Muito prazer em aprender
O programa Praças e Naves do Conhecimento, no Rio de Janeiro, já tem oito unidades e deve inaugurar mais 40 até o final de 2014, com um investimento de R$ 200 milhões.
Lia Ribeiro Dias
ARede nº 90 – abril de 2013
O PROGRAMA Praças e Naves do Conhecimento, lançado no final de 2011 com a inauguração da unidade de Nova Brasília, no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro (RJ), foi ampliado no início de 2013, por meio de decreto do prefeito Eduardo Paes. Serão construídas mais 40 Naves, em um investimento de R$ 200 milhões até o final de 2014. O objetivo, explica Franklin Dias Coelho, secretário de Ciência e Tecnologia e coordenador do programa, é que a cidade tenha, nas comunidades e nos subúrbios, um espaço comunitário digital a cada raio de 1,5 quilômetro: “Ou seja, a 15 minutos de caminhada da residência de cada morador”. Daí o novo nome do programa: Rio Digital 15 Minutos.
Com sete unidades em funcionamento e uma oitava para ser inaugurada em maio, o programa cria espaços vivos que reúnem ambientes e atividades onde se mesclam educação, entretenimento, serviços e formação profissional. Em média, são 400 visitantes por dia, de terça a domingo – jovens, especialmente estudantes, idosos e, nos finais de semana, famílias.
Segundo Maria Helena Cautiero Jardim, coordenadora pedagógica do programa, a Nave foi pensada como uma extensão da escola, onde o ensino tem de ser feito de forma prazerosa. “A ideia é unir a educação formal (escola) e a informal (comunidade), por meio de um trabalho transversal com outras secretarias. É fazer educação com inovação usando as tecnologias e, assim, influenciar a escola para que entre no século 21. A sala de aula ainda funciona no mesmo formato da revolução industrial e precisa entrar na Sociedade do Conhecimento”, diz.
O que existe nos espaços 1. Recepção Digital – onde o usuário faz seu cadastramento, reserva computadores na Lan Table, Biblioteca e Sala Multimídia, consulta as grades de eventos da unidade e de horários das aulas da Sala Multimídia, participa das votações e dá sugestões. O cadastro gera um banco de dados sobre os frequentadores. De junho a dezembro de 2012, se cadastraram 2.400 pessoas. 2. Área infantil (Playground e Cavernas digitais) – 4. Lan House (Lan Table) – local onde o usuário cadastrado tem acesso livre aos aplicativos e ao acervo da unidade, utilizando os computadores disponíveis. 7. Cinema ao ar livre (Olho, apenas nas Naves) – 8. Anfiteatro (apenas na Praça) – onde são feitas as projeções de vídeos e filmes, as palestras e as peças teatrais para a comunidade, de acordo com grade criada em cooperação com os usuários. 9. Mesa da Comunidade – local onde o público tem acesso ao mapa digital do bairro, podendo navegar pela comunidade e inserir sugestões, reivindicações e outros comentários. 10. Nuvem do Conhecimento – acesso ao catálogo de conteúdo da Nave. Com gestos e toques é possível ver um resumo de cada conteúdo existente no interior da Nave. 11. Parede do Conhecimento – em uma tela vertical de aproximadamente quatro metros quadrados, o usuário acessa aplicativos como o Grandes Mestres e Como as Coisas Funcionam, entre outros. Tudo por meios de gestos e toques. 12. Sementes do Amanhã (Réplica de uma árvore, apenas na Praça) – estrutura na qual são gravados e reproduzidos depoimentos da comunidade. A gravação é feita no tronco, enquanto nas telas (representando folhas) os vídeos já gravados são reproduzidos. (L.R.D.) |
Por isso, embora existam várias secretarias envolvidas, as parcerias privilegiadas são com a de Educação e Cultura. Foi feito um trabalho de apresentação dos espaços digitais e de suas possibilidades para as coordenadorias regionais de ensino e há atividades permanentes envolvendo professores e alunos das escolas do entorno. Lá se pode consultar a Mesa da Comunidade, onde se tem acesso ao mapa digital da comunidade, com as obras em andamento e há espaço para o morador inserir sugestões, reclamações e outros comentários. A Praça do Conhecimento de Padre Miguel, na Zona Oeste, inaugurada em junho de 2012, recebeu, até dezembro passado, 1.746 solicitações de serviços. É possível também visitar a Galeria Multimídia, onde se tem acesso ao acervo produzido pela comunidade ou por parceiros, como o projeto Portinari, e a exposição sobre o Impressionismo, apresentada pela
Fundação Banco do Brasil (FBB). Ou assistir a um curso profissionalizante (de informática básica, avançada, oficinas de vídeo, de blog, de inglês etc.), entre muitas outras atividades (ver a pág. 28). Ou, ainda, simplesmente navegar na internet no espaço batizado Lan Table.
