Pesquisadores da Unesp-Rio Claro
aperfeiçoaram ferramentas do tradicional método e criam novo produto,
que pode trazer vantagens na alfabetização de crianças, diz educadora. Heitor Augusto
Em 1827, o francês Louis Braille, cego desde os três anos, aprimorou
códigos desenvolvidos por um capitão de artilharia e os publicou,
criando o sistema de leitura para deficientes visuais que se tornaria
padrão de alfatetização. No Método Braille, cada caracter é constituído
por até seis saliências que o cego detecta através do tato.
Para a escrita manual, são utilizados três instrumentos: prende-se a
folha em uma prancheta e os espaços dos furos feitos por uma agulha são
definidos pela reglete – uma espécie de régua com buracos pelos quais o
papel é demarcado, formando as letras. O problema está na ordem da
escrita: as marcações têm de ser feitas no verso da folha e da esquerda
para direita, para que o texto seja lido na ordem tradicional, da
esquerda para direita.
O uso da reglete é o que muda no sistema da Unesp
Esse esquema pode ser profundamente alterado com um projeto
desenvolvido na Unesp de Rio Claro, interior de São Paulo. A TECE
(Tecnologia e Ciência Educacional, gerada na Incubadora de Base
Tecnológica de Rio Claro) criou o protótipo de uma caneta e uma reglete
que subverteriam as ferramentas tradicionais. Com o novo projeto, a
reglete não teria espaços, mas relevos. A agulha seria substituída por
uma punção semelhante a uma caneta com ponta vazada. Assim, a folha
seria posicionada por cima da reglete e os relevos seriam demarcados
com a pressão exercida pela punção sobre as “bolinhas” da régua. A
mudança? Inversão no processo de escrita, que não mais seria feita no
verso da folha. As frases se construiriam na mesma ordem que a de
leitura – da esquerda para a direita.
A educadora Marly Milanese, deficiente visual que alfabetiza, em
braille, pessoas que perderam a visão na idade adulta, afirma que quem
está acostumado com a reglete tradicional vai conseguir se adaptar. “É
possível que se confunda um pouco, mas só no início”. Ainda mais porque
existem as máquinas de escrever adaptadas, nas quais a ordem de escrita
e leitura é a mesma para o cego. “Com o novo método, o cego já pensa na
leitura, faz a letra na posição que vai ler. A maior vantagem vai ser
para quem está se iniciando na alfabetização”, completa Marly.
O protótipo feito pela TECE é fruto das discussões de um grupo que
trabalhava com formação de professores para cegos. A partir de então,
algumas pessoas se reuniram para pensar produtos que atendessem às
demandas de deficientes visuais.
Dois projetos se concretizaram: um conta-gotas sonoro, desenvolvido por
Deyse Piedade Munhoz Lopes, do departamento de Física da universidade,
e o protótipo da reglete. A TECE aguarda financiamentos para conceber
uma versão final que possa ser testada por voluntários e, depois,
oferecida a empresas interessadas na sua produção.