ASL e Casa de Cinema de Porto Alegre vão discutir as relações entre comunicação e cultura digital contemporânea.
Sérgio Amadeu da Silveira
Para desvendar a relação entre os códigos, protocolos e padrões que
intermediam a comunicação e a cultura digital contemporânea e os
processos de expansão e controle das sociabilidades, a Associação de
Software Livre e a Casa de Cinema de Porto Alegre apresentaram a
proposta de um ciclo de debates chamado “Além das redes de colaboração:
diversidade cultural e tecnologias do poder”. A idéia foi vencedora do
Edital Cultura e Pensamento 2007, do Ministério da Cultura.
Os debates presenciais acontecerão durante quatro noites, em Porto
Alegre (RS), e em outras quatro, em Natal (RN). Um blog levantará
questões e discussões prévias às mesas. Todas as exposições serão
televisonadas pela internet. Os dois eventos navegarão da rede para os
auditórios e vice-versa, serão gravados e editados em vídeos de vários
tamanhos. Uma publicação também será lançada e colocada na rede e nas
livrarias.
A cultura digital ou cibercultura tem na tecnologia o seu corpo, e, nos
códigos, a sua linguagem básica. Por isso, a relação entre tecnologia e
sociedade permeará todo o debate. A questão tecnológica será analisada
no seu contexto histórico e cultural, uma vez que a produção técnica
nasce nos contextos das disputas sociais e econômicas. “Os embates
contemporâneos inicialmente apontados trazem para o primeiro plano as
dúvidas sobre as possibilidades de emancipação em um cenário de
enrijecimento da propriedade sobre as idéias, de controle biopolítico
das formas básicas de viver e nascer, de cerceamento da diversidade
cultural pelo império das formas mercantis sobre a emergente e, ao
mesmo tempo tradicional, economia da dádiva. Redes ponto-a-ponto (P2P)
não poderão existir, se o compartilhamento for criminalizado. Sem estas
redes, não poderemos produzir códigos e softwares de
código-fonte aberto com a velocidade necessária e exigida em uma
sociedade desterritorializada. O cinema digital não poderá se
interiorizar (abrir o número de salas no interior), se não puderem
trabalhar com os protocolos de compartilhamento por arquivos indexados
(por exemplo, BitTorrent). Os ativistas da metarreciclagem serão
impedidos de criar webTVs, novas soluções de voz sobre IP serão
cerceadas, se continuarem técnicas de ‘traffic shaping’
incólumes de legislação, nuvens de conexão abertas serão bloqueadas, se
o novo protocolo básico da internet proibir o anonimato.”
Esses temas e outros de grande complexidade serão analisados por
pesquisadores, artistas e ativistas de variadas áreas. Sem dúvida, a
estruturação do ciclo de debates teve a influência decisiva das
abordagens de pensadores como Foucault, Deleuze, Antonio Negri, Andre
Gorz. Dois conceitos são importantes para entender o ciclo: a
biopolítica e a sociedade de controle.
Biopolítica é um termo muito importante na obra de Foucault. Para o
pensador francês, já falecido, o importante não é analisar o poder em
si, mas as relações de poder. É preciso desvendar o jogo de forças que
definem as potências, a ação e a conduta dos indivíduos. No texto
“Vigiar e Punir”, Foucault esclarece que “o indivíduo é sem dúvida o
átomo fictício duma representação ‘ideológica’ da sociedade; mas ele é
também uma realidade fabricada por essa tecnologia específica de poder
a que chamamos a ‘disciplina’. É preciso deixar de descrever os efeitos
de poder em termos negativos: ele ‘exclui’, ‘reprime’, ‘recalca’,
‘censura’, ‘abstrai’, ‘mascara’, ‘oculta’. De fato, o poder produz;
produz do real; produz domínios de objetos e de rituais de verdade. O
indivíduo e o conhecimento que dele podemos tomar derivam dessa
produção”.
Para Foucault, esse poder disciplinar, do século XVIII ao início do
século XX, estava baseado em instrumentos como a inspeção, a sanção, a
hierarquia e a norma, que se materializam nos códigos de postura, no
código médico dos sintomas, nos códigos militares, nas normas
educacionais. O poder controla toda a vida do indivíduo que passou a
ser submetida a uma biopolítica. Deleuze, filósofo francês, considerava
que as sociedades disciplinares foram sendo substituídas pela sociedade
do controle. Os confinamentos foram transformados por mecanismos de
controle que superam os mais duros confinamentos. Seguindo esta
reflexão, a sociedade da informação e a cibercultura é organizada por
intermediários da comunicação, lógicos e físicos, software e hardware,
fluxos de bits e redes de sinais eletromagnéticos. O ciclo Além das
Redes foi organizado em torno da questão: onde estão as possibilidades
de liberdade e, simultaneamente, as formas do controle em nosso
cotidiano informacional?
