Rádio escolar, agora pela web.

Mais de três anos após se tornar lei em São Paulo, o programa Educom.rádio muda de nome e enfrenta a falta de recursos.


Mais de três anos após se tornar lei em São Paulo, o programa Educom.rádio muda de nome e enfrenta a falta de recursos.
Carlos Minuano


Quando chegamos à escola municipal Fernando Gracioso, em Perus, região
norte de São Paulo, fomos surpreendidos por uma menina com uma câmera
de filmar na mão e muito provavelmente com várias idéias na cabeça.
Para Katlyn Nunes, de 12 anos, e para a maioria dos alunos daquela
escola e de outras da rede municipal, manejar câmeras, utilizar
gravadores feito repórteres, fotografar ou produzir programas de rádio,
já não é novidade. A escola integra o programa Nas Ondas do Rádio —
anteriormente chamado de Educom.Rádio. Implementado na rede municipal
de ensino a partir de 2001, em parceria com a USP, a proposta visa
criar rádios escolares, como forma de desenvolver práticas pedagógicas
baseadas no uso de recursos de mídia. Porém, após se tornar lei em São
Paulo, em 2004, o programa ainda busca novos rumos e enfrenta
diferentes problemas, especialmente a falta de recursos.

Por parte dos alunos, vontade de aprender não falta. Pedro Henrique, de
11 anos, já começou a ensinar seus colegas. Assim como Katlyn, ele se
tornou monitor e ajuda nas aulas de informática. Pedro também conta que
faz entrevistas, participa de campanhas voltadas à comunidade (como a
mais recente, de prevenção à dengue), além de estudar a vida no entorno
da escola. “Outro dia, saímos para entrevistar o funcionário de uma
fábrica de cimento da região, em outro, o primeiro maquinista do
bairro, e assim por diante”, explica o garoto.

Se, por um lado, não falta pique aos alunos, o mesmo não é possível
afirmar sobre os recursos disponíveis para o projeto educacional.
“Nossa rádio está fora do ar há mais de um ano, devido a um problema
simples na antena”, lamenta o professor Fábio Nepomuceno, coordenador
de informática do colégio. Por coincidência, no mesmo dia em que a
reportagem da revista ARede visitou a Emef Fernando Gracioso, no início
de abril, a antena finalmente foi consertada.

Do momento em que a idéia começou a ser executada, em 2001, até o final
de 2004, quando a Prefeitura de São Paulo encerrou o contrato com a
USP, 455 escolas aderiram ao projeto; 11 mil professores, estudantes e
outras pessoas da comunidade passaram por capacitação no Núcleo de
Comunicação e Educação da USP; e 272 escolas receberam o equipamento
para a produção das rádios escolares. Mas, apesar dos números apontarem
avanços relevantes, como a redução de até 50% das depredações e furtos
na escolas, a idéia das emissoras de curto alcance nas escolas não
avançou.

Carlos Lira, atual coordenador do projeto na Secretaria Municipal de
Educação, admite a existência de problemas. As dificuldades na
transmissão, diz ele, devem-se a problemas de estrutura nos prédios das
escolas e ao alto custo do kit e da manutenção dos equipamentos. Mas
ele também destaca problemas de gestão na própria escola. “Todos os
anos, ocorrem mudanças de professores e o responsável pelo projeto
acaba saindo, prejudicando a continuidade das ações.”


Para katlyn Nunes, o uso
de recursos de mídia já
não é novidade

Questionada sobre o número atualizado de escolas com rádios escolares
em funcionamento, a assessoria da prefeitura não soube informar. O
coordenador do projeto Nas Ondas do Rádio também não respondeu, embora
afirme que há cerca de 150 ações de educomunicação em desenvolvimento.
Segundo ele, há um levantamento em curso, mas os dados não estão
disponíveis. E  discorda que as ações tenham encolhido. “O projeto
radiofônico representa uma de nossas frentes, mas estamos com outras
soluções pedagógicas interessantes.” Refere-se aos laboratórios de
informática para capacitação de professores no uso de mídias digitais
(webradio, por exemplo). “Vamos fazer a educomunicação por meio da
tecnologia.”

Nos laboratórios, explica o coordenador, são produzidos programas de
rádios publicados na internet em podcast. “O computador tem sido o
grande recurso para produção midiática nesse ambiente, junto com
softwares como o Audacity (editor de áudio) e, agora, o Zara Radio
(edição e programação digital), que possibilitará transmitir programas
de rádio produzidos pelos alunos.

“Hoje, é possível criar uma estação de rádio muito mais barata do que
com o chamado kit Educom; basta um computador, um amplificador e caixas
acústicas”, argumenta o coordenador. O problema, contudo, é que uma
radioweb precisa de acesso à internet e computador para ser ouvida — e
muitas dessas escolas estão em áreas de alta exclusão digital. As
emissoras poderão falar com o Japão, mas dificilmente com suas
comunidades. O kit Educom mencionado é composto por mesa de som,
transmissor, caixas receptoras, tape deck, antena, microfones e
gravadores de reportagem. Ofereceria alcance de até 1 km no raio da
escola. Resta saber o que será feito no caso dessas 255 escolas que
receberam o kit.


Laboratório de Informática
da escola Fernando Gracioso

A situação piora, se levarmos em conta que, em 2004, o material
radiofônico já não era usado em 39% das escolas equipadas, por estar
com defeito ou, simplesmente, abandonado. O Educom.rádio se tornou lei
municipal (13.941), a partir de projeto proposto pelo vereador Carlos
Neder (PT). Foi sancionada pela então prefeita Marta Suplicy (PT), em
28 de dezembro de 2004.

Para um dos principais mentores do projeto, o professor e coordenador
do Núcleo de Comunicação e Educação da USP, Ismar de Oliveira Soares,
problemas de licitação, equipamentos com defeitos, atraso na entrega e
dificuldades com manutenção prejudicaram a continuidade do programa,
que ele ainda considera importante, mesmo na web. “Investimento em
internet foi o caminho para manter o projeto; não é o equipamento que
importa, o principal é o conceito de educomunicação”, explica o
professor.

Plataforma eleitoral

Uma equipe de alunos das escolas municipais do programa Nas Ondas do
Rádio participa, em maio, da cobertura do 1º Fórum Nossa São Paulo, em
parceria com a Unicef e a revista “Viração”. O fórum é uma iniciativa
do Movimento Nossa São Paulo, apoiado por aproximadamente 400 empresas.
O objetivo do Fórum é pautar propostas e firmar compromissos com os
futuros candidatos à prefeitura de São Paulo. A cobertura do Fórum
Nossa São Paulo estará disponível através do blog do projeto Nas Ondas
do Rádio.


www.blogandonasondasdoradio.blogspot.com


Rádio Xavante

Encerrada a participação da USP no Educom.Rádio em São Paulo, um dos
mentores do programa, o professor Ismar de Oliveira Soares, coordenador
do Núcleo de Comunicação e Educação da USP, continuou trabalhando com a
metodologia. O caminho, segundo ele conta, foi buscar parcerias. No
Ministério do Meio Ambiente, coordena o projeto Educomunicação
Socioambiental para elaboração de ações na área de preservação
ambiental, e, com o Ministério da Educação, levou rádio a 70 escolas. A
partir de convênio com o MEC, Ismar viajou por Goiás, Mato Grosso e
Mato Grosso do Sul, e capacitou cerca de 140 professores. Até uma
aldeia Xavante foi atendida, onde, até hoje, está no ar uma rádio
produzida pelos índios, afirma o professor.


www.usp.br/educomradio/