Na Conferência da Sociedade da
Informação, em Túnis, foi criado o Fórum de Governança na Internet. O
evento trouxe avanços também para a implantação de uma plano integrado
para a América Latina.
Cada participante da Conferência Mundial da Sociedade da Informação
(CMSI), realizada em Túnis (capital da Tunísia), entre os dias 16 e 18
de novembro, avaliou os resultados do evento de acordo com os seus
interesses. Os Estados Unidos se sentem vitoriosos porque conseguiram
manter a efetiva administração da internet, por meio da atribuição de
domínios e registros, que é feita pela Internet Corporation for
Assigned Names and Numbers – Icann, organização criada em 1998, na
Califórnia, com fortes relações com o Departamento de Estado do governo
norte-americano. E os países em desenvolvimento, onde se destacou a
atuação do Brasil, comemoram, pois conseguiram criar o Fórum de
Governança na Internet, com o apoio decisivo dos países da União
Européia.
Foi um movimento importante, mas ainda há muito terreno a conquistar,
pondera André Barbosa, assessor especial da Casa Civil, integrante da
delegação brasileira, liderada pelo ministro da Cultura, Gilberto Gil.
Para Rogério Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da
Informação do Ministério do Planejamento, o resultado foi positivo.
“Avançamos em um novo modelo de governança na internet, multilateral,
transparente e democrático”, afirma ele. Porém, principalmente entre os
representantes do Terceiro Setor que participaram da Cúpula como
observadores, há controvérsias. Paulo Lima, diretor-executivo da Rede
de Informações para o Terceiro Setor (Rits), avalia que a CMSI não foi
conclusiva, não produziu uma agenda, e apenas adiou os debates.
Carlos Afonso, diretor de planejamento e estratégias da mesma entidade
e integrante do Comitê Gestor da Internet, tem opinião diversa. A seu
ver, há um pouco de confusão na interpretação dos resultados da Cúpula,
em relação à governança da internet. No conjunto, contudo, a CMSI teria
levado a várias conquistas. “Temas como a governança mundial da
internet não eram sequer conhecidos da grande imprensa ou mesmo de
especialistas. A CMSI tornou o assunto não só conhecido, mas discutido
de forma pluralista”, destaca. Ele acrescenta que, depois de Túnis,
reconhece-se a necessidade de mecanismos globais de governança que não
estejam sob o domínio de qualquer governo em particular, e sejam
multilaterais, pluralistas, democráticos e transparentes.
Os representantes do governo brasileiro também consideram que a
primeira reunião do Fórum, marcada para 2006, em Atenas, já sinaliza
para a possibilidade de futuras mudanças na gestão da internet. E
apontam, ainda, como resultado concreto, a decisão sobre a destinação
dos domínios .país (.br, por exemplo), que passará a ser feita por cada
nação, e não mais pela Icann.
De seu lado, em nota oficial, o Ministério das Relações Exteriores
(Itamaraty) afirma que a delegação brasileira contribuiu para a redação
dos dois documentos na Cúpula. Tanto o Compromisso de Túnis, quanto a
Agenda de Túnis para a Sociedade da Informação reiteram que as
tecnologias da informação devem ser um instrumento para o
desenvolvimento.
Entre os principais temas dos documentos estão a definição de programas
de computador com o código aberto como instrumento de inclusão digital,
e a instituição do Fórum da Governança da Internet. Esse, segundo o
Itamaraty, foi o tema mais difícil das negociações.
O discurso do ministro Gil em Túnis, no dia 17 de novembro, deixou
claríssima a posição do Brasil que, por princípio, apóia todos os
esforços que contribuam para o ideal de justiça, inclusão e
solidariedade. “País em desenvolvimento de dimensões continentais, com
importante contingente de excluídos digitais, o Brasil necessita buscar
produtos inovadores e valorizar soluções tecnológicas baseadas em
modelos alternativos de licenciamento e em plataformas abertas. O
Brasil possui, hoje, cerca de 30 milhões de pessoas com acesso ao
computador; o que significa, em uma população de 170 milhões, um longo
caminho a percorrer. O software livre e aberto é econômico, seguro, e
permite o desenvolvimento colaborativo, o compartilhamento do
conhecimento e a autonomia tecnológica. É alternativa essencial para
países em desenvolvimento que, como o Brasil, lutam com escassez de
recursos para a políticas públicas prioritárias de inclusão digital”,
afirmou Gilberto Gil.
O ministro acrescentou que, ao consagrar, quer nos documentos de
Genebra, quer nos de Túnis, o software livre e aberto, a Cúpula
reconhece a sua importância para a redução do hiato digital entre
os países. Quanto à gestão da internet, Gil ponderou que, “por
motivos históricos, a infra-estrutura e os sistemas centrais ao
funcionamento da internet não são geridos em consonância com os
princípios de multilateralismo, transparência e democracia. A internet
tem, hoje, capilaridade mundial; sua gestão, entretanto, ainda está
longe de ser transparente e inclusiva”. Mas a Cúpula contribuiu para
reavaliar tal situação, ao incorporar na agenda internacional o tema da
governança. “O Brasil tem satisfação de haver atuado ativamente para
esse resultado”, observou.
Integração latino-americana
As divergências sobre os resultados da CMSI desaparecem quando a
questão é a integração da América Latina. Todos concordam que o
encontro de Túnis permitiu às delegações da América Latina e do Caribe
avançar nas negociações para a implementação do eLAC 2007, um plano
regional para a Sociedade da Informação. Durante os três dias da
Cúpula, o Grupo de Países da América Latina e Caribe – Grulac se reuniu
formalmente e decidiu sobre as linhas gerais de um mecanismo regional
que será coordenado por representantes dos governos do Equador, Brasil,
El Salvador e um país do Caribe. A iniciativa prevê a colaboração com
as entidades civis da região.
“O trabalho do Grulac foi muito positivo”, diz Lima, da Rits. Barbosa,
da Casa Civil, concorda, afirmando que, em 2006, os países da região
vão continuar trabalhando no plano de ação aprovado na Conferência do
Rio de Janeiro deste ano e desenvolvido pela Cepal – Comissão Econômica
para a América Latina, com recursos da ONU. A agenda do Grulac inclui
medidas de fomento à inclusão digital, de troca de conhecimento,
desenvolvimento da indústria criativa, incentivo ao software livre, e
avaliação dos padrões de TV digital na ótica da universalização do
serviço.