conexão social
Uma nova lógica escolar
Encontro debate o papel pedagógico das novas tecnologias em sala de aula
Rafael Bravo Bucco*
ARede nº 98 – maio/junho de 2014
A educação em tempos de conexão, abundância e compartilhamento. Esse foi o eixo do 3º Seminário Nacional de Inclusão Digital (Senid), que aconteceu no final de março, em Passo Fundo (RS). O evento reuniu cerca de 600 profissionais de educação de todo o país, vindos de quase cem instituições de ensino, entre escolas, institutos federais, faculdades e universidades.
O coordenador do Senid, Adriano Canabarro Teixeira, da pós-graduação em Educação da Universidade de Passo Fundo (UPF), explica o embate entre uma nova realidade e a tradição escolar: “A lógica da escola é baseada ainda no quê aprender, quando aprender, e por que aprender. A questão é: temos uma tecnologia extremamente flexível, da qual podemos nos apropriar. A escola é um local de discussão conjunta, de fazer projetos, contextualizar questões”.
O encontro abordou também a inclusão digital no país. “Quem tem de fazer a discussão e fazer uma apropriação diferenciada das tecnologias são os professores. Eles atendem a 98% das crianças de nosso país, e grande parte das crianças tem acesso a tecnologias, pela primeira vez, dentro da escola”, lembra Teixeira.
Uma das conferencistas, Maria Helena Bonilla, coordenadora do programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia, aproveitou sua fala para provocar a plateia de educadores no mesmo sentido. Segundo ela, as tecnologias da informação e comunicação são encaradas como ferramentas analógicas nas escolas. “Temos de enxergar a tecnologia como cultura, ver que envolve dimensão política, filosófica, pedagógica, e técnica”, disse. Além de apontar a tecnologia como recurso colaborativo, que rompe o paradigma do professor como detentor do conhecimento, ela ressaltou ainda o papel fundamental do ensino público para a inclusão digital. “Dos 50,5 milhões de estudantes, 42,2 milhões estão em escolas públicas. É muita gente para privarmos de uma acesso de qualidade”, disse.
Robótica e games
O Senid foi também palco de duas disputas regionais: a primeira Olimpíada de Robótica Educativa Livre de Passo Fundo e região e o terceiro Campeonato Municipal de Frozen Bubble. No primeiro caso, estudantes de escolas de Passo Fundo, Tapejara e Marau formaram 13 equipes. Cada time programou um veículo robô fabricado com placa Arduino e comandado por linguagem de programação Scratch. O carrinho deveria passar por um circuito, definido no dia da final, e atendendo a exigências como acender faróis, buzinar, acionar as setas.
A equipe vencedora, entre doze concorrentes, veio da EEEM Senhor dos Caminhos, de Tapejara, cidade com 20 mil habitantes localizada no Norte do Rio Grande do Sul. O líder do grupo, Kevin de Farias, está no segundo ano do ensino médio. Ele conta que começaram a se reunir quatro meses antes, mas somente no mês anterior iniciaram os treinos para a disputa. E já planeja alçar voos mais altos: “Estamos pensando em um projeto que nos permita competir em nível regional, ou até mundial”. Os colegas de equipe foram Yan Katzvinkel e Flávio dos Santos, ambos do terceiro ano.
Marco Trentin, professor da computação da UPF e um dos organizadores da Olimpíada de Robótica, comenta que o objetivo é incentivar os estudantes a buscar uma carreira em áreas de exatas. “Não apenas robótica, mas também matemática, física, engenharia elétrica, da computação, mecânica”, enumera. Outro objetivo é mostrar aos educadores que a robótica se tornou acessível, pode ser ensinada mesmo em instituições com poucos equipamentos, e que os jovens contribuem muito para que projetos se desenvolvam. “Se pode usar materiais alternativos, os professores não precisam ter medo de propiciar isso a seus alunos”, opina.
Outra disputa local foi o Campeonato de Frozen Bubble, game disponível em computadores com sistema operacional GNU/Linux. O vencedor, entre quase 30 estudantes, foi Aryon de Freitas, de 11 anos, aluno da EMEF Coronel Lolico, de Passo Fundo. Foi o segundo ano seguido que ele ergueu o troféu; já havia vencido a segunda edição em 2013, e tirou o terceiro lugar em 2012. Mas o jovem estudante diz que não praticou. “Eu dificilmente treino. No primeiro ano treinei um pouco ainda”, fala. Segundo os organizadores, o game desenvolve o raciocínio lógico, além de despertar interesse para o software livre.
A equipe do Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digital (Gepid), da UPF, comemorou os dez anos do núcleo e do projeto de extensão universitária Mutirão pela Inclusão Digital, no Senid. Durante o período, a comunidade em torno da universidade promoveu projetos tocados por estudantes e que facilitaram o acesso de pessoas de baixa renda ou sem conhecimento em informática às novas tecnologias.
Também aconteceu no Senid o lançamento da Escola de Hackers, parceria da UPF, prefeitura da cidade, Faculdade Meridional e Instituto Federal Sul-Rio-Grandense. O projeto vai levar o ensino de programação a alunos dos 8º e 9º anos das escolas municipais. Cada unidade formará um grupo de 15 estudantes que vão se reunir semanalmente para desenvolver em Scratch. Quatro bolsistas da UPF já foram chamados, e aguardam, por enquanto, a formação das equipes nas escolas, cuja participação é facultativa.
* O repórter viajou a convite da organização do evento