Acessibilidade – O consumidor não enxerga? A etiqueta fala.

O consumidor não enxerga? A etiqueta fala.

Pelo celular, as pessoas, mesmo que sejam cegas, indentificam as principais características de um produto. É a tecnologia. 
Tatiana Merlino

ARede nº 86 – novembro de 2012

IMAGINE a dificuldade que uma pessoa com deficiência visual encontra ao tentar, sozinha, fazer suas compras da semana em um supermercado. Ou escolher roupas em uma loja. Uma equipe do Núcleo de Acessibilidade Virtual do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (NAV-IFCE), se dedicou a imaginar. E foi além. Criou uma etiqueta acessível que funciona com base na tecnologia QR Code.

O QR Code é uma espécie de código de barras complexo, capaz de reter muito mais informações do que o simples conjunto de barrinhas negras e brancas. Geralmente em formato quadrado, impresso com marcações em preto e branco, depois de fotografado por um celular com software especial,  é convertido em textos, como endereços de páginas na internet, frases, ou mesmo imagens pouco detalhadas.

A sacada dos pesquisadores do NAV foi associar a capacidade de reter informações do QR Code ao dia a dia da pessoa com deficiência visual. Agebson Rocha Façanha, responsável pela iniciativa e professor do projeto de acessibilidade virtual do IFCE, explica que, estampando o QR Code em etiquetas e coloando-as em produtos, é possível facilitar a identificação destes por quem não vê. A pessoa precisa apenas fotografar o código usando um celular com câmera e com um aplicativo de reconhecimento de QR Codes. “São esses programas que orientam o deficiente visual”. O celular lê o código impresso e transforma as informações em uma descrição em áudio, para que a pessoa conheça as características do que está em sua mão, na prateleira, ou pendurado no cabide.

“O objetivo maior dessa solução de tecnologia assistida é dar mais independência e autonomia à pessoa com deficiência. Consequentemente, o sistema proporciona maior qualidade de vida e inclusão social; amplia a comunicação, a mobilidade, o controle da pessoa no ambiente”, aponta o professor. Para ele, o código pode ser ainda mais viável que o uso do braile nos meios de comunicação e nos canais de vendas pois, entre outras coisas, é de mais fácil replicação.

Os testes das etiquetas foram feitos com um grupo de cinco pessoas com deficiência visual. Cada um usou o próprio smartphone – havia celulares com sistemas operacionais Symbian e iOS. Com os telefones em punho, vários códigos foram apresentados a eles. Os donos de iPhone (que usa iOS), utilizaram o leitor de tela Voice Over juntamente com o Bar Scanner, programa de leitura de QR Code. No aparelho com Symbian (sistema operacional da Nokia), usou-se o leitor de tela Talks e o mesmo Bar Scanner.

Cada pessoa pegou um código, iniciou os aplicativos, apontou o aparelho para o QR Code e logo obteve a resposta: a descrição da etiqueta foi lida pelo programa e em seguida falada pelo aparelho. “Todos os deficientes visuais, dos dois sistemas testados, entenderam a informação descrita no QR Code. Foram lidos dados como tipo, modelo, tamanho, cor e fabricante”, conta Façanha.

Na avaliação de Mariana Carneiro de Almeida, pesquisadora do IFCE, o QR Code apresenta vantagens como tamanho reduzido, capacidade de armazenamento superior à tecnologia Braile ou outros códigos de barras de duas dimensões, e até mesmo pela praticidade de leitura. De acordo com ela, até o momento, tanto a recepção quanto a aceitação do público-alvo que obteve conhecimento da solução tem sido positiva. O deficiente Francisco Alves dos Santos, 34 anos, morador de Fortaleza (CE), foi um dos cinco participantes do teste do IFCE. Animado com a solução, ele conta: “Depois que conheci o QR Code, passei etiquetar tudo em casa, dos mantimentos da cozinha aos meus livros”.

Uma das dificuldades ainda a ser superada no projeto é definir o melhor lugar para colocar a etiqueta no produto, de forma que seja fácil para o deficiente localizá-la. “Esse é um grande problema, dada a diversidade de embalagens e padrões de etiquetas existentes”, explica. Outro ponto complexo e que ainda demanda mais estudos é definir a distância ideal entre o celular e a etiqueta para que melhore a captura e a decodificação dos dados pelo QR Code. (Colaborou Igor Ojeda) 

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