26/04/2010 – É preciso estar atento ao acordo do Google Books porque ele poderá significar uma virada nova e necessária no debate sobre direitos autorais e digitalização de obras. Esta foi a conclusão da exposição que o professor José de Oliveira Ascensão, catedrático da Universidade de Lisboa e uma sumidade em direitos autorais, fez esta noite, na abertura do Simpósio Internacional de Políticas Públicas para Acervos Digitais, em São Paulo.
O Google Books é um serviço que oferece acesso a livros por meio de um portal integrado à ferramenta de busca do Google. Por conta dele, vários autores, editoras, associações da indústria do entretenimento moveram processos judiciais contra o Google, alegando que a empresa não teria o direito de guardar cópias digitais dessas obras em seu banco de dados.
O acordo resultante desse embate, diz o professor Ascensão, “pode nos dar o caminho para sair da guerra inglória de perseguição judicial e conciliar em um nível mais elevado as varias posições em debate”. A dos autores, a da indústria — que se apropriou do direito autoral e transformou a cultura em produto — e a da cultura — que, como é diálogo, precisa que seus atores tenham liberdade de lançar mão de obras produzidas pela humanidade para se sustentar.
“O Google lançou-se a digitalizar todas as obras que encontrava sem pedir autorização aos autores”, constata ele. E o acordo delineado como resultado dos processos judiciais vai permitir a digitalização de obras sem que seja necessário, para isso, consultar a todos os criadores envolvidos nelas. Isso tornaria impossível colocar essas obras ao alcance do público, porque nem sempre é possível localizar todos esses interessados. Pelo acordo, em vez de ser pago um direito autoral unilateral, os usuários pagam uma compensação para ter acesso às obras.
“É uma nova maneira de exploração das obras também em benefício do autor, porque vai criar uma multidão de contributos. Poderemos ter as obras a nossas disposição sem sentir o peso efetivo disso, como acontece quando enviamos um e-mail. Nós não nos perguntamos quanto aquilo vai custar”.
Nesta mudança da cultura materializada — os livros impressos — para a cultura digital, as pessoas terão, em vez de muitos montes de papel, a possibilidade de acesso e consulta a bibliotecas digitais. “Se esse gesto for de tal maneira barato que não seja preciso pensar em seu preço, a massa enorme de muitos baratos compensa os empreendedores e os direitos do autor”, diz ele.
Material e digital
O Simpósio Internacional de Políticas Públicas para Acervos Digitais, organizado pelo Ministério da Cultura, pela Biblioteca Digital Brasiliana e pela Casa da Cultura Digital começou hoje e vai até quinta-feira, dia 29. Reúne especialistas e profissionais do Brasil e do mundo para a troca de experiências, conceitos e soluções a fim de propor políticas públicas de digitalização de acervos e de formulação de um modelo sustentável de preservação e acesso universal do patrimônio cultural brasileiro. E para colocar esse patrimônio ao alcance da população.
É, na prática, o encontro da cultura materializada com a cultura digital. “Desde que o ministro Gilberto Gil assumiu o MinC”, disse hoje na abertura do simpósio Afonso Luz, diretor de estudos e monitoramento de políticas culturais do ministério, “as políticas para o campo digital e o novo paradigma que condiciona todo o campo da cultura vieram para primeiro plano da agenda”. Esta cultura digital avançou mais ao encontrar os livros e, assim, abrir o debate sobre como colocar em primeiro plano o direito de acesso da população brasileira aos seus acervos culturais. É este o debate dos próximos dias. A participação é gratuita e o simpósio está sendo transmitido pela internet, neste endereço.