Integração
Além de ser um ambiente de interação pedagógica e cultural com as escolas da região, atuando como um complemento às atividades extracurriculares da Secretaria da Educação, as Naves pretendem ser um espaço de integração da comunidade por meio das ferramentas digitais. “Queremos que os moradores se apropriem do espaço, colaborando na grade de atividades e participando dos eventos culturais, como filmes e peças de teatro, além da visita virtual a exposições e acervos”, diz Maria Helena.
Hoje existem duas Praças – Nova Brasília (feita pela Secretaria de Obras e hoje incorporada à rede da Secretaria de Ciência e Tecnologia) e Padre Miguel – em funcionamento. E mais cinco Naves: Santa Cruz, Madureira, Irajá, Penha e Vila Aliança, inauguradas ao longo de 2012. A Praça do Conhecimento do Morro da Carioca, em Triagem, também pertencente à Secretaria de Obras, agora faz parte da rede, e já está com o prédio pronto, devendo iniciar as atividades em dois meses. A diferença entre uma Praça do Conhecimento e uma Nave do Conhecimento, esclarece o secretário Coelho, está no tamanho: a primeira tem mil metros quadrados enquanto a Nave é mais compacta, com 450 metros quadrados. Os espaços são construídos e equipados pela prefeitura, que também paga os funcionários, e administrados por uma Organização Social (OS), selecionada em licitação. Cada espaço tem conexão à internet de 30 Mbps, provida gratuitamente pelo Instituto Embratel.
Segundo Maria Helena, um grupo interdisciplinar, constituído a partir da decisão de se expandir a rede de Naves, trabalha na definição dos locais onde serão instaladas as novas unidades – a prioridade é para praças e espaços degradados e de fácil acesso – e na sua modelagem. Mas os bairros já foram escolhidos: Rocinha, Catumbi, Mangueira, Vila Isabel, Cajú, Maré, Ilha do Governador, Cachambi, Quintino, Tomás Coelho, Onório Gurgel, Brás de Pina, Pilares, Pavuna, Praça, Seca, Covanca, Cidade de Deus, Taquara, Curicica, Guadalupe, Anchieta, Marechal Hermes, Realengo, Magalhães Bastos, Viegas, Santíssimo, Campo Grande, Senador Vasconcelos, Monteiro, Cosmos, Paciência, Inhoaíba, Urucrânia, Magarça, Areia Branca, Terreirão, Guaratiba, Pedra de Guaratiba e Sepetiba.
Protagonismo
Entre os objetivos do projeto educacional do programa estão o protagonismo e o empreendedorismo. No acervo da galeria multimídia dos espaços, tanto das Praças quanto das Naves, é possível encontrar a história do bairro construída pela própria comunidade em colaboração com as escolas, seus momentos mais marcantes, em uma apresentação audiovisual. Nas praças, há ainda o Sementes do Amanhã, a réplica de uma árvore na qual são gravados e reproduzidos nas telas depoimentos da comunidade, que também podem ser postados no YouTube. Segundo o secretário Franklin Coelho, a apropriação do espaço pela comunidade passa pelo desenvolvimento do protagonismo. Por isso, um acordo com o jornal Extra já permitiu à Praça do Conhecimento de Padre Miguel desenvolver uma oficina sobre como montar um blog, na qual os alunos também aprenderam as principais regras e técnicas para coletar informações e redigir textos para alimentar um informativo digital.
