Em São Paulo e em Porto Alegre,
alunos e professores vão avaliar o novo modelo educacional proposto
pelo notebook idealizado pelo pesquisador Nicholas Negroponte. Lia Ribeiro Dias e Verônica Couto
Os testes do Ministério da Educação (MEC) com o XO, nova denominação do
laptop educacional de baixo custo, serão feitos em duas escolas da rede
pública — uma na periferia de São Paulo, outra em Porto Alegre. A
previsão dos coordenadores do projeto é que cada escola recebesse cem
máquinas, até o dia 10 de fevereiro. Se os equipamentos forem aprovados
em campo, um novo lote entraria em produção para ser entregue até
abril, totalizando 400 equipamentos ao todo — 200 para cada escola.
À primeira vista, o que chama a atenção nos protótipos que circularam
em janeiro e feveiro, por oficinas pelo país, é a fundamental
orientação do projeto pedagógico para a formação de redes. O XO foi
concebido com uma filosofia oposta à noção conhecida do “fazer sozinho”
e sem colar, com fiscais pela sala de aula. Ao contrário, os alunos
usuários do laptop
terão ferramentas para a interação intensiva e constante entre eles. A
máquina tem antenas Wi-Fi (sem fio) embutidas e adota a tecnologia
Mesh. Ou seja, basta que um dos integrantes da rede esteja contectado à
internet, para que os demais possam retransmitir os dados de um para o
outro, estendendo esse acesso, sem necessidade de infra-estrutura
externa.
“Não serão mais mil unidades para os testes iniciais, embora esse total
possa ser atingido futuramente”, explica Roseli de Deus Lopes,
pesquisadora e professora da Escola Politécnica da USP, uma entre nove
coordenadores de grupos de trabalho que avaliam, para o MEC, o projeto
UCA — Um Computador por Aluno, em que o se insere o notebook XO, da ONG
OLPC. “A produção gradual do XO busca
verificar, na prática com as crianças, se serão necessárias
alterações”.
Os alunos das duas escolas selecionadas, inicialmente, não vão levar para casa os notebooks,
que serão usados pelas turmas dos três turnos (não é um por aluno, mas
um por aluno em cada aula). Em São Paulo, estima-se que sejam atendidos
cerca de 900 estudantes e 60 professores. “Gradualmente, de acordo com
o planejamento da escola, as máquinas poderão ser levadas para casa, em
atividades especiais ou alternando turmas”, acredita Roseli. Nem todas
as “atividades” — conceito que substitui os tradicionais softwares
aplicativos — estarão já disponíveis no
XO. No caso de São Paulo, ficarão num servidor da USP, sendo
introduzidas aos poucos, conforme sejam desenvolvidas. Incluem
navegador web, processador de texto, kit de utilitários musicais, etc.
Uma das oficinas, com desenvolvedores, especialistas em novas
tecnologias na educação e professores, aconteceu em janeiro, no prédio
da Escola Politécnica da USP. Na ocasião, o sistema operacional e a
interface do equipamento com o usuário — o ambiente Sugar — foram
apresentados por Walter Bender, vice-presidente de software
e conteúdo da OLPC.org, fundador do MediaLab (com Nicholas Negroponte),
onde atuava, nos últimos cinco anos, como coordenador de programas.
Segundo ele, o XO é formado por três principais camadas. Na primeira, é
uma máquina Linux, apta a rodar qualquer programa para Linux; a segunda
camada é um X-Windows, o sistema de janelas desenhado para Linux, mais
leve do que o ambiente da Microsoft e também dez anos mais velho do que
ele, com o gerenciador de janelas Matchbox; finalmente, a terceira é o
Sugar, o ambiente específico do XO, que inclui a rede Mesh. É para essa
interface pedagógica que estão sendo adaptadas as diversas aplicações,
ou atividades, que vão rodar na máquina.
Bender informou que a equipe da ONG OLPC explora a possibilidade de rodar games no notebook.
