Blog do Pedro Abramovay
15/12/2011 – “O que é um hackerspace? É um espaço e hackers dentro deste espaço”. Essa frase despretensiosa foi dita pelo Rodrigo Rodrigues da Silva, o Pitanga, um dos idealizadores do Garoa Hacker Clube (http://garoa.net.br), durante o festival CulturaDigital.br.
Não vou aqui contar tudo o que foi o festival. Posso dizer que quem não foi perdeu. Eram pessoas do mundo todo, reunidas às margens da Baía da Guanabara, discutindo cultura, tecnologias, democracia, tudo dentro de uma perspectiva de abertura e compartilhamento do conhecimento. Foi sensacional. Vale olhar o site (http://culturadigital.org.br/). E, sobretudo, tentar participar no ano que vem.
Entre filósofos, robôs, cineastas e muitos nerds uma das coisas que mais me fez pensar foi a apresentação do Pitanga. E essa sua frase singela. “É um espaço e hackers dentro deste espaço”.
Bom, para além desta frase, o que são hackerspaces? São espaços abertos, nos quais quem tiver interesse em testar tecnologias, criações inovadoras de construção de hardwares e softwares pode participar. Os hackers – não, eles não estão ali para roubar sua conta bancária, estão ali para brincar com as fronteiras do conhecimento tecnológico- testam geringonças, constroem máquinas pelo puro prazer que têm de desenvolver novas tecnologias de forma compartilhada.
O hackerspace do qual o Pitanga participa, o Garoa, por exemplo, já construiu coisas tão distintas quanto uma impressora 3d ( http://garoa.net.br/wiki/Impressora_3D ) ou um aparelho para vc desenhar e fazer música ao mesmo tempo (http://garoa.net.br/wiki/Drawdio ).
Esses espaços, riquíssimos em produção de inovação, desafiam o modelo tradicional de financiamento da inovação no Brasil (no mundo?). O estado Brasileiro gasta dezenas de bilhões de reais para financiar inovação. Esses recurso vão ou para empresas ou para universidades. Nos dois casos, sobretudo nas empresas, em modelos de inovação que não pretendem compartilhar o conhecimento produzido.
Os hackerspaces, esses laboratórios contemporâneos de professores pardais, querem produzir conhecimento para ser coletivizado. E querem treinar pessoas para que possam, juntos, produzir inovação. E o modelo brasileiro de financiamento de inovação não possui hoje mecanismos jurídicos para financiar este tipo de inovação.
É claro que não se pode imaginar que a curto prazo toda inovação vai migrar das empresas e universidades para espaços como esse. Mas certamente não se pode ignorar que é necessário valorizar essas experiências e é fundamental que haja políticas públicas para que o Brasil possa se destacar internacionalmente na proliferação de hackerspaces.
Quando a palestra do Pitanga terminou, eu levantei a mão e fiz esta questão a ele. Como ele via o fato de todo o dinheiro público para apoiar a inovação estar sendo direcionado às formas antigas de inovação enquanto essas novas formas não recebiam nenhum apoio? E ele disse algo como: “olha, acho que não faria sentido, atualmente dar dinheiro pra gente não. O tipo de inovação que a gente produz não pode ficar preso a relatórios para instituições de fomento. Na Áustria eu conheço um caso no qual houve um apoio da prefeitura para um hackerspace. Eles emprestaram um espaço no subsolo de um prédio público e ajudaram na compra de uns equipamentos”
E neste momento eu entendi a explicação do Pitanga sobre o que é o hackerspace (um espaço e hackers dentro deste espaço). Trata-se mesmo de um espaço que gera a possibilidade do encontro de pessoas que querem inovar, testar tecnologias, compartilhar conhecimentos.
Talvez, sobretudo num primeiro momento, o grande apoio que o Estado deva dar para que o Brasil possa ser um campo fértil para este novo tipo de inovação não seja o de dar empréstimos vultuosos a essas organizações. Mas o de criar esses espaços, espaços que sejam públicos e abertos para que hackers da cidade, do bairro, se reúnam e deixem a inovação aparecer.
Eu não tenho dúvidas que se tivermos hackerspaces como o Garoa ocupando os espaços de nossas cidades, o Brasil será um dos países mais inovadores do mundo. E produziremos uma inovação bem menos concentrada e mais democrática do que a atual.
Falta menos de um ano para as eleições municipais. Perceber que o poder público deve oferecer espaços para propiciar o encontro de hackers é perceber que as cidades – com apoio de instituições de fomento- devem liderar o processo de geração de hackerspaces.
São Paulo, por exemplo, poderia construir espaços, com um mínimo de equipamento, para serem geridos coletivamente, nas mais distintas regiões da cidade. Poderia virar a capital mundial dos hackerspaces. Haddad, Chalita, Bruno Covas, prestem atenção nisso!
Não é difícil. É só apostar naquilo pelo qual a cidade é mais conhecida: Garoa!