Capa – Internet: novas tecnologias facilitam o acesso.

Para ter acesso à internet, ninguém mais depende apenas da rede de telefonia ou de TV por assinatura. Tecnologias de acesso sem fio ou pela rede elétrica podem baratear a conexão, ou viabilizá-la onde a rede telefônica não chega. Municípios e governos começam a aderir a essas soluções.


Hoje, para ter acesso à internet, ninguém
depende mais só da rede das operadoras de telefonia ou de TV por
assinatura. Tecnologias de acesso sem fio ou pela rede elétrica podem
baratear o acesso, ou fazer com que seja oferecido onde a rede
telefônica não chega ou não tem banda larga. Municípios e governos
começam a usar essas tecnologias para oferecer internet aos cidadãos. E
a pressão popular ajuda a colocar esses projetos em marcha.
  Patrícia Cornils

Teutônia é uma cidade de 25 mil
habitantes no Rio Grande do Sul, onde qualquer um dos cerca de 9 mil
moradores associados à Certel – Cooperativa Regional de Eletrificação –
pode contratar, da própria cooperativa, um acesso de banda larga por R$
69,00 mensais. O serviço é oferecido por uma rede Wi-Fi e começou a ser
vendido pela Certel em 2001, quase três anos antes de a Brasil Telecom
oferecer ADSL (serviço em banda larga pela rede telefônica) na cidade.
Até então, era necessário fazer chamadas interurbanas para navegar. Em
Piraí, no alto da Serra das Araras, Rio de Janeiro, a Prefeitura é o
provedor de internet banda larga, por meio de uma rede própria que
interliga 25 escolas (15 delas com laboratórios de informática),
Associações de Pais e Amigos de Excepcionais, postos de saúde,
repartições públicas, seis telecentros e 11 quiosques para navegação
gratuita. De formas distintas, as duas cidades resolveram localmente a
questão do acesso em banda larga usando tecnologia sem fio, cada vez
mais barata. No caso de Piraí, aconteceu algo mais importante: em vez
de escolher em qual escola, telecentro ou posto de saúde colocar uma
conexão ponto-a-ponto, a Prefeitura criou uma rede pública à qual a
cidade tem acesso universal.


As organizações não-governamentais, prefeituras e governos que criaram
projetos de tecnologia para inclusão social ainda pensam nas conexões
internet como uma questão ponto-a-ponto. Cada vez mais, no entanto,
tecnologias como Wi-Fi, Wi-Max e mesmo a conexão pela rede elétrica
(PLC, sigla em inglês para power line communication, ou comunicação
pela rede elétrica) reduzem o custo de implantação de redes de
comunicação, principalmente não há rede telefônica disponível ou com
qualidade técnica para oferecer um acesso em banda larga. Essas
novidades tornam acessível a outras entidades – e às próprias
operadoras de telecomunicações – implantar suas redes. E favorecem o
surgimento de iniciativas do poder local, como a da prefeitura de Sud
Menucci, em São Paulo (saiba mais) e da prefeitura de
Piraí. Ou de empresas como a Eletropaulo, que, em convênio com a
Companhia de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, implantou uma rede
PLC em cinco condomínios populares do bairro da Moóca, na capital
paulistana. Nesse caso, a inclusão digital veio como conseqüência do
baixo custo da tecnologia. Assim: a adoção do PLC permitiu uma redução
de 34% no custo de implantação dos sistemas prediais (redes de água,
luz e gás), e de 8% no custo total da obra. Como, pela mesma linha
elétrica, pode-se enviar sinais de internet, a tecnologia pode ser
usada para conectar os moradores dos prédios, que ganham entre um e
cinco salários mínimos, à rede.

Baixa oferta

Ainda é muito pequena a oferta de conexões em banda larga no Brasil:
são 2,8 milhões de acessos do serviço em banda larga pela rede
telefônica (ADSL), equivalente a menos de 10% dos 39 milhões de
telefones fixos em serviço, e mais 452 mil pelas redes de TV por
assinatura (por cabo, satélite e rádio). O ADSL (com as marcas Speedy,
Velox e BR Turbo) só existe em parte dos grandes centros. Sua expansão
não é tão rápida quanto gostariam os usuários de conexões discadas
porque as concessionárias – Brasil Telecom, Telefônica e Telemar – não
se dispõem a investir na melhoria da rede para oferecer acesso em banda
larga, em bairros e localidades onde a demanda é pequena para
justificar o dinheiro aplicado.

