Conexão Social – Para entender a inclusão digital

Projeto da USP prevê a criação de uma rede, ligando cem residências na periferia de São Paulo, para estudar os impactos da tecnologia no desenvolvimento da comunidade.



Projeto da USP prevê a criação de uma rede, ligando cem residências na
periferia de São Paulo, para estudar os impactos da tecnologia no
desenvolvimento da comunidade.
  

Verônica Couto

Entre as oficinas, dança de rua, teatro, grafite, circo, cavaquinho…

Para avaliar os impactos das tecnologias da informação e comunicação na
vida cotidiana, serão instalados computadores com conexão à internet em
cem residências, no bairro de Cidade Tiradentes, na zona leste de São
Paulo, em área próxima a um telecentro. A iniciativa faz parte do
projeto “Comunidades Online: domesticidade e sociabilidade em políticas
públicas para inclusão digital”, desenvolvido por várias unidades da
Universidade de São Paulo (USP), e financiado pela Fapesp.

Além de estudar os efeitos das TICs na rotina das pessoas, o objetivo
do programa também é entender os seus desdobramentos nas relações
sociais, dentro e fora da comunidade, e nas interações com os espaços
de moradia. Denise Mônaco dos Santos, pesquisadora do Nomads-Núcleo de
Estudos sobre Habitação e Modos de Vida, da USP São Carlos, conta que
está sendo criada uma interface – uma comunidade virtual –, que
colocará em rede os moradores participantes do projeto e deve permitir
a eles produzir conteúdos em formato digital. “Estão previstas ações
colaborativas, no espaço virtual e também no concreto”, diz ela. Por
isso, a importância da presença de um telecentro público, que deve
colaborar na iniciativa, não só como centro de acesso à internet, mas
como lugar de desenvolvimento de atividades comunitárias.

Originalmente, ainda em 2004, a USP pretendia trabalhar com o
telecentro Cidade Tiradentes, mantido pela prefeitura, uma das
parceiras da pesquisa, junto com a Cohab (Cia. Metropolitana de
Habitação). “Porque a intenção era que a iniciativa apoiasse uma
política pública municipal”, lembra Denise. Uma das possibilidades era
de que a Cohab, no futuro, financiasse os terminais de acesso,
embutidos no custo das residências. Com a mudança de gestão na
prefeitura, em 2005, a pesquisadora explica que as parcerias estão
sendo rediscutidas. Por isso, a estratégia foi reformulada, e o
telecentro associado será o centro cultural Instituto Pombas Urbanas,
que também é apoiado pela prefeitura de São Paulo, e está se
transformando numa unidade Casa Brasil (rede federal de telecentros).
“Era importante que o telecentro tivesse muitas atividades
desenvolvidas com a comunidade, e o Pombas tem esse laço”, justifica
ela.


O centro cultural do Pombas Urbanas, com seu telecentro, será parceiro do projeto

Outra mudança na proposta inicial diz respeito aos equipamentos de
acesso à rede. “Estamos em fase de reformulação”, diz Denise. Em vez de
computadores, a USP pretendia equipar as casas com set-top-boxes
(conversores de sinal para TV digital), projetados pelo Laboratório de
Sistemas Integráveis (LSI), da universidade. “O desenvolvimento e os
testes dos terminais ficaram comprometidos em função do padrão de TV
digital escolhido”, afirma a pesquisadora. Ela se refere à adoção do
padrão japonês pelo governo brasileiro, que não prevê, pelo menos em
curto prazo, aplicações de interatividade.

Com isso, optou-se pela instalação de computadores meta-reciclados e
recondicionados, trabalho que deve ser feito pelo CooperJovem, uma
cooperativa de jovens de São Mateus, também na zona leste (veja ARede
nº 4 e nº 10). “Mas a parceria ainda não está definida”, avisa Denise.
Os pesquisadores têm prazo de dois anos para implantar o projeto, ou
seja, até maio de 2007.

Participam da pesquisa, ainda, o Nutau-Núcleo de Pesquisa em Tecnologia
de Arquitetura e Urbanismo da FAU/USP (Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo), e o grupo Intermídia Redes Distribuídas, do Instituto de
Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC), com parceria da
Universidade de Uberaba, e apoio institucional do ITI, do Ministério
das Comunicações e da Intel. Além da Fapesp, o projeto tem recursos do
CNPq e da Pró-Reitoria de Pesquisa da USP.

Duas cidades em uma

Cidade Tiradentes, de acordo com o portal do projeto Comunidades
Online, da USP, é o maior complexo habitacional já realizado no Brasil,
construído quase integralmente na década de 80. O site indica, ainda,
uma taxa de analfabetismo entre 0 e 10% na cidade formal, onde 180 mil
pessoas viveriam em 40 mil habitações; e entre 10 e 20% na informal,
com população estimada de 60 mil pessoas, em loteamentos clandestinos,
irregulares e favelas. A renda média de um chefe de família varia de R$
500,00 a R$ 1,2 mil na cidade formal, e entre R$ 200,00 e R$ 500,00, na
informal. O bairro registra a presença ativa de diversas organizações
não-governamentais e o primeiro telecentro instalado na cidade de São
Paulo, em 2001 (Telecentro Cidade Tiradentes, da prefeitura).

www.eesc.usp.br/nomads – Site do projeto Comunidades OnLine. Escolha o primeiro item (pesquisa); depois, “comunidades online (p3)”.



Vôos de arte urbana

A Instituto Pombas Urbanas, selecionado para sediar uma unidade do Casa
Brasil, programa federal de inclusão digital, promove oficinas
culturais – teatro, dança de rua, grafite, circo, cavaquinho, violão,
fantoches – para jovens da comunidade de Cidade Tiradentes, na zona
leste de São Paulo. Também foi credenciado como Agente Cultura Viva,
dentro do programa dos Pontos de Cultura do Ministério da Cultura.

O Pombas Urbanas surgiu em 1989, por iniciativa do diretor de teatro
peruano Lino Rojas, que atuava com jovens de São Miguel Paulista, até
falecer, em março de 2005. Um grupo de dez artistas formados no projeto
levou adiante a proposta e, desde setembro do ano passado, ocupa um
galpão cedido em comodato pela Cohab SP, em Cidade Tiradentes.

Com os equipamentos do Minc (kit multimídia), a idéia é
oferecer também cursos de rádio e de edição e produção de vídeo.
Adriano Mauriz, que ingressou nas aulas de teatro de Lino aos 13 anos e
é um dos atuais integrantes do Pombas, destaca, contudo, que a
infra-estrutura tecnológica – computadores, acesso à web, equipamentos
de áudio e vídeo – deverá estar inserida na proposta básica do
instituto. Ou seja, estimular o envolvimento da comunidade em processos
de produção artística e cultural, para o desenvolvimento local a partir
do protagonismo dos jovens.