Amazônia com cidadania


Projeto integra comunidades a ações de desenvolvimento por meio de tecnologia de terceira geração para celular


Projeto integra comunidades a ações de desenvolvimento por meio de tecnologia 3G Vera Franco

ARede nº55 fevereiro de 2010 –
A jovem paraense Mônica de Almeida, de 21 anos, começou o ano novo animada por um grande desafio: compartilhar suas habilidades para criar conteúdos na internet com as populações que habitam aldeias e vilarejos nas margens dos rios Tapajós, Amazonas e Arapiuns. Estudante de jornalismo, Mônica trabalha como monitora no telecentro de Belterra, Pará, e tem como tarefa, este ano, conectar no mínimo 150 pessoas em uma rede  tecnológica de terceira geração (3G), combinando o uso de telefone celular e de internet para aprender, para ensinar, para dispor de serviços públicos, enfim, para ter uma qualidade de vida melhor, a partir do uso de tecnologias de ponta. Os integrantes dessa rede, que serão selecionados em seus locais de origem, vão receber um celular com câmera de alta resolução, sistema de navegação rápida pela web, aplicativos educativos e crédito mensal de R$ 15,00. Eles serão os pontos de ligação entre as suas comunidades e o Projeto Saúde & Alegria, organização não-governamental que há 22 anos desenvolve, no Oeste do Pará, programas de saúde, educação, economia da floresta, cultura e comunicação.

Idealizada pela Vivo, em parceria com a Ericsson, essa iniciativa criativa de inclusão digital tomou corpo em dezembro de 2009, com a implantação, na cidade de Belterra, de uma antena 3G para acesso a voz, internet e banda larga móvel. Na fase piloto, participam 15 comunidades. A ideia de envolver o Saúde & Alegria surgiu no âmbito da Rede Vivo Educação, do Instituto Vivo, que consiste em uma ferramenta interativa de articulação de pessoas e ideias em torno dos temas Educação e Tecnologia. Foi nesse espaço que se reuniram os parceiros para viabilizar o projeto. O Instituto Vivo dá suporte ao Saúde & Alegria no desenvolvimento de metodologias e práticas de aprendizagem em rede, com o uso dos dispositivos de telecomunicação móvel.

A intenção é criar Arranjos Educativos Locais (AEL), que seriam sistemas socioeducativos que promovem o agrupamento de pessoas em rede para aprender juntas, por meio do compartilhamento de conhecimentos e experiências. “Tudo ainda é muito teórico e exige muita leitura. Esse novo modelo de educação é uma volta ao tempo em que as pessoas trocavam informações a partir de suas vivências”, conta Mônica, que trabalha também como repórter da Rede Mocoronga de Comunicação. Sua missão será visitar, no período de um ano, 850 pessoas e, uma vez identificadas suas competências, criar uma rede de 150 participantes.
O projeto de Belterra se propõe a ir muito além da implantação de uma tecnologia 3G. “Não chegamos apenas com uma antena de telefonia móvel, mas com soluções de alta relevância econômica, social e cultural para a população”, diz Roberto Lima, presidente da Vivo. O projeto, que agrega várias empresas em torno de um propósito, tem a preocupação de oferecer conteúdos. A israelense La Mark, fornecedora da Vivo, doou 60 licenças do Kantoo English, curso de inglês pelo celular, ao custo de R$ 3,99 por semana, sem taxa pelo consumo de dados durante a utilização. Um sistema desenvolvido pelo CPqD em linguagem Java possibilita gravar e transmitir vídeos pelo browser de serviços do celular. Há soluções para vídeoMap e videoBlog. O pacote inclui ainda um tipo de jornal eletrônico, com programas da TV Cultura, como as lições de português do professor Pasquale Cipro Neto, as lições de história “Cenas do Século” e programas de teoria de relatividade “Minuto Científico”. O Hospital Albert Einstein se comprometeu a oferecer soluções de medicina em tempo real para o Abaré, barco-hospital que faz, em média, por ano, 15 mil atendimentos e 350 cirurgias em 72 comunidades ribeirinhas.

