O MEC vai começa a instalar laboratórios de informática nas escolas rurais. O maior desafio está na conexão.
Miriam Aquino
O Desafio da conexão no campo será enfretado pelo MEC, como o é por ação social da Embratel, em algumas localidades. Da esq. para dir.: Careiro do Castanho (AM), Ponto Comunidade Querubins (Belo Horizonte, MG) e Ibimirim (PE)
O Ministério da Educação, por meio da Secretaria de Educação a
Distância, vai dar início, este ano, a um dos mais complexos projetos
de melhoria do ensino com o apoio da tecnologia da informação: começa a
implantar laboratórios de informática nas escolas rurais brasileiras.
No orçamento de 2007, estão reservados R$ 88 milhões para a compra dos
equipamentos que serão instalados nas escolas rurais de 5ª a 8ª séries,
com mais de 50 alunos matriculados. Isso significa que 11.927 escolas
rurais do país vão contar, até o próximo ano, com laboratórios de
informática. Por que a opção de informatizar as escolas públicas
rurais, muitas das quais não têm rede de energia capaz de suportar dez
computadores (34,6 mil não têm nem energia), se existe, ainda, uma
grande quantidade de escolas urbanas sem um único computador? Para se
ter uma idéia do esforço que terá que ser feito, só depois do reforço
orçamentário em 2005 e 2006 é que o MEC conseguirá, este ano, colocar
laboratórios de informática em todas as 16 mil escolas públicas de
ensino médio do país.
Para Ronaldo Mota, secretário de Educação a Distância, informatizar as
escolas rurais é estratégico: “O morador da zona rural, se não tiver
contato digital na escola, não o terá em nenhum outro lugar. E não
podemos permitir o aumento da injustiça social, com o crescimento
daqueles que não têm acesso ao conhecimento da sociedade contemporânea.”
Para levar o conhecimento digital ao mundo rural, o MEC teve que
adaptar os novos laboratórios a serem adquiridos. Haverá apenas um
desktop interligando de cinco a dez terminais autônomos. Além disso, um
único equipamento reunirá as funcionalidades de aterramento,
estabilização de tensão, filtro contra ruídos e transformador de
voltagem, de maneira a fazer com que os laboratórios se adeqüem ao
pequeno dimensionamento dessas redes elétricas.
Mas o grande desafio, reconhece Mota, será mesmo conectar essas escolas
à internet. Ele diz, por exemplo, que os custos da conexão via satélite
são inviáveis de serem arcados exclusivamente pelo MEC. Tomando por
base os custos das antenas Gesac — de R$ 400,00/mês, segundo estudo do
MEC —, seriam gastos R$ 5 milhões/mês ou R$ 60 milhões/ano apenas para
conectar essas quase 12 mil escolas rurais. Como o objetivo, nos
próximos três anos, é levar a informatização a mais 45 mil escolas
rurais, atendendo a cerca de 60% dos 2,7 milhões de alunos que estão no
campo, a conta ficaria astronômica.
Assim, o MEC negocia com os demais órgãos do governo — entre eles,
ministérios das Comunicações e do Planejamento — uma solução capaz de
assegurar a conectividade banda larga a essas escolas. Entre as
alternativas analisadas está a de usar a Rede Nacional de Pesquisa
(RNP), juntamente com as soluções wireless
(como WiMAX). Ronaldo Mota reconhece, porém, que a RNP não teria a
capilaridade necessária, mas acredita que, com mais recursos, poderia
vir a tê-la.
Ele está convencido, porém, de que a melhor alternativa — seja por
satélite, redes das concessionárias ou a rede de pesquisa — para a
inclusão digital é instalar a conexão banda larga nas escolas. “Nossos
estudos mostram que, ao se instalar a banda larga nas escolas públicas,
alcança-se também os postos de saúde e da previdência social de todas
as localidades,” assegura.
Mas o programa nacional de banda larga ainda está em discussão no
governo. E também não há recursos alocados, além do que está previsto
no programa Gesac. Segundo Mota, são duas as principais fontes em
análise: recursos orçamentários através do PPI (Projeto Piloto de
Investimentos) — os projetos que poderão contar com investimentos do
governo sem que sejam incluídos no cálculo do superávit primário
(estima-se que haverá, para este ano, R$ 12 bilhões para esses
projetos) e os recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços
de Telecomunicações).
Embora estejam previstos, no orçamento de 2007, só R$ 9,5 milhões para
o Fust, o secretário de telecomunicações do Minicom, Roberto Pinto
Martins, lembra que a própria lei orçamentária estabelece que os
recursos originários das taxas cobradas sob a forma de Cide
(contribuição de intervenção no domínio econômico), caso do Fust, podem
ser liberadas para uso por decreto presidencial. E, por isso, espera-se
que um decreto direcione os mais de R$ 700 milhões que serão
arrecadados este ano com o Fust para inclusão digital. Mas Mota lembra
que, de 2001 a 2003, o Proinfo do MEC não instalou um único computador,
porque ficou aguardando dinheiro do Fust, que nunca chegou. E por isso,
afirma, o Proinfo rural vai acontecer, mesmo se não puder contar com a
conexão à internet.
Novos compositores
Escola de Belo Vale
Ele salienta que a sua secretaria destina, hoje, mais recursos para a
produção de conteúdo digital do que para a compra de equipamentos. Em
três anos, a Secretaria de Educação a Distância saiu de um orçamento de
R$ 50 milhões para R$ 500 milhões. “O brasileiro tem, na produção de softwares,
a mesma criatividade que tem com os ritmos musicais”, afirma. Assim, as
máquinas do Proinfo rural chegarão às escolas com um vasto conteúdo
digital e educacional. “Há dois anos, não teríamos condições de tocar
esse programa, pois não havia conteúdo suficiente. Agora, a realidade é
outra”, assinala Mota. Os computadores para as escolas rurais, que
serão adquiridos este ano, e começarão a ser distribuídos em 2008,
conterão, entre outras, as obras de domínio público (são cadastradas
por mês 3 mil obras) e mais de mil horas de programação da TV Escola.
Se não puder contar com a internet para a atualização desses conteúdos,
isso será feito por meio de mídias como CDs, DVDs e pen drives,
completa Mota.
Não foi por acaso que o Ministério das Comunicações pediu o adiamento,
por seis meses, do início da instalação dos Postos de Serviços de
Telecomunicações (PSTs), obrigação contratual que as concessionárias de
telefonia tinham que começar a cumprir a partir de janeiro de 2007. Com
o adiamento, a equipe do Minicom ganha o tempo necessário para fazer um
plano alternativo, ao qual as concessionárias poderão aderir ou não. E
o plano alternativo inclui a construção de backhaul (o trecho da rede que leva a comunicação do backbone até o ponto de presença) para atender a mais mil cidades.
Por que o backhaul é fundamental para o desenvolvimento da
banda larga no país? Por uma razão muito simples: apenas cerca de 700
cidades do país contam com infra-estrutura de banda larga. Os demais
municípios têm que conviver com o acesso discado à internet ou com
conexões via satélite que, no caso do programa Gesac, do Ministério das
Comunicações, cobre um único ponto (em algumas localidades o sinal é
distribuído, via rádio, para um, dois ou, no máximo, três pontos). Esse
cenário, dizem técnicos que estão estudando o tema, exige que o país
priorize a construção do backhaul. “Não adianta você construir
uma rede de distribuição de água para atender aos domicílios de uma
cidade, se não há água”, compara um técnico, para explicar por que a
banda larga na última milha depende do backhaul.
A existência do backhaul também é essencial para que o
governo leve à frente o projeto de informatização das escolas e sua
conexão à internet, fundamental para o desenvolvimento do programa de
melhoria da qualidade de ensino, prioridade do segundo mandato do
governo Lula. Se o programa não caminhar paralelamente à construção do backhaul,
começando pelas cidades onde já existe infra-estrutura de banda larga,
das duas uma: ou vão ser desperdiçados recursos, com o uso excessivo de
conexões via satélite, muito caras, ou o programa vai patinar. De
acordo com seu secretário-executivo, coronel Oswaldo Oliva Neto, o
Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República prevê
gastos, com esse programa, de R$ 1,5 bilhão em 2007. Só que a previsão
orçamentária de recursos do Fust é de apenas R$ 9,5 milhões. Mesmo que
seja editado um decreto presidencial para usar os R$ 700 milhões — ou
parte deles — que serão arrecadados com o Fust durante este ano, há
dúvidas se eles poderão ser usados na construção do backhaul
sem mexer na legislação. Por isso, a idéia em desenvolvimento pela
equipe técnica do Minicom é que possa haver uma troca de obrigações com
as concessionárias locais. No lugar de instalar os PSTs, elas fariam o backhaul.
Feitas as contas, seria possível, com os recursos demandados pela
instalação dos PSTs, levar o ponto de presença da banda larga para mais
mil cidades, aumentando a cobertura da rede atual em 142%. A partir de
2008, os recursos terão de sair do Fust. Para isso, avaliam dirigentes
da Anatel, terá que ser criado um novo serviço público e muito
provavelmente a Lei do Fust terá que ser alterada. “Ela cobre a conexão
de escolas, bibliotecas, postos de saúde, etc., mas não cobre a
infra-estrutura que não chega a essas unidades”, pondera o conselheiro
Pedro Jaime Ziller de Araújo. E já há movimentos no Congresso Nacional
nesse sentido. Com um programa consistente de banda larga, que inclua o
backhaul e as aplicações sociais, vários parlamentares entendem que
será viável alterar a Lei do Fust, em 2007. Se isso for verdade, resta
ainda uma disputa dentro do governo: quem vai construir o backhaul. O
secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do
Planejamento, Rogério Santanna, defende que esse seja um papel do
governo, por meio de empresas públicas, para quebrar o paradigma de
preços de banda larga no país. Técnicos do Minicom e da Casa Civil têm
se pronunciado no sentido de que as concessões continuem nas mãos da
iniciativa privada.
Se a tendência é transformar o backhaul em serviço público, a ser
prestado por meio de concessionárias, a oferta de banda larga na última
milha deve continuar como serviço de valor adicionado, para permitir a
participação do maior número possível de prestadoras de diferentes
portes e com as mais diversas soluções tecnológicas. Algumas simulações
feitas por técnicos do Minicom, e também pela iniciativa privada,
indicam que em cerca da metade, ou um pouco mais, dos municípios
brasileiros, é viável a oferta comercial de serviço de banda larga.
Desde que os governos, nos três níveis, invistam na oferta de serviços
de governo eletrônico e garantam parte da demanda ao prestador de
serviço, por meio da conexão das administrações municipais, das
escolas, postos de saúde, bibliotecas, unidades de segurança pública,
etc. Na outra metade dos municípios, segundo esses estudos, a oferta do
serviço não é viável economicamente. Assim, ele terá de ser provido
pelo Estado. Seja pelas prefeituras, pelos governos estaduais ou pela
União, ou por meio de parcerias entre eles.