O desenvolvimento do protagonismo e da capacidade autoral passa também por atividades como o Madureira Vale um Filme, em parceria com a CCR. Os alunos aprenderam a filmar e produzir vídeos, e os finalistas foram apresentados no Festival de Cinema do Rio, no ano passado. Neste ano, a experiência vai se repetir em todos os espaços do programa, sob o nome Seu Bairro Vale um Filme. “Precisamos estar atentos aos talentos que despontam”, afirma Maria Helena.
Após uma temporada de sete anos na Inglaterra, o advogado Vítor Bard retornou ao Rio. Ao saber da vaga para coordenador da Praça de Padre Miguel, se candidatou. Criado no bairro, queria devolver à comunidade um pouco do que aprendeu. Vítor, no comando de uma equipe de 34 pessoas, não se arrepende. Na direção do espaço desde junho do ano passado, nota uma evolução entre os mais de 500 frequentadores diários do espaço. “Os adolescentes não estão mais tão afobados”, diz ele, mencionando que acabou a gritaria e o empurra-empurra. Considerada a Nave-mãe do programa pelos espaços e atividades que oferece, a unidade de Padre Miguel atrai tanto o pessoal do bairro como de áreas vizinhas. No entorno, diz Vítor, existem cinco colégios e, por isso, o espaço está sempre movimentado pelos estudantes.
No dia em que a Praça recebeu a visita de ARede, uma das escolas tinha encerrado as aulas mais cedo e os alunos, tomado conta da Praça. Entre eles estava Hugo Cesi, de 15 anos, e Ariane Tavares, de 13. Hugo faz curso de informática e idioma em uma escola técnica três vezes por semana, mas frequenta a Praça para fazer pesquisas e navegar na internet. Ariane gosta de ir à Lan Table para acessar o Facebook. Tem computador em casa, com acesso pelo modem 3G, mas prefere os 30 Mbps da Praça. Seu irmão faz curso de informática avançada ali.
Uma das coisas que chamou a atenção de Vítor foi o interesse dos idosos. Na parte da manhã eles são a maioria e quase todos fazem, ou já fizeram, curso de informática básica. Aliás, conta Maria Helena, o curso foi inicialmente pensado com uma carga de quarto horas, apenas para ensinar quem não conhece computador nem internet a mexer no equipamento e acessar a rede. Mas a própria comunidade considerou que o oferecido era insuficiente, e a carga foi ampliada para 12 horas.
Entre as novidades tecnológicas introduzidas no programa, está o armazenamento de todo o conteúdo em nuvem, de tal forma que as unidades podem acessar as informações disponíveis umas das outras e trabalhar em rede. O curso de inglês, por exemplo, uma parceria do programa com a Sequoia Foundation, é ministrado às terças e quintas, utiliza uma plataforma multifuncional de educação a distância que permite a interatividade. O professor fica em Nova York, nos Estados Unidos, e de lá ensina e conversa com os alunos. O curso foi desenvolvido para capacitar para o mercado de trabalho e tem foco no turismo, tendo em vista a Copa do Mundo, em 2014, e as Olimpíadas, em 2016.
Já foram formados 110 alunos no módulo 1, que agora será repetido para 1.400 alunos. O módulo 2 será ministrado apenas nas Praças do Conhecimento, para os que já passaram pelo módulo introdutório. De acordo com Maria Helena, estima-se que o Rio de Janeiro vá demandar de 1.500 a 2.000 voluntários em TI nos eventos. “Esta é uma oportunidade para os alunos começarem a empreender”, diz ela. Com o mesmo objetivo, o programa firmou um acordo com o Sebrae, para o desenvolvimento de um curso voltado ao desenvolvimento do empreendedorismo.