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05/07 - CISL volta a atuar pela ampliação do uso do código aberto no governo.

Rafael Bravo Bucco

05/07/2013 – Em 2012 a luz amarela acendeu. No mesmo mês, Polícia Federal e Caixa Econômica Federal anunciaram que abandonariam, em parte, o software livre. Em seguida, adquiram licenças de programas proprietários. Diante da ameaça de mais órgãos seguirem o mesmo caminho, o Comitê Técnico de Implementação de Software Livre (CISL) reviu sua atuação. Após dois anos com foco em capacitar servidores, convocou representantes de diversos órgãos federais e traçou um planejamento para o biênio 2013–2014.

Divulgado no final de junho, o documento prevê a promoção e o incentivo do uso de soluções livres entre os gestores que acabam de chegar ao serviço público. Com a medida, o CISL – que tem como missão estimular o uso do software livre no governo federal – quer ver os padrões abertos voltarem ao centro dos debates sobre tecnologia da informação, transparência e redução de custos na administração.

O planejamento é fruto de uma reestruturação. Novos órgãos foram convidados a fazer parte do comitê (ultrapassando 120). Com mais gente, o CISL se reuniu em abril na Escola de Administração Fazendária (Esaf) para debater estratégias. “Devemos retomar diversas ações”, prevê Deivi Lopes Kuhn, secretário executivo. Uma das ideias é fazer um levantamento da adoção de software livre no governo. O último estudo do tipo, de 2010, mostrava que a maior parte dos órgãos ainda não usava computadores com sistema operacional de código aberto, nem programas de produtividade (como editor de texto e planilha) livres. Já o uso em servidores de internet era mais comum, mais disseminado até mesmo que o de ferramentas de e-mail.

“Vamos atualizar essa pesquisa. Tem uma percepção geral de que a política de adoção de software livre perdeu força na ponta, nos órgãos”, diz Kuhn. Se isso aconteceu, o estudo vai mostrar. Então serão definidas prioridades. “A grande questão é o papel que o Estado tem na adoção do software livre. O Estado conseguiu, com sua ação, popularizar ferramentas. Hoje, qualquer rede de varejo vende computadores com Linux”, opina. Os integrantes também chegaram à conclusão de que será necessário aumentar o controle por meio de normas. “Quando for adquirir soluções, o gestor deve olhar se há softwares públicos ou livres que atendam aquela demanda. Precisamos aperfeiçoar esse modelo”, afirma Kuhn. Atualmente, há uma instrução normativa (04/2010), criada pela Secretaria de Logística e TI do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), que prega a preferência por software aberto ou público na hora da compra por órgãos, autarquias e fundações ligadas ao governo federal.

Tanto o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI), quanto o do Planejamento, trabalham – timidamente – para incentivar o crescimento do software livre. O Programa Estratégico de Software e Serviços de Tecnologia da Informação (TI Maior), do MCTI, destinará até 2015 R$ 10 milhões à pesquisa e à formação de profissionais para trabalhar com tecnologias abertas. O MPOG também tem políticas de incentivo, tocadas pela SLTI, mas o orçamento depende de cada órgão. “É uma informação difícil de consolidar tendo em vista que a estrutura orçamentária de TI do Executivo Federal é descentralizada, sem detalhamento para o tipo de licenciamento das soluções a serem contratadas”, explica Nazaré Lopes Bretas, secretária-adjunta da SLTI. Apenas a secretaria, porém, deve investir R$ 4,7 milhões este ano em programas de modernização baseados em software livre.

Crescimento
O mercado do software livre, de acordo com o MCTI, deve crescer 22,4% este ano. Embora no encontro do CISL tenha sido comum a percepção de que é preciso fazer mais para manter o ritmo de adoção, ativistas acreditam que aumentou o uso de ferramentas livres, tanto na esfera pública, quando na privada. Ricardo Fritsch, coordenador da Associação Software Livre e do 14º Fórum Internacional Software Livre, enxerga um aumento do uso de plataformas livres nas empresas. “O Apache está em quase 100% dos servidores. Também cresceu o uso do Libre Office, e do Mozilla Firefox, que junto com o Chrome, domina a internet”, diz.

Faltam pesquisas que apontem onde o software livre foi adotado no país, mas Fritsch lembra que o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) amplia a cada ano a oferta de serviços baseados no modelo. “O Serpro passou a usar o OpenStack [sistema operacional para computação em nuvem], que é aberto. O IRPF está disponível também em software livre”, diz.

O aumento do número de pessoas com smartphones também importa. O Android (aberto), está em 75% dos aparelhos no mundo, enquanto o segundo colocado, o sistema iOS (proprietário), representa 17,3%. Os dados são da consultoria International Data Corporation (IDC). “O Android, pelo fato de ser livre e poder ser customizado pelos fabricantes, apresentou vantagem competitiva”, observa Fritsch. Em compensação, fica mais sofisticado, e pesado, a cada ano, exigindo aparelhos mais potentes e mais caros. Com isso em vista, são bem-vindas as alternativas, como o Firefox OS e o Ubuntu, baseados em HTML5. “Carecemos de sistemas operacionais mais simples e que levem a sério a questão de estar em rede”, analisa.

O ativista Marcelo Branco, concorda. E credita o aumento da transparência e surgimento de redes sociais ao software livre: “O movimento foi pioneiro. Hoje, os conceitos de transparência, abertura, inovação aberta estão disseminados”. Para ele, o sucesso do Android derruba o mito de que a interface era empecilho para adoção em massa do software livre. “Na plataforma móvel, o Windows é tão marginal quanto o Linux é no desktop”, diz. 

Um encontro aberto
O 14º Fórum Internacional do Software Livre acontece este ano entre 3 e 6 de julho, em Porto Alegre (RS). Até o fechamento desta edição, no final de junho, eram mais de 3,3 mil inscritos. Os organizadores esperavam, porém, cerca de 8 mil participantes. Nas 600 horas de programação, palestras de Tobias Anderson, um dos fundadores do The Pirate Bay, Italo Vignoli, da The Open Document Foundation, Richard Stallman, criador do Movimento Free Software, e Jon “Maddog” Hall, da Linux International, entre outros.

Entre os destaques desta edição estão debates sobre o uso do software livre nas plataformas móveis, sustentabilidade (reaproveitamento e reciclagem de equipamentos), e o compartilhamento de conhecimento. Também estavam previstos painéis sobre hardware aberto, especialmente sobre o computador Raspberry Pi, e suas aplicações.

Como não pode faltar o debate político, ativistas foram convidados para falar sobre o Marco Civil da Internet, a vigilância digital por parte de governos – em especial, sobre programas como o PRISM, dos Estados Unidos, com o qual colaboram as maiores empresas de internet.