Para pesquisa da Unicamp, ele provoca notas baixas.Educadores do UCA discordam.
Verônica Couto
Pesquisa feita por acadêmicos da Unicamp — “Desvendando mitos: os computadores e o desempenho no sistema escolar” — atribui ao uso intensivo de computadores o mau resultado de alunos nas provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica. Publicado em dezembro, o artigo avaliou as notas dos alunos de 4ª e 8ª série do fundamental e da 3ª série do ensino médio no Saeb de 2001, e também as fichas em que eles assinalam se usam o computador para trabalhos de casa. “Para os alunos de todas as séries e todas as classes sociais o uso intenso do computador diminui o desempenho escolar”, diz o artigo.
Professores do Grupo de Trabalho do programa Um Computador por Aluno (UCA) discordam do trabalho, e estão preparando artigos para rebatê-lo. Na opinião da professora Roseli Lopes, da USP, que acompanha o teste do laptop da OLPC em São Paulo, para entender as notas dos alunos no Saeb seria preciso conhecer muitas variáveis complexas e relacioná-las. Ela também destaca que a relação entre computador e ensino deve ser vista a partir do tipo de uso que se dá às tecnologias. “Por exemplo: ter biblioteca é condição necessária para um bom uso dos livros, mas não é condição suficiente”, diz, explicando que os professores podem não ter formação capaz de incentivar a leitura, selecionar as obras adequadas aos alunos, etc. Da mesma forma, o computador. “Posso usá-lo como máquina de escrever, ou, se tiver acesso à internet, como ferramenta de comunicação. E mesmo essa comunicação pode servir para fazer coisas interessantes ou não.”
A professora Léa Fagundes, da UFRGS, também do GT do UCA, concorda. “Usa o computador como, para quê? Acessa a internet? Tem projeto pedagógico?” Para ela, a única variável em que se baseia o artigo (a pergunta ao aluno se ele usa o computador para trabalhos de casa) “é frágil, sem relevãncia e está viciada”. “Os alunos não têm que fazer trabalho de casa no computador. Se a escola está incluindo os alunos na cultura digital, as práticas tradicionais do ensino têm que ser modificadas. Mas os pesquisadores esperam que as práticas não mudem”. O professor Jacques Wainer, do Instituto de Computação da Unicamp, um dos autores do artigo, reconhece que “não é possível saber” como os alunos usam o computador, nem se há acesso à internet: “a pergunta que os alunos responderam é se eles usam o computador para fazer trabalhos escolares. Nada específico sobre usar ou não a internet.”, diz ele.
Léa questiona, ainda, o próprio objeto do artigo. “A pesquisa tem um tratamento estatístico rigoroso e consistente. Mas enfoca um problema equivocado: se o uso dos computadores atende a uma necessidade do aluno ou não. Ora, se a escola não tem computador, está excluída do mundo digital, enquanto deveria estar formando a pessoa para ajudar a sociedade a se desenvolver. Como ter um cidadão capacitado numa sociedade digital? A escola vai ignorar a tecnologia digital?” Wainer discorda: “nem tudo que acontece na vida social deve acontecer na escola”. Mas isso não significa que ele defenda a suspensão do uso de computadores na escola. “O governo (e as ONGs interessadas em inclusão digital) deveria investir em computador em algumas escolas e monitorar/avaliar com cuidado os efeitos”, diz, apontando como “uma tragédia” o fato de os educadores, segundo ele, não estudarem os dados do Saeb.
Para Roseli, a avaliação do processo educacional não pode ser feita em termos estritamente estatísticos. “A estatística pode levar a qualquer conclusão, mas a análise do processo de aprendizagem não acontece dessa maneira.”