editorial
CRIPTOGRAFIA? É BOM COMEÇAR A ENTENDÊ-LA
ARede nº 99 – julho/agosto de 2014
À primeira vista, criptografia é um conceito complexo. Mas em um mundo cada vez mais conectado, e onde se espiona cada vez mais as comunicações não só de governos mas de indivíduos, será preciso entender e popularizar essa ciência. Como mostra a reportagem de capa desta edição, é um importante recurso para blindar comunicações na internet.
Uma das consequências do escândalo da espionagem feita pela agência de segurança nacional estadunidense foi mostrar a importância dessa ferramenta, considerada a mais eficaz contra violações das comunicações digitais. Dados encriptados dificilmente conseguem ser lidos por terceiros, embora isso não seja impossível.
Se é fundamental governos e cidadãos terem cuidado com suas comunicações, evitando usar programas proprietários – aí reside um grande perigo, pois os softwares proprietários têm portas criadas exclusivamente para acesso dos desenvolvedores –, também é preciso construir um arcabouço legal de proteção à privacidade na rede. No Brasil, é ilegal violar a privacidade sem ordem judicial. Mas só o conceito não basta. O governo trabalha em um projeto de lei de proteção dos dados dos cidadãos – aguarda-se que a proposta chegue ao Legislativo e seja amplamente debatida com a sociedade.
Antes de travar essa nova frente de luta, porém, a sociedade deve estar atenta à regulamentação do Marco Civil da Internet, transformado em lei em abril. O seu artigo 15 permite a guarda dos logs (dados de navegação dos internautas) por provedores de conteúdo da internet. Dependendo de como for regulamentado o artigo, poderá criar um mercado de vigilância ou de interceptação de dados. Ou seja, em vez de atingir seu objetivo – obter informações para impedir crimes –, o artigo 15 poderá tornar vulneráveis os dados pessoais na rede.
Todo cuidado é pouco. Pois os dados pessoais vêm sendo bisbilhotados não só por governos que cerceiam a liberdade na rede. As empresas de conteúdo vira e mexe utilizam dados pessoais sem autorização. O mais recente exemplo foi uma pesquisa de comportamento na rede, feita pelo Facebook, sem autorização dos pesquisados.
Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial
Uma visita a Piraí do Norte e Nilo Peçanha, as duas primeiras cidades do programa Cidades Digitais, do Ministério das Comunicações (Minicom), mostra o quanto uma infraestrutura eficaz de comunicação pode transformar as realidades locais. Em Piraí do Norte, em vez de 350 kbps por máquina, via rádio, existem 12 pontos em estabelecimentos de governo e dois pontos em praças públicas com, em média, 1 Mbps integral. O município, que antes gastava R$ 3,5 mil por mês para conectar só os 54 computadores da prefeitura, hoje paga R$ 6 mil mensais por acesso de qualidade em toda a rede.
No entanto, a reportagem de capa desta edição mostra, para além dos casos de sucesso, as dificuldades enfrentadas pelas demais cidades do programa, na maioria municípios pequenos, com arrecadação marginal e orçamento apertado, que dependem totalmente dos fundos da União. A Secretaria de Inclusão Digital, do Minicom, garante que se empenha para “dar sustentabilidade ao projeto”, conforme explica Lygia Pupatto, titular da Secretaria. E buscou várias parcerias – Telebras, Serpro, Pronatec, Sebrae e governos estaduais.
O Cidades Digitais enfrentou outro desafio, de alterar a regulamentação. Até então, só cidades com empresas públicas com licença SCM podiam operar uma rede de cidade digital. Agora, redes gerenciadas por entes da federação ou por organizações sem fins lucrativos podem oferecer conexão. Uma das dificuldades das 80 cidades selecionadas no primeiro edital é justamente atender as exigências da Anatel. Outra é a negociação para uso dos postes. O preço de referência acordado entre Anatel e Aneel ainda depende de consulta pública, mas a SID mudou o modelo para as 262 cidades do segundo edital, que vai prever a fibra enterrada como norma – serão 90% de fibras subterrâneas e 10% aéreas.
À espera do Marco Civil
Até o fechamento desta edição, dia 29 de novembro, o Marco Civil da Internet não tinha sido votado – apesar da recomendação de regime de urgência feita pela presidente Dilma Rousseff. A neutralidade da rede continua sendo o entrave para um acordo que viabilize a tramitação do projeto de lei no Congresso. E as organizações sociais continuam mobilizadas na luta por uma internet livre, sem privilégios para alguns, com qualidade de acesso a todos.
Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial