Projeto que propõe rigor em criminalização na internet recebe várias críticas em audiência pública
Lúcia Berbert
ARede nº43 Dezmbro de 2008 – Copiar para seu MP3 uma música de um CD que você comprou pode virar crime, com pena prevista de até três anos de reclusão, caso seja aprovado, da forma como saiu do Senado, o projeto de lei de crimes na internet, em fase final de votação na Câmara. A proposição prevê a criação de nove novos crimes no Código Penal Brasileiro. O projeto foi apresentado na Câmara em 1999, mas ganhou maior rigor este ano, no Senado, embalado pelas ações contra a pedofilia. Segundo seus críticos, a redação não coíbe o crime contra menores, que em novembro ganhou uma lei específica, mas atende a expectativas do setor bancário, da indústria fonográfica e dos setores de TV paga e radiodifusão.
Em recente audiência pública na Câmara dos Deputados, no final de novembro, o PL 84/99, que tipifica crimes e delitos cometidos na área de informática, recebeu duras críticas da academia, do governo e dos provedores. A abrangência excessiva da tipificação dos crimes, que poderá criminalizar comportamentos normais; a possibilidade de controle da internet; e as dificuldades que deve criar para proliferação dos telecentros e cidades digitais são as principais.
O relator da matéria na Comissão de Ciência e Tecnologia, deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP) reconhece que, como está, o projeto não pode ser aprovado, sobretudo a parte que cria novos artigos para o Código Penal, o 285-A e 285-B, que define crimes de informática e suas penas. Porém, tem dúvidas em relação ao artigo 22, que obriga o armazenamento dos LOGs de acesso à internet, pelos provedores.
O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) é favorável à supressão de todos os artigos polêmicos. Posição também defendida pelo secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay. O delegado Carlos Eduardo Sobral, coordenador da Unidade de Repressão a Crimes Cibernéticos da Polícia Federal, o desembargador Fernando Botelho, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, e o advogado Renato Opice Blum defenderam a aprovação integral da proposta.
O professor da Faculdade Cásper Líbero, Sérgio Amadeu, entende que, da forma com está o texto da proposta, generalizado, um comportamento lúdico na internet pode se tornar um crime. “É uma lei arbitrária”, condenou. Ele defende a supressão de boa parte do artigo 2º e do artigo 22. Na opinião de Amadeu, a proposta traz prejuízos para o avanço das cidades digitais e para a proliferação de telecentros e eleva o custo Brasil nas comunicações.
O professor de Direito Penal, Thiago Bottino, e o pesquisador Luiz Fernando Moncau, ambos da Fundação Getúlio Vargas, foram ainda mais críticos. Eles acreditam que o Brasil deveria optar por um marco civil, antes de partir para uma lei penal. “É preciso deixar claro deveres e obrigações de todas as partes que utilizam a internet, antes de criar punições severas”, disse Moncau. Para Bottino, os artigos que tipificam os crimes não descrevem de forma clara e precisa o comportamento que se quer proibir, o que fere o princípio da legalidade. O texto, em sua avaliação, é tão generalista que, aprovado, pode se transformar numa “lei penal em branco”.