Ganha corpo e repercussão popular o debate sobre o projeto substitutivo do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que trata de crimes na internet e tramita desde 2006 no Congresso. Em maio, houve atos públicos contra o projeto em São Paulo (dia 14), Rio Grande do Sul (dia 25). Em Belo Horizonte, houve um ato no dia 1º de junho. Participaram das manifestações parlamentares como o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) e a deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), que ressaltaram a importância de conscientizar seus pares sobre a importância do tema. “A internet é um mundo desconhecido no Congresso”, afirmou Manuela, em Porto Alegre. Suplicy, em São Paulo, admitiu ter pouco conhecimento sobre as implicações do texto, já aprovado pelo Senado, inclusive com votos da bancada de seu partido. O projeto Azeredo, batizado de AI-5 Digital pelos organizadores das manifestações, pretende tipificar crimes cometidos pela internet e, em nome disso, restringe a liberdade de uso e fere o direito ao anonimato dos usuários da rede.
Suplicy citou, em São Paulo, a carta enviada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, no início de maio, ao deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) e a ativistas gaúchos. Genro recebeu deles críticas ao projeto e a reivindicação de arquivamento. Respondeu que o ministério é “contrário, evidentemente, ao estabelecimento de quaisquer obstáculos à oferta de acesso por meio de redes abertas e à inclusão digital, ao vigilantismo na internet e a dificuldades para a fruição de bens intelectuais disseminados pela internet”. Genro pede contribuições da sociedade civil para aperfeiçoar um substitutivo a ser enviado pelo próprio ministério ao Congresso. De acordo com o deputado federal Júlio Semeghini (PSDB-SP), substituto de Azeredo na relatoria do projeto, o Ministério da Justiça apresentaria suas propostas de modificação na primeira semana de junho.
A Escola de Direito Público da Fundação Getúlio Vargas (FGV) está assessorando o Ministério da Justiça a avaliar as inconsistências do projeto. Para Luiz Moncau, pesquisador da FGV, o projeto tem problemas graves, como “tratar do direito penal, que tem penas de restrição de liberdade, com redações muito amplas. Não se sabe claramente o que ele deseja criminalizar”. O projeto Azeredo cria 13 novos crimes, com penas que variam de um a três anos de prisão. “O Direito Penal atinge a liberdade e a privacidade das pessoas, e tem que haver algo que justifique restrições sérias assim. Não se pode fazer isso falando de coisas vagas como ‘dispositivos de comunicação’, que pode significar qualquer coisa”, afirma.
Ao estabelecer penas que vão até três anos de prisão, o projeto Azeredo impede o julgamento por Juizados de Pequenas Causas e o uso de penas alternativas. Além disso, completa Moncau, trata de questões desnecessárias, como criar a figura de “estelionato eletrônico”, porque o estelionato já está caracterizado no Código Penal. “Isso se chama má técnica legislativa, cria uma confusão na legislação”, diz ele. O correto, e necessário, diz Moncau, seria “o Brasil criar um marco regulatório civil para definir claramente direitos e deveres de cidadania digital”, antes de contar com uma lei penal.
“Querem transferir para a nova economia da informação, que tem outra mecânica, o modelo da velha economia industrial”, diz o sociólogo Sergio Amadeu da Silveira, especialista em cibercultura, sobre a pretensão dos radiodifusores de levar seu modelo monopolista de produção e distribuição de conteúdos audiovisuais para a internet”.
Na França, a Assembléia Nacional e o Senado franceses aprovaram, nos dias 12 e 13 de maio, a lei Création et Internet, que visa colocar em prática o modelo de resposta gradual ou 3 strikes. A lei permite desativar as conexões de internet de usuários que tentarem, por três vezes, realizar downloads considerados ilegais. Os acusados de pirataria receberão dois e-mails, seguidos de uma notificação oficial. Se os downloads ilegais continuarem a ser feitos dentro de um período de um ano após os avisos, o acesso à internet será cortado por um período de dois meses a um ano — enquanto o usuário continua pagando pela conexão.
Além de estabelecer duas penas para uma só infração, não prever direito a recurso dos acusados nem processo judicial, a lei contraria frontalmente uma medida aprovada pelo Parlamento Europeu. Na primeira semana de maio, o parlamento aprovou uma emenda apresentada pelo Partido Verde ao pacote de legislação sobre telecomunicações. A emenda estabeleceu regras mais rígidas em defesa da livre expressão: determina que, em todos os países pertencente à Comunidade Europeia, apenas uma ordem judicial pode restringir o acesso à internet. A lei foi aprovada, contra um acordo de vários governos europeus, por ampla maioria de votos. A medida ainda requer uma decisão final, conforme negociações com o Conselho Europeu.
O novo parlamento deverá decidir sobre a emenda que exige prévia decisão judicial para qualquer restrição do acesso à Internet. A novidade, na eleição, é que o Partido Pirata (Pirate Partiet), o primeiro partido político nascido a partir de um site de transferências de arquivos (The Pirate Bay), consiga postos no Parlamento Europeu. Entre suas propostas estão reformulações nas leis online, compartilhamento gratuito de arquivos, redução de preços de CD, abolição de direitos de patentes.