A programação do Ciclo de Debates
PORTO ALEGRE
Mesa 1: 15/10 | Segunda-Feira
18h – Abertura
– Sérgio Amadeu (Casper Líbero)
– Nelson Pretto (UFBA)
– Giba Assis Brasil (Casa de Cinema de Porto Alegre)
– Luciana Tomasi (Casa de Cinema de Porto Alegre)
– Sady Jacques (ASL)
19h às 22h: 1º Debate
“Politizando as Tecnologias: como as redes reconfiguram a sociedade, a educação e a cultura?”
– Imre Simon
– Nelson Pretto
– Léa Fagundes
– Giba Assis Brasil
Mediador: Sady Jacques (ASL)
Mesa 2: 16/10 | Terça-Feira
18h: Atividade cultural (Teatro)
19h às 22h: 2º Debate – “Cultura e Natureza: o que o software tem a ver com os transgênicos?”
– Mário Teza
– Pedro Rezende
– Marijane Vieira Lisboa
– Abrahm Rubio
Mediador: Carlos Machado Oliveira (Serpro/UFRGS)
Mesa 3: 17/10 | Quarta-Feira
18h: Atividade cultural (Música)
19h às 22h: 3º Debate – “Convergências: o que códigos têm a ver com música, filmes, jogos e realidades alternativas?”
– Pedro Paranaguá
– Ézyo Lamarca
– BNegão (músico)
Mediador: Fabricio Solanga (ASL)
Mesa 4: 18/10 | Quinta-Feira
18h: Atividade cultural (Cinema)
19h às 22h: 4º Debate – “Esfera pública conectada: o que as telecomunicações e a TV Digital tem a ver com o comum?”
– Sérgio Amadeu
– Marcelo Tas
– Carlos Gerbase
– Luiz Fernando Soares
– Guido Lemos
Mediador: Pablo Lorenzzone (ASL)
NATAL
Mesa 1: 07/11 | Quarta-Feira
18h: Abertura
– Sérgio Amadeu (Casper Líbero)
– Nelson Pretto (UFBA)
– Giba Assis Brasil (Casa de Cinema de Porto Alegre)
– Luciana Tomasi (Casa de Cinema de Porto Alegre)
– Sady Jacques (ASL)
– Gustavo Ribeiro (Projeto Software Livre/RN)
19h às 22h: 1º Debate – “O que a educação tem a ver com a autonomia política e tecnológica?”
– Eduardo Janser
– Imre Simon
– Nelson Pretto
– João Brant
Mediador: Adorilson Bezerra (Cefet-RN)
Mesa 2: 08/11 | Quinta-Feira
18h: Atividade cultural (Teatro)
19h às 22h: 2º Debate – “O que o anonimato na rede tem a ver com a democracia e com a biopolítica?”
– Lena Zúniga
– Mário Teza
– Pedro Rezende
– Marijane Lisboa
– Abraham Rubio
Mediador: Leonardo Lopes (UFRN)
Mesa 3: 09/11 – Sexta-Feira
18h: Atividade cultural (Música)
19h às 22h: 3º Debate – “O que a tecno-arte e a cibercultura tem a ver com a estética da multidão?”
– Giba Assis Brasil
– Pedro Paranaguá
– Ézyo Lamarca
– BNegão
Mediador: Gustavo Ribeiro (Projeto Software Livre/RN)
Mesa 4: 10/11 – Sábado
18h: Atividade cultural (Cinema)
19h ás 22h: 4º Debate – “O que a convergência digital e a TV pública tem a ver com a diversidade cultural?”
– Guido Lemos
– Sérgio Amadeu
– Marcelo Tas
– Carlos Gerbase
Mediador: Paulo Meirelles (UFRGS)
CURADORES DO CICLO
A proposta do ciclo tem a curadoria de Sérgio Amadeu da Silveira, professor da pósgraduação da Cásper Líbero, e a co-curadoria de Nelson Pretto, diretor da Faculdade de Educação da UFBA, e de Giba Assis Brasil, roteirista, professor do curso de Realização Audiovisual da Unisinos.
www.rn.softwarelivre.org/alemdasredes/
— Para acompanhar o ciclo presencial ou via web, e para participipar dos debates, acesso o blog do ciclo.