanto de recursos há no fundo. Fala-se em R$ 4
bilhões, R$ 5 bilhões, já ouvi falar em até em R$ 6 bilhões
contingenciados. Essa é uma das questões que a Frente Fust Já! levanta.
O cidadão brasileiro tem direito de saber quanto afinal nós temos no
Fust.
ARede – Quem participa da campanha?
Baggio – Solicitar a liberação do Fust, na verdade, não é uma
idéia nova. A gente já vê organizações como a Sucesu, a Rits e o
próprio CDI buscarem, nesses cinco anos, saber o que acontece com esses
recursos. Esse é um assunto tão importante e estratégico para o
desenvolvimento social e econômico do Brasil, que precisamos articular
uma série de organizações da sociedade com o objetivo de buscar a
liberação. Depois da reunião do CDI, contatei, no Rio de Janeiro, duas
redes de empreendedores sociais, a Ashoka e a Avina. Essas organizações
apoiaram imediatamente a Frente Fust Já!. No Canadá, o Marcelo
Fernandes, coordenador do CDI Pernambuco, líder Avina e da Fundação
Kellog e representante da rede CDI no Comitê Gestor da Internet,
articulou a adesão imediata da Rits, por meio do Carlos Afonso, e do
movimento nacional de software livre, por meio do Mario Teza – que
estavam em uma reunião de governança na internet, depois da Cúpula
Mundial de Túnis. A Addcomm, empresa de marketing na internet, fez
voluntariamente o site da campanha. Fizemos o lançamento dentro de uma
visão inovadora, no que consiste o Terceiro Setor se apropriar da
internet como uma ferramenta de mobilização social. A gente utiliza o
conceito de passeata virtual, na medida em que, dentro do site, do
portal, cada pessoa pode enviar um e-mail para o ministro Hélio Costa
pedindo a liberação imediata dos recursos. A primeira ação é essa
passeata virtual. A segunda é indicar essa ação para um amigo ou série
de amigos, criando o efeito da disseminação, do contágio, de um vírus
do bem. As pessoas também podem botar um banner da campanha em seu
site. Com o lançamento, dia 2 de dezembro, recebemos outros apoios da
Fase, da Sucesu, do Viva Rio, da Assespro e do Coletivo Digital.
ARede – Como poderá ser usado esse dinheiro?
Baggio –
A visão da rede CDI é que o poder público não precisa reinventar a roda
na área de inclusão digital. No Brasil, temos projetos de inclusão
digital com bastante qualidade, já testados, em pequena, média e larga
escala, de diversas ONGs, empresas e organizações. Para a gente
transformar isso em uma política pública e aumentar a escala, faltam
recursos financeiros. Recentemente, foi feita, pelo Comitê Gestor da
Internet, uma grande pesquisa em que se perguntou a milhares de
brasileiros se eles acessam a internet de telecentros públicos e
gratuitos. O percentual foi de 0,47%. O desafio é sempre o recurso
financeiro para a expansão e o aumento da qualidade desses projetos. A
Frente Fust Já! propõe que, a exemplo de outros fundos públicos, se
crie um conselho composto pela sociedade civil organizada, pelo setor
privado e pelo governo, para planejamento, gestão e execução dos
recursos do Fust. Precisamos agregar valor nesse processo e garantir o
compromisso com o planejamento e a implantação eficiente desse projeto.
É uma visão de longo prazo. É possível fazer um grande plano com
qualidade e acompanhar sua execução durante anos. Nós discutimos também
estratégias de como continuar, a partir deste primeiro trimestre, a
mobilização da sociedade civil organizada. O plano é a articulação de
uma oficina com as principais organizações que atuam com a causa da
inclusão digital — não necessariamente focadas 100% em inclusão
digital, várias organizações têm outro foco e se utilizam de tecnologia
– para, nesse workshop, definir idéias, conceitos mínimos, comuns, para
pautar nossa atuação. Queremos fazer a oficina em fevereiro ou março. E
ampliar a frente, que cria um novo paradigma em termos de organização
de movimentos sociais se utilizando da internet no Brasil. Estamos
aprendendo, fazendo uma frente em que você pode ter um pool de
insituições da sociedade civil usando a internet como uma forma de
disseminação e contágio. Esse é um dado interessante, novo, que pode
criar um novo paradigma no setor da cidadania.
ARede – Mas a internet brasileira ainda é elitizada, não tem a amplitude que vocês pretendem para a campanha.
Baggio – Nós poderíamos brincar com isso, dizendo que
gostaríamos de mobilizar os 12% de brasileiros que são internautas, em
prol da conexão dos outros 88%; e estamos fazendo uma diferença. Mas os
telecentros, infocentros e escolas, os projetos de inclusão digital,
são fundamentais nessa mobilização. São esses projetos que capilarizam
e mobilizam a comunidade para participar. São eles que vão ampliar, dar
base à campanha.