Um deles é o Sim City, cujo fabricante está liberando, para o projeto,
uma versão de código aberto que, provavelmente, estará pronta ainda em
fevereiro. A proposta é que as crianças façam parte de uma câmara de
vereadores, tendo que trabalhar colaborativamente em ferramentas de
decisão para gerir essa cidade simulada.
Segundo ele, o notebook também terá, em breve, um sistema
de voz sobre IP, além do chat na rede (já implantado). No final de
janeiro, de acordo com Bender, os maiores esforços de desenvolvimento
concentravam-se nas áreas de energia e de comunicação — a tecnologia
Mesh. Testes com o XO estavam medindo, entre outras coisas, as
variações do sinal da rede, que vai usar links sem fio (Wi-Fi),
nos diferentes relevos, e que distâncias conseguirá cobrir. A
disponibilidade de banda larga, contudo, é pré-requisito para a sua
operação.
A idéia convencional de software aplicativo foi
substituída, no projeto pedagógico do XO, pelo conceito de
“atividades”. O foco dessas “atividades” é a colaboração e a expressão.
Por isso, sua implementação se dá, principalmente, pela interação na
rede. As atividades podem ser navegar na web, desenhar, fotografar,
fazer música, jogar, etc. Desenvolvidas em grupo ou de forma
individual, quando o seu resultado fica disponível para ser debatido de
forma coletiva.
O XO traz câmera fotográfica/vídeo e microfones embutidos, que podem
ser acionados de forma compartilhada, simultaneamente, por exemplo, com
uma dicussão em chat. Na tela que mostra o ambiente da rede, cada aluno é representado por uma cor. No protótipo do notebook,
o sistema ainda escolhia aleatoriamente a cor do usuário; mas, na nova
versão, que estava prevista para o dia 29 de janeiro, ela seria
definida pelo aluno. Ao clicar no ícone da rede Mesh, aparecem as
cores, indicando as crianças que estão conectadas. E, agrupados por
cores, por exemplo, seriam formadas equipes para fotografar juntas. Ou
os alunos poderiam abrir uma janela de chat reunindo apenas
aqueles que estão compartilhando uma determinada aplicação. As
produções dos alunos (fotos, desenhos, animações, etc.) também ganham
molduras com as suas cores.
Além dos 400 notebooks XOs, da ONG OLPC.org, o MEC recebeu
40 unidades do Mobilis, fabricado pela empresa Encore Software, de
Banglore, na Índia, que serão testadas numa escola de Brasília. Também
deve dispor, em março ou em junho, de outras mil máquinas ClassMate,
modelo da Intel que disputa o mercado educacional. O Mobilis roda Alta
Vista Linux; o XO, Linux; e o ClassMate, Windows XPE ou Linux. Este
ano, o governo brasileiro deverá definir sua estratégia para aquisição
e uso dos portáteis de forma massiva na educação — a iniciativa UCA, ou
Um Computador por Aluno.
Segundo José Luiz Aquino, da assessoria especial da Presidência da
República, os computadores da Intel devem ser testados em cidades com
cobertura wireless
para conexão à internet, já que seu sistema de conexão à rede, como o
do Mobilis, é tradicional: apenas recebem e transmitem sinais e,
portanto, só se conectam à internet se houver cobertura de
infra-estrutura de rede (diferentemente da rede Mesh). Cotadas para os
testes do Classmate, as cidades de Outro Preto, em Minas Gerais, e
Piraí, no Rio de Janeiro.
O Mobilis será avaliado por uma turma de uma escola de Brasília. Lançado comercialmente em outubro de 2006, o notebook
custa US$ 165, para encomendas de 1 milhão de máquinas, em comparação a
US$ 145, do XO. O Classmate deverá custar por volta de US$ 300.
http://wiki.laptop.org/go/Home – Wiki para troca de idéias, propostas e comentários sobre o projeto OLPC.
http://pilotosdoprojetouca.blogspot.com/
— Blog do Projeto UCA (Um Computador por Aluno), com as atividades das
nove equipes de trabalho acionadas pelo MEC para testar os equipamentos.