A Casa de Cultura Tainã forma educadores populares e desenvolve
atividades para moradores das zonas sul e noroeste de Campinas,
voltadas à construção da cidadania e baseadas no acesso à informação, à
arte e à tecnologia.
Verônica Couto
A Casa de Cultura Tainã é uma sobrevivente. A Prefeitura de Campinas
(SP) criou, entre 1989 e 90, 14 Casas de Cultura – e das nove
experiências que não eram ligadas à administração direta do município,
mas autônomas, só sobrou ela. Faz um trabalho de formação de identidade
cultural e de exercício de cidadania, baseado, sobretudo, na inserção
comunitária e nas relações estreitas com as pessoas do lugar onde está
instalada. Fica em frente à Praça do Trabalhador, na vila Padre Manoel
da Nóbrega, num enclave de vilas populares das zonas sul e noroeste de
Campinas, área conhecida como “o outro lado da cidade”. “Desse lado da
avenida Anhanguera, são 500 mil habitantes”, calcula Antônio Carlos
Santos Silva (ou TC), presidente da entidade que, entre outros
projetos, toca a Orquestra Tambores de Aço, a primeira do Brasil a usar
esses instrumentos originários de Trinidad Tobago, também chamados de
steel pan (panela de aço, em inglês).
A Orquestra Tambores de Aço, na sede reformada da Tainâ.
Segundo Antônio Carlos, esse vínculo explica por que a Casa de Cultura
Tainã sobreviveu à mudança na gestão municipal e completou 16 anos
atuando com pouquíssimos recursos. Em 2003, com os incentivo da Lei
Rouanet, conseguiu o patrocínio da Sanasa para adquirir os cinco
tambores da orquestra. Ao todo, são 25 jovens, incluindo músicos nas
maracas, nos tambores tradicionais, no agogô, ou cantando. Agora,
Antônio Carlos espera a visita da orquestra da escola de St.Xaviers, de
Trinidad Tobago, que deve doar outros 18 tambores.
Os tambores estão na alma da Casa de Cultura Tainã. A partir e em torno
deles, articula-se grande parte da sua sustentabilidade – com shows e
oficinas – e o resgate histórico e cultural da comunidade. Graças à
convivência com músicos, descendentes de escravos, que fazem o samba de
roda em Vinhedo, no bairro da Capela, Antônio Carlos conseguiu que lhe
fosse entregue para restauração a velha zabumba construída pelo mestre
Nestão, há mais de 20 anos parada. A recuperação do instrumento, com
apoio da PUC, acabou gerando um vídeo sobre o samba de roda em
Campinas, gênero que, segundo Antônio Carlos, teria matrizes comuns ao
Olodum baiano.
Você tem fome de que?
Além da orquestra, a Tainã conta com biblioteca, atividades para
pessoas da terceira idade, computadores, banco comunitário de
preservativos (projeto Tambor Dá Saúde), e muitas oficinas. “Música,
capoeira, artes plásticas, dança, informática – vai da vocação de um. A
agenda é livre, mas vale tudo para trabalhar a formação da meninada”,
diz Antônio Carlos. A preocupação central, explica ele, é a construção
de novos valores na consciência dos jovens. “Temos que perguntar: para
que você precisa desse celular, desse tênis? Do que realmente se
precisa para viver? É esse o eixo do processo educativo com os jovens,
que estão sob uma pressão violentíssima do consumo”, diz.
E-Lane: laboratório de educação
a distância.
No Carnaval, o Maracatu Nação Tainã se junta a outros movimentos
culturais – à Nação Congo (do bairro São Bernardo), ao Tambor Menino
(de Americana), ao Savuru (da vila Anchieta), ao Jongo Dito Ribeiro
(Jardim Roseira) e ao Urucungos. Para essa pororoca carnavalesca que
ganha as ruas, cunharam uma marca coletiva – Nação Nagô. A Tainã
acredita que a ética dos processos colaborativos é transformadora, o
que também se reflete nas suas iniciativas com as tecnologias da
informação. Faz parte da Rede Mocambos, criada para disseminar o uso de
ferramentas digitais livres e de ambientes compartilhados, em parceria
com a Casa Laudelina de Campos Mello (nome que homenageia a fundadora
do primeiro sindicato de mulheres de Campinas), o cursinho popular
Herbert de Souza, o Progen-Projeto Gente Nova, Arte de Vencer entre
outras entidades.
A Casa de Cultura Tainã já serviu de base para capacitações do Gesac,
programa que também deu a antena para a conexão dos seus computadores à
internet. Do seu quadro de educadores populares, saíram cinco dos 20
implementadores de São Paulo no Gesac. Esse pessoal continua apoiando
voluntariamente a Tainã, selecionada como Ponto de Cultura do programa
federal Cultura Viva. Eles e outros ativistas colaboram cedendo câmera
de vídeo, gravador, sistema de edição de imagens e de som, enquanto não
chega o kit de equipamentos do Ministério da Cultura. Por isso, foi
possível produzir o documentário “Bactainã” (disponível no site Estúdio
Livre), em 2003, entre outros.
TC: "para que você precisa
desse tênis?"
Antônio Carlos é músico, já teve uma banda de reagge (a Zion), passou
um tempo em São Paulo. A pedido de uma famosa liderança comunitária
local – Antônia Frutuosa Felisbino, a Toninha, falecida em 1993 –
voltou em 89 para dar aulas de violão para jovens. “Começou a aparecer
criança, adolescente, menino que nunca mais acaba. Acabei ficando”. A
conquista do espaço foi dura. Em 1991, o grupo se transferiu da Vila
Castelo Branco para a sede nova, com 8,5 mil metros quadrados, cedida
pela Prefeitura. Passou a se chamar Casa de Cultura Tainã, nome que
significa caminho das estrelas, em Tupi Guarani. O espaço, reformado,
foi inaugurado em novembro de 2005.
Este ano, foram instalados 12 computadores pela Unicamp, para o projeto
E-Lane –European and Latin American New Education, desenvolvido pela
Comunidade Européia em vários países. Tem muitos objetivos: integrar
aplicações de educação a distância, numa plataforma aberta; desenvolver
uma metodologia de ensino para essa plataforma; integrar conteúdos
gerados por instituições de ensino da Europa e da América Latina, de
modo a reunir material educacional de baixo custo para ser oferecido à
sociedade.
http://sarava.org/redemocambos/wiki/index.php/P%C3%A1gina_principal – Wiki do Projeto Rede Mocambos.
http://www.lsd.ic.unicamp.br/projetos/e-lane/ -Projeto E-Lane, no portal da Unicamp.
www.e-lane.org – Site oficial do E-Lane.
http://www.estudiolivre.org/videos/videos_livres/tambores.avi.ogg
Link para download do vídeo sobre a Orquestra Tambores de Aço.
ftp://michelazzo.com.br/midia/videos/casa_cultura_taina.mp4 – Link para download do vídeo Bactainã.
www.estudiolivre.org/videos/videos_livres/debate.ogg
Link para vídeo do debate com Antônio Albuquerque, ex-coordenador do Gesac.