Ativistas reagem à aquisição de softwares proprietários pela CEF

Ministério Público recebe denúncias por compra de licenças Microsoft para servidores e estações de trabalho no valor de R$ 112 milhões

Ciça Vallerio

03/07/2012 – O pregão da Caixa Econômica Federal, realizado dia 21 de junho para aquisição de licenças de software da Microsoft, por R$ 112 milhões, deflagrou manifestações entre ativistas do software livre. Três denúncias foram protocoladas por ativistas do Mega Não! no Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ) e no Ministério Público Federal do Distrito Federal (MPF-DF). Um e-mail foi enviado ao Conselho Administrativo de Defesas Econômica (Cade). Clique aqui para saber mais.

A polêmica não se restringe ao gasto milionário pela instituição financeira pública. Ativistas argumentam que, além de transferir esse ônus para o cidadão, o investimento em produtos proprietários sinaliza uma mudança na política de governo, que vem apoiando a implantação de software livre. João Carlos Caribé, consultor de inovação e comunicação, acredita que tem acontecido um enorme retrocesso nas políticas digitais, no governo Dilma Rousseff: “A impressão que se tem é que esse governo olha para a internet como um simples passatempo adolescente, em vez de enxergar como uma das estratégias de desenvolvimento do país. A rede não traz só conhecimento, como também movimenta a economia”.

Outra questão apontada pelos ativistas é a existência de plataformas similares de softwares livres sem custo ou de baixo custo. A própria CEF utiliza plataformas livres. A 4Linux, por exemplo, foi contratada pela Caixa para implementar o novo correio eletrônico Expresso Livre. E o Programa de Racionalização de Gastos e Eliminação de Desperdícios da Caixa (Proged) premiou quatro projetos baseados em software livre: Multicanal, com mais de 35 milhões economizados e divulgado no FISL2010; utilização do Linux em ambiente mainframe e outros projetos, com economia de R$ 32 milhões; Sisag, nova automação bancária da Caixa, com economia de R$ 38 milhões; e os portais de atendimento e do bolsa família, com economia de R$ 22 milhões.

Em comunicado coletivo sobre o pregão, Rodolfo Gobbi, diretor-geral da 4Linux disse: “O Linux continua a ser usado nos ATMs, nos terminais lotéricos e em vários outros projetos. Outras soluções em software livre continuam a ser utilizadas com sucesso e com serviços da 4Linux.” Clique aqui para ver a íntegra.

De acordo com o presidente da Associação do Software Livre, Ricardo Fritsch, para cada um dos produtos listados no objeto do pregão há uma ou mais soluções abertas compatíveis que são utilizadas em larga escala no mundo corporativo. “Para esses softwares livres, podem ser contratados os serviço de atualização tecnológica, suporte técnico e suporte adicional, a serem prestados por empresas nacionais, sem necessidade de envio de substancial quantia de royalties para o exterior”, explica.”O Brasil é uma das referências mundiais na aplicação de software livre. Então, por que não utilizar o que temos de melhor em favor do país, investindo esse dinheiro em empresas de TIs nacionais, totalmente capacitadas, em vez de mandar para Seattle, nos EUA, onde fica a sede do Microsoft? Esse dinheiro alavancaria muitas empresas brasileiras.”

Em nota, representantes da CEF informaram que, “apesar dos esforços da Caixa e dos fornecedores para suporte e consultoria em software livre, não foram alcançados resultados satisfatórios em inúmeros projetos estruturantes da plataforma baseada em soluções livres. Isso implica a manutenção da infraestrutura de TI sobre a plataforma proprietária instalada”.

No entanto, o sociólogo e ativista Sérgio Amadeu diz que a instituição financeira cancelou contratos de suporte a sistemas abertos e os sistemas começam a dar falha: “Enquanto isso, colocam dinheiro no suporte da Microsoft. A Caixa deveria ampliar o desenvolvimento, o suporte e a manutenção de software livre para investir em desenvolvedores brasileiros”. 

Política governamental

Apesar de ser uma das signatárias do Protocolo de Brasília – termos de compromisso entre organizações para utilização do ODF, padrão aberto para armazenamento e troca de documentos neste formato – a CEF não precisa necessariamente atender à diretriz do Ministério do Planejamento de priorizar software livre. Apenas ministérios, autarquias e fundações estão obrigadas a participar do Sistema de Administração dos Recursos de Tecnologia da Informação (Sisp). E a adesão é facultativa a empresas públicas e sociedades de economia mista.

“Pelo fato da CEF ser signatária do Protocolo de Brasília, o investimento em software proprietário é um retrocesso e deixou todos estarrecidos”, lamenta Fritsch, da ASL. “É difícil acreditar na justificativa para a compra em larga escala da Microsoft, se existem centenas de programas livres disponíveis. Acredito, porém, que a mobilização contra o pregão vai fazer a CEF reavaliar esse negócio”, ressalta.

Microsoft oferece Office gratuito

Enquanto esquenta a polêmica da compra feita pela CEF, a Microsoft anunciou, dia 28 de junho, que vai oferecer de graça o Office 365 para escolas e universidades. Esse aplicativo, já usado em empresas internacionais em versão paga, foi lançado no Brasil há sete meses. As instituições de ensino vão ter acesso aos serviços básicos e a subsídio na compra de serviços avançados. Clique aqui para saber mais.

Ativistas do movimento do software livre não veem com bons olhos essa oferta da Microsoft. Para Marcelo Saldanha, presidente do Instituto Bem Estar Brasil, “isso não deixa de ser uma estratégia em benefício próprio. Sem contar que essa versão de software proprietário é inferior ao BR Office, desenvolvido a partir de software livre, que bate inclusive o Office Professional”. (Colaborou Marina Pita, do Tele.Síntese)

 

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