“O negócio de telecomunicações, em sua plenitude, está somente em 238
cidades brasileiras. Esse é o mercado”, afirmou Rogério Santanna,
secretário de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI) do Ministério
do Planejamento, na 4ª Oficina de Inclusão Digital, realizada em
outubro no Rio de Janeiro. São municípios com alta concentração urbana
– o que significa mais clientes potenciais para a mesma rede -, onde
há 5,7 milhões de domicílios das classes A e B, com 20,7 milhões de
habitantes, de acordo com um estudo da Associação Brasileira de
Telecomunicações (Telebrasil). Em meados de 2005, o ADSL havia chegado
a pouco mais da metade desses domicílios. Mesmo nessas cidades, no
entanto, há áreas de grande concentração urbana sem poder aquisitivo.
São 36,4 milhões de domicílios, habitados por 127,8 milhões de
brasileiros das classes C, D e E. Em 64% dessas casas há linhas
telefônicas, mas nem sinal de banda larga.

Corredor digital

É o caso da favela de Acari, no Rio de Janeiro, onde a Central Única
das Favelas (Cufa) mantém um telecentro. Na comunidade, onde vivem 5
mil a 6 mil pessoas, a Cufa paga R$ 1,2 mil por mês para ligar o
telecentro ao mundo, por uma conexão via satélite da Star One. Cerca de
mil pessoas são usuárias do telecentro, de acordo com Flávia Caetano,
da Cufa, e esse público é o motivo pelo qual a entidade  ainda não
deixou de pagar a conexão: R$ 1,2 mil por mês é muito dinheiro e a
possibilidade de desligar a antena é seriamente considerada sempre que
a conta chega. A base da Cufa em Acari, diz Flávia, está a cinco metros
de um prédio com conexão ADSL, mas “o serviço não chega à Cufa porque,
de acordo com a Telemar, a distância entre nós e a central telefônica
não garante um bom sinal”. E a Telemar não se dispõe a investir na
rede, colocando, por exemplo, um repetidor entre a central e o ponto da
Cufa porque entende que o investimento, para se justificar, precisaria
ter vários outros clientes de banda larga além da Cufa.

Santanna, da SLTI, acredita que o Estado deve incentivar o uso de novas
tecnologias. “Precisamos experimentar coisas novas, de forma a
encontrar soluções mais baratas e adequadas a um país pobre”, explica.
“Combinar diferentes recursos, como redes ociosas de fibras ópticas, de
forma a aumentar o conjunto de iniciativas e fazer coisas que não têm
visibilidade comercial ganharem visibilidade social”, afirma. Para que
realmente ganhem visibilidade social, essas iniciativas têm que ser
discutidas com a sociedade. No caso de Piraí, o Conselho da Cidade
participou da elaboração do plano diretor digital. O mesmo acontece em
Rio das Flores (RJ), onde o conselho de governança local decidiu, por
exemplo, em que lugares a rede deverá ser implantada primeiro.

O governo do Estado, em cooperação com a Proderj, a Faperj, os
coordenadores do Piraí Digital e a Associação de Prefeitos do Rio de
Janeiro (Apremerj), vai reproduzir a iniciativa de Piraí em outras
cidades do Rio de Janeiro, com o projeto Município Digital. A primeira
a participar é Rio das Flores, com 8 mil habitantes, na região do Médio
Paraíba, a mesma de Piraí. A meta do programa é iluminar, com
tecnologia Wi-Fi e Wi-Max, vários municípios e criar um corredor
digital no estado do Rio, passando por Parati, Angra dos Reis,
Mangaratiba, Rio Claro, Piraí, Barra do Piraí, Rio das Flores. Cada
projeto deve se integrar às particularidades do município. Em
Conservatória, há uma iniciativa para transmitir as tradicionais
serenatas da cidade, por webcast. As redes comunitárias vão se
interconectar com Infovia.RJ da Proderj, que já passa por 70
municípios. Cidades com menos de 50 mil habitantes são o foco do
Município Digital.

Os fornecedores se mexem

No que diz respeito à infra-estrutura de tecnologia, os fornecedores já
se movimentam para oferecer seus produtos às comunidades. É o caso da
Intel, que realizou projetos-piloto com a tecnologia Wi-Max em
Brasília, Ouro Preto, Magaratiba (dentro do projeto Município Digital)
e se prepara para implantar, em convênio com a Prodam, conexões Wi-Max
em órgãos da Prefeitura de São Paulo que têm dificuldade para receber
acesso tradicional, como as Unidades Básicas de Saúde que a Prefeitura
tem como meta informatizar até o final do ano. A Nortel discute com
oito municípios de Minas Gerais e São Paulo, todos com mais de 150 mil
habitantes, projetos com tecnologia Mesh. Em simulações feitas pela
Nortel, pode-se oferecer um acesso em banda larga (de 1 Mbps) por R$
10,00 mensais, se a rede tiver 4 mil usuários. “Estou animado porque,
com esse tipo de tecnologia, enxergo um caminho para as comunidades
terem serviços em banda larga. Os projetos com tecnologias mais
tradicionais não fechavam a conta”, diz Newton Scartezini, diretor de
relações institucionais da Nortel.

A rede de Piraí foi implantada com cerca de R$ 600 mil e o de Rio das
Flores está orçada em cerca de R$ 350 mil, de acordo com Tereza Porto,
presidente da Proderj. Ela explica que a meta do Município Digital é
implantar uma infra-estrutura de tecnologia da informação para romper o
“isolamento digital” e reverter o quadro de estagnação social e
econômica. Para isso, não basta a implantação de infra-estrutura. É
essa a razão pela qual os convênios com os municípios incluem, além de
assessoria técnica para a implantação das redes e link com a
Infovia.RJ, a colaboração para o desenvolvimento de sistemas integrados
de serviços de educação, saúde, economia solidária e telecentros como
agências de desenvolvimento comunitário.

Em Piraí, a elaboração de um Plano Diretor de Tecnologia começou em
1997 e se tornou necessária depois que a Light e a fábrica de papéis
Pirahy realizaram demissões e fecharam 1,5 mil postos de trabalho, em
uma cidade de 23 mil habitantes. A digitalização foi integrada a outras
iniciativas, nas áreas administrativa e de serviços públicos. Além
disso, a prefeitura colocou em prática um plano para criar um distrito
industrial e atrair novas empresas à cidade. Como era um projeto de
desenvolvimento local, não exclusivamente de implantação de uma rede, a
Prefeitura de Piraí conseguiu recursos de várias fontes: enquadrou o
projeto no Programa de Modernização da Administração Tributária (PMAT),
do BNDES, porque os recursos foram usados para integrar as secretarias
em rede. Usou também recursos do orçamento da Educação, porque o
programa conectou as escolas e capacitou professores.


A Certel, de Teutônia, não teve dificuldade para se tornar um provedor
de acesso. Bastou pedir uma licença de Serviço de Comunicações
Multimídia (SCM) para a Agência Nacional de Telecomunicações. No caso
de Piraí, o processo foi mais complicado, porque não existia, na
legislação de telecomunicações, a idéia de que uma Prefeitura pudesse
pedir uma licença. Quem solicita uma licença de SCM deve apresentar,
por exemplo, inscrição no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura
(CREA), inscrição municipal e comprovação de que não tem dívida com a
Prefeitura. Além disso teve que criar a figura jurídica do “direito
real de concessão de uso oneroso” da rede para poder cobrar uma tarifa
pública de acesso a internet. Aos clientes domésticos de banda larga, a
prefeitura cobra de R$ 35,00 a R$ 60,00 por mês. Esses recursos vão
para um fundo de tecnologia do município e são usados para a manutenção
dos telecentros e laboratórios nas escolas. Outra boa discussão gerada
pelo caso de Piraí, explica Franklin Coelho, coordenador do projeto,
diz respeito à abrangência das áreas de cobertuta definidas pela Anatel
para licitar novas freqüências. No caso do Serviço de Comunicação
Digital (SCD), diz ele, as áreas de cobertura previstas  eram tão
amplas que as prefeituras não conseguiriam “comprá-las”.

Para cidades pequenas

A importância da tecnologia PLC, no caso da inclusão, é que ela pode
fazer surgir um novo prestador de serviço de acesso: a companhia
elétrica. A cobertura das redes de distribuição dessas empresas é maior
do que a das redes telefônicas e, de acordo com Pedro Jatobá,
presidente da Aptel (Associação de Empresas Proprietárias de
Infra-estrutura e Sistemas Privados de Telecomunicações), o PLC pode
ser uma forma de as distribuidoras de energia gerarem mais receita com
sua rede. O foco dos projetos em desenvolvimento pela Aptel são
municípios de até 50 mil habitantes, que geralmente possuem um pequeno
núcleo urbano cercado de manchas de ocupação rural. “São cerca de 2 mil
municípios brasileiros, que concentram uma significativa parcela da
população e raramente possuem uma oferta de serviços de
telecomunicações”, constata ele.

Nessas localidades, onde está presente a distribuidora de energia
elétrica, a oferta de diversos serviços sobre a mesma infra-estrutura
(energia, medição, internet, telefonia) pode reduzir o custo de cada um

deles. Hoje, o custo de implantação de uma rede PLC é calculado em R$
300,00 por acesso. A diferença entre esse modelo e o das Prefeituras é
que, aqui, trata-se de uma empresa que, para valorizar sua
infra-estrutura, pretende oferecer um serviço a custo menor e maior
disponibilidade do que as concessionárias de telecomunicações. Esse
modelo ainda está em elaboração, mas Jatobá acredita que o PLC será um
bom instrumento para a inclusão nos locais e aplicações onde ele possa
significar uma redução real dos custos de acesso.

www.piraidigital.com.br

www.certel.com.br


www.aptel.com.br
– Notícias e estudos sobre PLC

http://www.intel.com.br
– Na sala de imprensa, notícias sobre os testes em Mangaratiba, Ouro Preto e na Prodam, em São Paulo.