A barreira da renda baixa

As concessionárias desenham produtos para as classes C e D e investem em soluções tecnológicas capazes de reduzir o custo da infra-estrutura. Mas os preços, equivalentes aos praticados na região, continuam altos, tendo em vista a renda da população.


As concessionárias desenham
produtos para as classes C e D e investem em soluções tecnológicas
capazes de reduzir o custo da infra-estrutura. Mas os preços,
equivalentes aos praticados na região, continuam altos, tendo em vista
a renda da população.


As operadoras fazem testes com
tecnologia wireless para baratear
o acesso e chegar às periferias.

Com 7,1 milhões de acessos em banda larga, os provedores brasileiros
começam a ver recuar o ritmo de crescimento do serviço, embora o número
de novas adições se mantenha mais ou menos constante desde o primeiro
trimestre de 2006. A razão é uma só, segundo todos eles. “Estamos
esbarrando na barreira da renda, da capacidade da população de pagar
pelo serviço”. Como superar essa barreira é a pergunta que está hoje na
mesa dos responsáveis pelo desenho de novos produtos e serviços para a
baixa renda.

A solução de massa, aposta Rogério Santanna, secretário de Logística e
Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, virá com a
ampliação da competição, especialmente com a chegada do celular de
terceira geração, que estreou no Brasil, no mês passado, pelas mãos da
Telemig Celular e da Claro. “Os preços vão despencar”, aposta ele,
computando aí também o efeito da provável futura infovia estatal e da
entrada em cena de tecnologias que vão baratear a última milha. Além da
3G, as demais tecnologias wireless.

Mas, até que se tenha uma solução de massa para oferecer banda larga às
classes C e D, os provedores, especialmente as concessionárias locais
que têm uma malha de muito maior alcance, buscam produtos que caibam no
bolso desse consumidor. Em meados de novembro, a Brasil Telecom lançou
uma promoção de Natal: internet a R$ 9,90 por dois meses, para uma
conexão de 250 kbps. “A idéia é que esse seja um presente para toda a
família, principalmente para aquela que está adquirindo seu primeiro
computador”, comenta Luiz Antonio Costa e Silva, diretor de produtos e
serviços da Brasil Telecom. Ele esperava que 70% das vendas de acesso à
internet neste Natal fossem desse novo produto, e assegura que o nível
de retenção do cliente dessa faixa de renda é o mesmo do de outras
promoções.

A partir dessa promoção, a Brasil Telecom, segundo Costa e Silva, vai
calibrar um produto de acesso banda larga à internet que ficará próximo
à faixa dos R$ 30,00. “Vamos sentir melhor o mercado com essa promoção,
para ver que tipo de comprometimento de renda esse cliente pode ter”,
explica. Hoje, quem compra computador sabe que a máquina só faz a
diferença se acessar a internet. Por iss o, mesmo lenta e precária, a
internet discada ainda tem espaço no Brasil. O Internet Toda Hora, da
Brasil Telecom, acesso discado ilimitado por R$ 29,90, conta com 100
mil usuários. “Essa é uma base para a prospecção do serviço banda
larga”, diz Costa e Silva. A Brasil Telecom tem 1,5 milhão de
assinantes banda larga e sua rede cobre 1.367 dos 1.8 mil municípios de
sua área. É a concessionária com a rede de banda larga terrestre de
maior cobertura geográfica. Ela enfrenta a competição da GVT em 58
municípios e da Net, em 22. “Os competidores só estão nas zonas ricas
das cidades grandes”, registra Costa e Silva. Mas como essa é uma regra
natural do mercado, o desafio da concessionária é avançar em novos
segmentos do mercado.

Infra-estrutura compartilhada


Em Osasco, ponto de acesso
público.

Para fazer isso, a Telefônica está trabalhando em duas direções:
testando novas tecnologias, que vão permitir baratear o custo do acesso
(caminho também explorado por outras operadoras), e empacotando
produtos para atender a determinado perfil de consumo. Marcio Fabris,
diretor da Telefônica, diz que, em termos de infra-estrutura, só é
possível reduzir custo com solução compartilhada. “O custo mínimo da
linha ADSL é de R$ 800,00 de investimento”, conta. Para contornar essa
barreira, a Telefônica, diz ele, está fazendo um teste piloto em Vila
Gustavo, na cidade de São Paulo, com uma rede WiMesh com
retransmissores WiFi e usuários com placa WiFi no computador. “Para
usar a internet, o usuário compra um cartão pré-pago, do valor que lhe
convier”, explica Fabris. Como a infra-estrutura wireless é
compartilhada, o custo cai.

