Miriam Aquino, colunista do Tele.Síntese
13/06/2013 – As recentes denúncias – geradas por um cidadão norte-americano, que decidiu colocar em risco sua própria liberdade para preservar as liberdades alheias – de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) norte-americana violava a internet de milhões de cidadãos de todo o mundo nos afeta também, brasileiros. É estranho o silêncio da sociedade civil – e mesmo da viligante militância em prol da liberdade de expressão e da preservação da liberdade na internet – sobre este episódio. Um Estado estrangeiro quebrou o sigilo dos e-mails, correspodências, e até as fotos de família de milhões de usuários de todo o mundo, o que inclui todos nós, e aqui é como se nada tivesse ocorrido. Até parece que a nossa internet roda em uma nuvem de outra galáxia.
Para acalmar os seus cidadãos frente ao tamanho desrespeito constitucional, o presidente Barack Obama chegou a fazer uma singela afirmação ao explicar o poderio do sistema Prism: “Em relação aos emails e à internet, isto não se aplica aos cidadãos dos Estados Unidos, e não se aplica ao povo que mora nos Estados Unidos”. Ou seja, para o presidente norte-americano, está tudo bem, porque os Estados Unidos só violam o direito das outras seis bilhões de almas que vivem ao redor do mundo, incluindo as brasileiras, mas não de seu próprio povo.
O que torna esta vigilância militar ainda mais preocupante é que ela foi feita nas principais empresas da internet, que, não por acaso, são todas de origem norte-americanas. Embora Google, Facebook, Yahoo ou Twitter tenham negado modificações em seus sistemas para permitir o acesso da NSA, as notícias estrangeiras dão conta de que a agência tinha acesso online às informações, incluindo emails e fotos. Ora, não é possível que estas empresas, com seus sistemas tão sofisticados, não soubessem deste “vazamento” militar.
Marco Civil
Este escândalo remete à discussão para o novo paradigma que está sendo criado na web. Embora a internet continue a ser uma rede “sem dono”, onde as ideias podem – e devem – circular livremente, a sua captura e visibilidade só existem se passarem por empresas norte-americanas. Não é sem razão que diferentes Nações em todo o mundo criaram regras para preservar os direitos de seus cidadãos, que passa também pelo pagamento de impostos.
Muitos países estão propensos a impedir que essas empresas deixem de se aproveitar das “elisões fiscais” que estão se tornando ainda mais difíceis de serem pegas no mundo virtual. Até mesmo o Senado norte-americano chegou a questionar práticas pouco ortodoxas do Google, que, na visão dos senadores, estava pagando poucos impostos em solo americano, por conta engenharias contábeis com suas subsidiárias localizadas em paraísos fiscais.
Países com Espanha, França ou Alemanha já fizeram ou discutem legislações que buscam fazer com que Google ou Facebook deixem um pouco mais do que marca na internet e fiquem somente com as gordas arrecadações publicitárias. Nesses países, as leis estão sendo mudadas para fazer com que as empresas OTT também paguem impostos como qualquer outra corporação, o que não ocorre hoje.
No Brasil, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, mostrou-se atento ao tema e já mobiliza o governo para lidar com a questão do sigilo, o que é uma iniciativa bem-vinda. Este episódio pode abrir a oportunidade de se fazer do limão uma limonada. Com a exposição de nossa fragiliade – foi constatado que não temos arcabouço legal para nos proteger desses abusos, a não ser as decisões judiciais, tomadas sem o respaldo da lei – Paulo Bernardo defende a aprovação de um projeto de lei pelo Congresso Nacional que obrigue a manutenção da base de dados dos brasileiros em território brasileiro.
Mas seria este também um bom momento para o governo mobilizar suas bases, aparar as arestas e fazer votar o Marco Civil. A neutralidade da rede parece ter tomado outras proporções. As teles chegaram a apresentar uma nova proposta que não é muito diferente à da posição inicial do Ministério da Justiça. Parece haver um amplo espaço para o acordo, no qual o governo petista pode voltar a ser o protagonista.
A aprovação do Marco Civil e de um projeto que nos proteja das ações de nações estrangeiras e das omissões das empresas de internet estrangeiras poderão vir juntos, em mais uma prova, de que, aqui, nós os brasileiros estamos satifeitos em só cuidar de nós mesmos, o que já está de bom tamanho.