Além de instalar a antena, o sistema de rádio comunicação e doar 250 telefones celulares, a Ericsson tornou disponível o Mobile Survey Tool, ferramenta de comunicação on e off line para monitorar impactos ambientais, fazer diagnósticos na área da saúde, facilitar a comunicação entre o Saúde & Alegria e as comunidades. Outro benefício será a facilidade de realizar pesquisas para monitoramento do Felicidade Interna Bruta (FIB), indicador da qualidade de vida das pessoas criado pelo Saúde & Alegria. A própria ONG poderá gerar questionários para o celular, otimizando o tempo de elaboração e tabulação dos dados. “O que antes levava dez dias, em função da distância e da dificuldade de acesso a determinadas regiões, agora é possível fazer em um dia”, explica Paulo Lima, coordenador de inclusão digital do Saúde & Alegria.

Não resta dúvida de que a tecnologia pode contribuir e muito para que o Brasil se torne um modelo de sustentabilidade. “A sociedade, no entanto, ainda não percebe o valor das telecomunicações em áreas remotas como sendo essencial para o desenvolvimento das pessoas”, observa Fátima Giandini, presidente da Ericsson. Falta de cultura ou de informação, não importa. O fato é que a tecnologia sem fio parece ser a forma mais apropriada de levar saúde e educação para a população da Amazônia. E a Rede Mocoronga de Comunicação, do projeto Saúde & Alegria, está aí para contar ao mundo, por meio de todo o material que será gerado nessa experiência, de que forma a tecnologia pode ajudar a construir um legado da história de mais de 3 milhões de pessoas que vivem na floresta Amazônica. Como diz com propriedade o visionário médico infectologista Eugênio Scannavino Netto, criador do Saúde & Alegria, que há 30 anos dedica sua vida a cuidar da região, “O povo da Amazônia merece ser brasileiro com cidadania”.

em Suruacá
O aumento da conectividade com um projeto que integra as localidades por tecnologia móvel promete reduzir um dos principais problemas do Oeste do Pará, a dificuldade de deslocamento. As comunidades ficam isoladas, em função da baixa cobertura de malhas viárias. As pessoas costumam percorrer grandes distâncias a pé, de barco ou em pequenas canoas.

Suruacá, uma das comunidades ribeirinhas da Reserva Extrativista Arapuins, situada à margem esquerda do caudaloso rio Tapajós, fica a quatro horas de Santarém, via rio – o único meio de se chegar lá é de barco. Fundada em 1890, a cidade tem hoje 117 famílias que formam uma população de mais de 500 pessoas. Elas vivem basicamente de pesca, agricultura, artesanato e cultura da mandioca.

Há oito anos, três a quatro crianças morriam anualmente de doenças como coqueluche e sarampo. Nos últimos oito anos, o índice de mortalidade foi reduzido a zero, graças à ajuda do Saúde & Alegria. A comunidade, considerada modelo por sua organização e, por isso, multiplicadora do projeto, tem 180 crianças no ensino fundamental.

Tráfego na rede
Há uma demanda reprimida de telefonia móvel no Brasil, em especial nos municípios com menos de 30 mil habitantes. O governo espera suprir essa carência até o final deste ano. Uma das grandes vantagens do projeto de banda larga de terceira geração, cuja licitação ocorreu em abril de 2008, foi vincular as regiões consideradas menos atrativas economicamente às áreas de maior interesse. A concessão para explorar a região metropolitana de São Paulo, por exemplo, obrigou as operadoras a atender cidades dos estados Amazonas, Amapá, Pará, Maranhão e Roraima.
A experiência da Vivo em Belterra – operadora que chegou à frente de outras concessionár ias no uso da fibra ótica para provimento de acesso à internet – mostra que aquilo que parecia ônus para as empresas de telefonia móvel pode representar oportunidades de negócio. “Tão logo foi instalada, a antena começou a gerar tráfego em nossa rede. O retorno do investimento de R$ 700 mil, inicialmente estimado em três anos, deve ocorrer em um ano”, prevê Luis Guggenberger, responsável pela Rede Vivo Educação.
A infraestrutura de comunicação da Vivo foi viabilizada pela rota própria, alugada da Eletronorte, que estava instalada e sem uso. A Vivo já atendeu as metas exigidas pela Anatel para 2009, oferecendo cobertura a 95 municípios no Oeste do Pará. Restam cinco, para 2010.