O objetivo desse trabalho, diz Fabris, é oferecer acesso à internet
para quem comprou seu primeiro computador e ainda não acessa a rede.
“Com o programa Computador para Todos, esse universos cresceu muito”,
diz Fabris, afirmando que é o aumento da penetração do computador nos
lares brasileiros — de 16,3 para 22,1%, entre 2004 e 2006 — tem
contribuído para puxar a expansão da banda larga. Apesar da preocupação
em superar a barreira da renda, o produto de entrada da Telefônica no
mundo da banda larga não cabe em qualquer bolso. São R$ 69,90, por 500
kbps mensais (R$ 49,80 no primeiro trimestres). Para atrair o
consumidor, ela oferece um pacote adicional de voz por R$ 9,90 (tarifa flat). Esses valores somados ao da assinatura básica resultam numa conta mensal da ordem de R$ 100,00 ou US$ 54,34.

Caro? As operadoras dizem que, deduzidos os impostos (da ordem de 40%),
seus preços são equivalentes aos preços mais competitivos praticados na
América Latina e não estão distantes dos preços dos países menos
desenvolvidos da Europa. Efetivamente, os preços vêm caindo. Os dados
do levantamento feito pela IDC para o Barômetro Cisco de Banda Larga,
relativos ao segundo trimestre deste ano, mostram uma redução, em
relação ao mesmo período de 2006, em todas as velocidades. Mas a
redução é menor nas velocidades menores (12,4% de 128 a 256 k) e maior
nas velocidades superiores (30,3% de 1 a 2 Mb), resultado da política
das operadoras de ofertarem o aumento da velocidade pelo mesmo valor já
pago pelo usuário.

Preços altos frente à renda


O mesmo levantamento mostra, ainda, que os preços praticados no Brasil,
sem impostos, são muito parecidos aos da Argentina, que registra uma
penetração da banda larga pouco superior à do Brasil. Também estão
próximos aos da Espanha, mas este é um dos países europeus que cobra
mais pela banda larga. A Comunidade Econômica Européia tem cobrado da
Espanha uma redução dos preços, superiores à média registrada na região
e mais próximos daqueles praticados pelos europeus menos desenvolvidos
do que pela Europa Ocidental.

Mas frente ao poder aquisitivo da população, os preços são, sim,
elevados, como ocorre em toda a América Latina. De acordo com dados (de
2005) do Observatório para a Sociedade da Informação na América Latina
e Caribe, as mensalidades de conexão à internet são o equivalente a 12%
da renda per capita regional, ao passo que, nos países ricos, são
inferiores a 1% da renda. Quanto mais pobre o país, maior o
comprometimento da renda. Assim, os gastos com acessos à internet,
naquele ano, representavam 22% da renda de um cidadão da Bolívia e 25%
de um guatemalteco, contra 6% da renda mensal de um brasileiro, 5% da
do argentino e 4% de um chileno ou uruguaio.

Segundo o mesmo estudo, entre 2003 e 2005, a penetração da internet
aumentou entre 10 e 15%, enquanto a banda larga cresceu 0,5% a 2%. Essa
evolução é considerada auspiciosa, mas os níveis  de penetração
continuam baixos e sua expansão não parece suficiente para diminuir a
distância com os países desenvolvidos.
 
Só com a quebra de paradigmas essa distãncia será reduzida. “Esse é o
nosso objetivo com o Plano Nacional de Banda larga, com o qual temos de
dar conta de uma promessa do presidente Lula ao assumir seu segundo
mandato. Interconectar à internet todas as escolas públicas do país até
o final de sua administração”, afirma Cezar Alvarez, coordenador as
ações de inclusão digital do governo federal.

Brasil ultrapassa 7 milhões de acessos

De acordo com os dados do Barômetro Cisco de Banda Larga, relativos ao
terceiro trimestre de 2007, o número de acessos cresceu 8,3% em relação
ao segundo trimestre, atingindo 7,1 milhões. São 544 mil novos usuários
da internet em alta velocidade no país. Na comparação com o mesmo
trimestre de 2006, o aumento foi de 36%. Nos últimos 12 meses —
setembro de 2006 a setembro de 2007 —, o Brasil ganhou 1,870 milhão de
novas conexões.  A faixa de velocidade que registrou maior
expansão foi a superior a 1 Mbps, que responde por 27,6% dos acessos. A
maior participação — 31% — é dos acessos entre 512 kbps e 1 Mbps.

O estudo mostra que o crescimento segue estável, mas a Cisco acredita
que a projeção de 10 milhões de conexões em banda larga para 2010 será
superada e que o país poderá chegar, naquele ano, a 12 milhões de
conexões. Nesta edição, o estudo, conduzido pela IDC, avaliou também o
uso de banda larga na telefonia móvel. Aí, houve a adesão ao serviço de
36 mil novos assinantes, totalizando 268 mil usuários. Com a chegada da
3G ao mercado, a avaliação é de que o segmento deve crescer muito,
principalmente o mercado corporativo.

Em relação à distribuição geográfica dos acessos em banda larga, as
novas adições não alteraram o quadro. São Paulo continua sendo o maior
consumidor, com 40,1% do total de acessos e penetração de 6,7%; no
Brasil, a taxa de penetração é de  3,8 acessos por cada cem
habitantes.


*Colaborou Bruno De Vizia