Pesquisa da Abes com compradores
do Computador para Todos conclui que, em uma mostra de 251 máquinas
(duas pessoas entrevistadas em cada domicílio), cerca de 30% mantinham
as distribuições Linux, enquanto o restante havia sido equipada, pelos
consumidores, com Windows pirata. Verônica Couto
O programa federal Computador para Todos (CPT), que assegura crédito
subsidiado na compra de computadores, além de ter alcançado seu
objetivo prioritário — a inclusão digital de consumidores de baixa
renda —, também se revelou uma arma de combate à pirataria. Pesquisa da
Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), feita em junho,
e divulgada em novembro, constatou que, em 251 equipamentos adquiridos
no programa, que foram a mostra utilizada, 27% continuavam com as
distribuições Linux, ou o sistema operacional aberto, e seus 26
aplicativos. Ao contrário dos 73% demais computadores, em que os
softwares livres foram substituídos por cópias piratas do Windows, da
Microsoft. A origem irregular dos programas proprietários adquiridos é
evidente nos valores pagos por eles, em média R$ 88,05, bem abaixo do
preço de uma caixa do Windows XP Home Edition, por exemplo, que sai por
R$ 469,00 no site Submarino. Ainda de acordo com a pesquisa da Abes, na
classe C, a renda mensal não comprometida é da ordem de R$ 91,03; e de
R$ 13,18, nas classes D/E.
A margem estreita para gastos explica por que 99% dos entrevistados
financiaram a compra, sendo que 80% desses em 24 vezes. As parcelas
tiveram valor médio de R$ 82,57, para equipamentos que custaram, em
média, R$ 1.670,00 (em comparação a R$ 1.390,00, previstos no
programa). Também é consistente com o fato de a maioria, ou 56,4% das
pessoas da mostra, ser da classe C (renda entre R$ 900,00 e R$ 1,2
mil), alvo efetivo da iniciativa. Na classe D/E (R$ 300,00 a R$
600,00), 13,7% compraram o equipamento, e 29,9% na classe A/B (renda
média de R$ 2.442,50). A pesquisa foi contratada pela Abes ao Instituto
Ipsos, que fez as entrevistas por telefone, entre os dias 1 a 12 de
junho, a partir de listagem sugerida de 4 mil compradores de Computador
para Todos. Tem uma margem de erro de 4,3%. Foram ouvidas 502 pessoas,
duas por domicílio — metade dos questionários aplicada a quem comprou
e, metade aos “principais usuários”. Todos de São Paulo (72%), ou do
Paraná (28%), onde fica a sede da Positivo, uma das fabricantes que
lideram as vendas de Computador para Todos.
Apesar de um dos propósitos da sondagem ter sido verificar a ocorrência
de substituição de software, o presidente da Abes, Jorge Sukarie,
garante que não pleiteia ao governo alterações nas regras do programa
para permitir sistemas proprietários na configuração dos equipamentos.
“A posição que a Abes sempre defendeu é a de neutralidade, ou seja,
deixar que o usuário possa escolher o sistema que melhor atenda às suas
necessidades. Nunca solicitou nenhuma modificação nas regras do
programa”, afirmou ele ÀRede, por e-mail. Também diz que “de forma
nenhuma” o Computador para Todos estimularia pirataria, embora o
relatório final do Ipsos sugira que a tendência ao uso de software
pirata, que teria sido “constatada no estudo”, deva ser “discutida
junto as partes de interesse: setor público, iniciativa privada e
sociedade civil”. Na opinião de Sukarie, a solução proprietária é
sustentável, mesmo na baixa renda: “Existem opções de software
proprietário sem custo ou custo baixo”. Argumenta, ainda, que sistemas
abertos “não são obrigatoriamente gratuitos e podem incorrer em custos
de atualização, treinamento, etc.”
