Para que serve essa máquina?

O potencial pedagógico dos portáteis vai muito além da preparação de aulas em casa e registro de presença



ARede nº67 – Mar
ço de 2011


Um professor pode usar o seu notebook para ligar ao data show e exibir um texto digitado, que os alunos devem ler ou copiar. Assim economiza o tempo de escrever na lousa. Também pode abrir uma página da internet e mostrar à garotada fotos e filmes que tratam do tema da aula. Imagens e animações ajudam a compreender conceitos e a gravar as informações. Só que… isso é a mesma coisa que se sentar na cabine de comando de um jato modelo Boeing, ligar o motor e pilotar a aeronave a 20 quilômetros por hora, sem levantar da pista.

Usar o notebook como um livro eletrônico, ou um projetor, está muito aquém do potencial pedagógico que esse equipamento oferece. Sem dúvida, é um começo, para os que não estão familiarizados com o mundo da tecnologia. E não são poucos. Basta contar quantas faculdades de Pedagogia preparam os futuros mestres para usar as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) em suas vidas profissionais. No entanto, apontam os especialistas, se o professor receber uma boa formação, junto com o equipamento, e se a escola tiver um projeto pedagógico consistente, o domínio da ferramenta é o que menos importa.

“O principal é a concepção de educação”, destaca Nelson Pretto, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. O fundamental, para o educador de educadores, não é “a pedagogia que vem embarcada na máquina”, ou seja, não são os programas educacionais, nem como usá-los. O grande ganho, na opinião de Pretto, é utilizar a tecnologia de modo que possibilite aos professores e aos estudantes produzir os próprios recursos educacionais. “Aí teremos um rico diálogo entre o conhecimento estabelecido, ou seja, os conteúdos formais, e o saber local, os conteúdos que vêm das experiências e da realidade de cada escola, de cada aluno”, explica ele. Para isso, acrescenta, é fundamental trabalhar com o software livre.

A grande maioria dos notebooks de programas públicos vem com o sistema operacional Linux (ver página 12), que permite customizações e adaptações dos programas, da forma como Nelson Pretto recomenda. Mesmo os que vêm com programas proprietários, como o Windows, têm, na maior parte, possibilidade de operar também em software livre – que é gratuito.

Ter ferramentas, porém, não basta. Para tirar o melhor proveito das TICs, os professores precisam de formação, alerta Maria Elizabeth Biaconcini de Almeida, coordenadora do Programa de Pós-Graduação Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Elizabeth também é uma das responsáveis pela formação de docentes no programa Um Computador por Aluno (UCA), do governo federal, em que estudantes e professores recebem netbooks educacionais. Em João Pessoa (PB), por exemplo, é assim. No programa Professor Plugado, da secretaria de Educação, o professor precisa ter cumprido 75% da carga horária da capacitação para receber seu equipamento. Fabrício Feitosa, diretor de Tecnologia da Secretaria conta que a capacitação contempla os módulos 1 e 2 do ProInfo.

Na maioria dos casos, os professores “descobrem” os recursos das máquinas por conta própria. E, em alguns estados, a capacitação fica a cargo das próprias escolas ou dos Núcleos de Tecnologia Municipal ou Educacional. Os usos mais frequentes são nas tarefas de gestão (controle de presença, lançamento de notas etc.) e nas pesquisas para preparar aulas. Para Elizabeth, não há sentido em “usar a tecnologia para fazer o mesmo mais rápido, ou, para fazer mais do mesmo”. Existem vários bancos de objetos educacionais disponíveis na internet, e não há dúvida de que planilhas eletrônicas, programas para fazer apresentações ou gráficos animados ajuda o aprendizado, diz a educadora.“Mas, em termos de aprendizado, ela acredita que o resultado é muito mais eficaz quando a própria experiência é objeto da análise. Então, o melhor é pôr os meninos para propor e produzir atividades, filmando, gravando, e até integrando diferentes mídias”. (A.L.)

Informática na veia

Diplomada na primeira turma da Faculdade de Enfermagem do Hospital Israelita Albert Einstein, em 1992, Ana Elisa Ártico começou sua carreira aprendendo a lidar com seringas e mouses. Dos estágios durante o curso ao cargo que ocupou, em 1994, nesse hospital, entedeu que a tecnologia é um diferencial importante. “Naquela época, já se fazia muita coisa no computador. Solicitação e conferência de exames, relatórios de enfermagem, prontuários, prescrição médica… praticamente todas as rotinas hospitalares tinham registros eletrônicos”, lembra ela.

Foi com essa formação que Ana se tornou professora, no ano 2000, na Etec Cel. Fernando Febeliano, em Piracicaba (SP), uma escola pública ligada ao Centro Paula Souza. No que diz respeito a tecnologia, o ambiente era bastante diferente do que ela conhecia: “Eu praticamente não tinha contato com computadores. Havia um único laboratório de informática, para todos os cursos. E nem se falava em internet”. Naquela época, Ana também não tinha computador em casa.

Dois ou três anos depois, ela comprou um PC. Usava para mandar e-mails, fazia pesquisas para suas aulas. De lá para cá, não se separa mais das maquininhas. Em sua casa, ela tem um notebook e um netbook (porque cabe na bolsa). O marido, tem um notebook. O filho de 13 anos também. O de 10, tem um netbook. O desktop não foi dispensado – é “reserva”.

Ana não frequenta redes sociais. O notebook, comprado pelo programa de financiamento com juros subsidiados, do governo do Estado de São Paulo (ver página 12), “é um instrumento de trabalho”. Inseparável: “Outro dia, o computador da sala de aula deu problema e, como estava com o meu, foi só plugar o data show”. Fora das aulas, Ana usa o equipamento em sua outra atividade dentro do Paula Souza, onde cuida dos projetos de capacitação de docentes na área de enfermagem. “Participo de tudo o que tem a ver com a implantação desses cursos. Inclusive os laboratórios de informática”, diz. Naturalmente.