Consumidores e fabricantes serão obrigados a assimilar uma NOVA cultura de sustentabilidade
ARede nº60, junho 2010 –Em 2010, a Biblioteca Nacional completa 200 anos de existência. Para comemorar o aniversário, vai realizar dois grandes projetos de digitalização: colocar na internet todas as obras literárias brasileiras de seu acervo que caíram em domínio público e também sua coleção de periódicos (jornais e revistas) raros ou extintos. Somente os periódicos envolvem 14 milhões de imagens, em 8 mil títulos, explica Ângela Bittencourt, coordenadora da Biblioteca Nacional Digital. Hoje, a biblioteca tem 23 mil títulos digitalizados, ou um milhão de imagens.
Essas obras só podem ser reproduzidas e colocadas na internet porque estão em domínio público, ou seja, não são mais protegidas por direitos autorais. Seu uso é livre e cabe aos entes federativos, a órgãos e entidades públicas, a defesa de sua integridade. No Brasil, os direitos autorais cessam somente depois de 70 anos, contados a partir do 1° de janeiro do ano seguinte ao falecimento do autor. Até que isso aconteça, herdeiros, sócios, editoras e companhias produtoras controlam, na prática, o acesso a essas obras, porque a reprodução depende de sua autorização. E esta autorização, na maioria das vezes, depende de remuneração.
Isso cria situações que levam bibliotecas e museus a descumprir a lei para cumprir a missão de prover acesso ao patrimônio cultural do país. “Vivemos em regime de medo”, afirma William Okubo, diretor de acervo da Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo. Se um estudante precisa de informações constantes em um livro da década de 40 e este livro tem apenas um exemplar ou não está em boas condições de conservação, não se pode emprestá-lo ao estudante. A Lei de Direitos Autorais em vigor não permite cópias para utilização individual e não comercial das obras sem autorização dos detentores dos direitos. Se a biblioteca copia um capítulo do livro, está cometendo uma ilegalidade. Se faz uma cópia da obra, para não manuseá-la, também está fora da lei.
A Biblioteca Brasiliana Digital não pode copiar – muito menos colocar na internet – os originais de Grande Sertão:Veredas. “Quantas pessoas podem manusear esses originais? Poucas. Quantos estudantes de literatura, história, filosofia existem no Brasil? Milhares”. Esses milhares, na prática, não poderão conhecer esta versão da obra antes de 2037, quando se completam 70 anos da morte de Guimarães Rosa. Muitas vezes, não é possível sequer localizar os detentores dos direitos autorais. Na Cinemateca Brasileira estão depositadas tanto obras que caíram em domínio público como aquelas ainda protegidas por direitos de autor. Não se sabe, por exemplo, se os sócios de uma empresa cinematográfica, no momento em que produziu um filme, continuaram os mesmos ao longo de sua história. E, muitas vezes, sem saber a composição da empresa, não é possível localizar os herdeiros dos direitos autorais do filme.
Essas situações justificam amplamente a proposta do Ministério da Cultura para mudar a Lei de Direitos Autorais, a Lei 9610/1998. A proposta do MinC foi colocada em consulta pública no dia 14 de junho e está aberta a contribuições até o dia 28 de julho. Ela não modifica o prazo de validade dos direitos autorais no Brasil (70 anos), embora o direito internacional obrigue a apenas 50 anos. Mas cria exceções a esses direitos. A proposta permite cópias para utilização individual e não comercial das obras e também permite, a instituições que cuidam do patrimônio histórico (bibliotecas, museus, cinematecas), fazer reproduções necessárias à conservação, preservação e arquivamento de seu acervo e autoriza o acesso a essas obras nas redes internas de informática dessas instituições (não se trata de colocar as obras disponíveis na internet para acesso livre). (P. C.)