Editorial

Ausência inexplicável



Embora sua base instalada seja bem inferior à de software proprietário,
o software livre está presente em 64% das empresas brasileiras, segundo
dados da IDC, e sua expansão é da ordem de 30% ao ano. Diante disso, é
inexplicável que o programa de capacitação em software a ser desenhado
pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, e que começa agora um primeiro
piloto, não contemple formação específica em software livre, à exceção
da linguagem Java.

A ausência não se justifica, não só pela expansão de seu uso, mas pelo
fato de o software livre se desenvolver em um ambiente de colaboração,
o que permite gerar uma rede de conhecimentos compartilhados e economia
de custos. Como reconhece o gerente de segurança do Centro de Estudos e
Sistemas Avançados do Recife (C.e.s.a.r.), Rodrigo Assad, o software
livre “não escolhe classe social, idioma ou religião – bastam um
computador conectado e a participação nas comunidades de maior
afinidade do candidato”. No entanto, apesar do potencial do software
livre para um país como o Brasil, onde está a segunda maior comunidade
de software livre do mundo, não existe um programa consistente de
formação nessa área. Como mostra a reportagem de capa desta edição
(veja a página 10), ela acontece principalmente de forma autodidata ou
em programas isolados, de agentes como o Instituto Nacional de
Tecnologia da Informação (ITI), prefeituras e ONGs. Sem dúvida nenhuma,
é hora de o MCT avaliar esse cenário e de os cursos de graduação em
ciência da computação, especialmente os das universidades públicas,
repensarem sua grade curricular.

Revolução digital

Também não é possível o Brasil avançar em direção à revolução digital,
sem impulsionar o desenvolvimento do software livre no país, em função
do seu papel relevante na sociedade da comunicação em rede, de acordo
com o especialista Marcelo D’Elia Branco (veja a página 36). Para
Marcelo, que há dois anos trabalha para o governo da Catalunha, na
Espanha, o Brasil poderá ser protagonista nessa nova sociedade, em
função de traço cultural e da facilidade com que os brasileiros
transitam pela internet e suas comunidades sociais. Para isso, no
entanto, ele alerta que o país precisa fazer as escolhas certas e
aproximar suas políticas industrial e de inovação dos programas de
inclusão digital. “Hoje, infelizmente, o que vemos é uma dissociação
entre eles”, afirma. O programa de formação em software e o próprio
programa de exportação de software, que lhe deu origem, são exemplos
dessa dessintonia perversa.


Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial