Cultura – Hip Hop

Hip hop em ritmo de geração de renda

Programa do governo estimula a criatividade e apoia a cadeia econômica da arte popular

Lúcia Berbert

Transformar manifestações culturais em empreendimentos sociais que geram renda para comunidades carentes, utilizando metodologias já consagradas em outros ramos de atividades é o princípio básico dos Arranjos Produtivos Locais (APL) da Economia da Cultura. Já existe o APL da Música Independente, que começa a funcionar em Cuiabá (MT), Uberlândia (MG) e São Carlos (SP); e o de Teatro, em Ribeirão Preto (SP), Planaltina e Gama (DF). Agora chegou a vez do hip hop, movimento de grande difusão em Ceilândia, Sobradinho e Varjão, cidades satélites do Distrito Federal.

“O movimento hip hop nessas cidades é referência nacional, com produção de altíssima qualidade, mas não tem sustentabilidade”, avalia o assessor da Secretaria de Inclusão Social do Ministério da Ciência e Tecnologia, Marcus Vinicius Nogueira, coordenador do APL do hip hop. O objetivo do projeto é dar uma resposta de sustentação a essa criatividade. “ Se não acabamos perdendo esses jovens para o tráfico de drogas, para a bandidagem. Ou, na melhor das hipóteses, adotam uma profissão menor, desperdiçando todo o talento”, afirma Nogueira.

O atual governo tem se valido constantemente dos APLs para dar sustentabilidade a pequenos empreendedores e artesãos, que passam a produzir e vender suas mercadorias de forma conjunta. A novidade é a aplicação dessa política pública na área da cultura. “A economia da cultura depende menos do aporte de capital do que da criatividade e pode se transformar em um grande negócio para o país”, prevê Nogueira. No Brasil, atuam 320 mil empresas
voltadas à produção cultural, que geram 1,6 milhão de empregos formais. “Ou seja, as empresas da cultura representam 5,7% do total de empresas no país e são responsáveis por 4% dos postos de trabalho”, sustenta. Ele prevê que o hip hop movimente, no Distrito Federal, R$ 4 milhões anuais.

Nogueira informa que o APL do hip hop está baseado no mapeamento e na capacitação da cadeia produtiva para atingir o objetivo maior, que é o fortalecimento dos empreendimentos existentes, e para incentivar a criação de outros. Os recursos necessários para implantação do APL nas três cidades satélites são da ordem de R$ 1,4 milhão, verba que virá dos orçamentos dos Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Cultura. O acompanhamento é do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e os gestores são organizações sociais, identificadas com o público-alvo do projeto. Os recursos serão investidos em mapeamento, treinamento, compra de equipamentos.

Na Ceilândia, o APL vai trabalhar com 430 pessoas, em oficinas de audiovisual, música, DJs; oficinas de confecção, com ênfase no aproveitamento do grafite na moda; elaboração de projetos e produção de eventos. O trabalho será realizado em parceria com as instituições sociais Programando o Futuro, a proponente e coordenadora administrativa; Meninos da Ceilândia, que está fazendo a coordenação do projeto da confecção; Atitude, que ficou com a parte de audiovisual e o Grupo Azulim, uma organização que trabalha com hip hop, está encarregada de elaboração dos projetos e produção.

Em Sobradinho e no Varjão, serão atendidos 180 jovens, em parceria com o Grupo Azulim, Cooperativa de Costura Girassol, Administração Regional da cidade e a Associação de Moradores. O público-alvo do APL é de pessoas entre 15 e 29 anos, mas não deixará de atender pessoas de outras faixas etárias. “No Varjão, por exemplo, estamos trabalhando com o Girassol, que é uma cooperativa de construção. Nós não vamos ensinar os meninos do hip hop a costurar, nós vamos ensinar design. Os ensinamentos de corte e costura serão dedicados a essas senhoras da cooperativa”, explica Ana Cláudia Rodrigues, assessora do MCT e uma das técnicas responsáveis pelo programa.

PESQUISA PARTICIPATIVA
O mapeamento será feito por meio de pesquisa participativa. “Em vez de ser feita por pessoas de fora, nós vamos treinar os próprios moradores para funcionar como pesquisadores populares. Contratamos o Instituto de Tecnologia Social (ITS), que tem o método de formação de censores populares”, conta Nogueira. Serão formados 12 censores que trabalharão por três meses somente dentro dos movimentos de hip hop.

As oficinas terão início em setembro, na Ceilândia, e, em janeiro de 2010, em Sobradinho e no Varjão. A duração prevista do projeto é de dez meses. Ao final, serão apresentados resultados práticos da capacitação. “A oficina de confecção, por exemplo, irá apresentar uma coleção de roupas baseada na cultura hip hop”, conta Gislane Lisboa, uma das 13 costureiras da Cooperativa Girassol. Ela entende que o projeto abrirá um campo novo e certo para o trabalho da cooperativa.

Thiago Muniz, integrante de um dos 12 grupos de hip hop do Varjão, acredita que o projeto abrirá oportunidades para todos que fazem parte do movimento. “De certa forma, é um resgate social dos jovens da periferia e um empreendimento com o objetivo de ensinar as pessoas a administrar um negócio”, avalia. Ele já pensa em criar uma organização social reunindo todos os grupos com atividades sociais para atender os jovens carentes da cidade. A sustentabilidade do projeto virá também de outra ferramenta proposta, que é a criação de um banco de trabalho, uma moeda complementar. “O banco será apenas um articulador, que comercializa a força do trabalho com os parceiros da comunidade. Por exemplo, negociar com uma padaria a produção de um jingle composto por um rapper ou um MC do movimento hip hop”, completa Nogueira.