Suporte gratuito
De acordo com o levantamento Abes/Ipsos, a substituição não se deu por
insatisfação com as distribuições abertas (segundo o instituto de
pesquisa, essa pergunta não chegou a ser feita), mas por meio de amigos
e parentes (35%) ou do próprio técnico da loja que vendeu a máquina
(18%). A pesquisa registra, ainda, a baixa divulgação da iniciativa, o
que, na avaliação de Luiz Cláudio Mesquita, assessor da diretoria do
Serpro e integrante do grupo gestor que coordena o CPT, seria
importante para fortalecer a adesão que já foi verificada aos programas
livres. “O Computador para Todos oferece suporte operacional ao
software, de forma obrigatória e gratuita. Se o consumidor tiver
qualquer dúvida na hora de usar editor de texto, planilha, etc., o
suporte é obrigado a ensiná-lo a usar o produto. Em nenhuma outra
compra de computador existe isso. Há, apenas, suporte técnico para
casos de falhas de equipamento. Mas quem sabe disso?”, pergunta ele.
Luiz Cláudio também acredita que a mostra da pesquisa não é
representativa. “Ela mediu apenas Paraná e São Paulo, por telefone, e
foi feita ainda no primeiro semestre”, diz. O presidente da Abes
informou ÀRede que não pode divulgar as razões da escolha desses dois
estados para a formação da mostra pesquisada. O executivo do Serpro
está convencido de que o Computador para Todos combate a pirataria. “O
software livre não exige pagamento de licença, e a pirataria existe
contra o pagamento de alguma coisa. Se perguntarem aos usuários que
compram computadores sem licença, vão perceber que também há grande
ilegalidade”.
De fato, o presidente da Abes informa que a pirataria de software no
Brasil, em 2005, segundo estudo da IDC, foi de 64%. No primeiro
semestre de 2005, foram 2,5 milhões de computadores vendidos no Brasil,
de acordo com outro instituto de pesquisa, a IT Data; e 3,6 milhões no
primeiro semestre de 2006, equivalente a um crescimento de 43%. Nesse
período, os negócios com os PCs clones (montados ou vendidos fora da
legalidade), praticamente a totalidade com Windows pirata, caíram 61% —
de 73% para uma média de 48% do mercado total (50,2% no primeiro
trimestre; 45,6% no segundo). Nos primeiro nove meses deste ano, as
vendas de computadores no país somaram 5,5 milhões, sendo 380 mil
unidades do Computador para Todos (7,1%). O índice de PC clones no
trimestre julho/setembro foi de 46,7%. O crescimento de 1,2 pontos, em
relação ao trimestre anterior, pode ser atribuído à falta de
componentes no mercado: processadores Celeron, memórias e telas LCD. “O
mercado não estava preparado para a demanda”, explica Ivair Rodrigues,
diretor da IT Data, que fez a pesquisa para a Associação Brasileira da
Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Segundo ele, o programa
Computador para Todos, ao lado do dólar baixo e dos incentivos fiscais
da chamada Lei do Bem (11.196), teria contribuído para o recuo da
informalidade.
A pesquisa da Abes/Ipsos, que pretendia, entre outros itens, avaliar se
o programa Computador para Todos estava atingindo seu objetivo princial
— “em aumentar a posse de computadores entre as pessoas de classe C” —
, conclui que sim, está. Para 86% dos entrevistados, foi o primeiro
computador da casa, e a maioria na classe C. Para 81%, a compra foi
feita devido à facilidade de pagamento, e para 55%, devido ao preço.
Para 6%, o fato de o sistema ser Linux foi o item que mais pesou na
decisão de compra.
O governo, por meio do Ministério da Ciência e Tecnologia, vai
consultar representantes da indústria sobre a possibilidade de
fabricação de notebooks com valor máximo de R$ 1,8 mil. Se isso for
possível, a intenção é estender aos micros portáteis até esse preço os
créditos subsidiados do programa Computador para Todos. Além disso, o
governo pretende atualizar a configuração atual definida para o
programa Computador para Todos. Mas estão descartadas alterações no que
se refere a software — especialmente à obrigação da máquina vir com
programas de código livre instalados. “Não há hipótese de se mexer
nisso”, afirma Luiz Cláudio Mesquista, assessor da diretoria do Serpro.
A Associação Brasileira das Empresas de Software é uma entidade de
classe, que representa as empresas distribuidoras e desenvolvedoras de
programas de computador. Entre elas, grandes fabricantes
internacionais, como Microsoft, Corel, SAP, etc. A Associação
Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) representa a
indústria de eletrônicos, entre os quais microcomputadores e outros
equipamentos e componentes. Foi quem contratou a pesquisa da IT Data.