Editorial
Marcha a ré na cultura
ARede nº66 – Março de 2011
Os sinais de que a administração Ana de Hollanda prepara um retrocesso na política cultural desenvolvida ao longo dos dois governos Lula infelizmente se sucedem. A retirada da licença Creative Commons do site do Ministério da Cultura, uma das primeiras iniciativas da nova ministra em janeiro, não seria motivo de tamanha polêmica não fosse por sua forte carga simbólica.
A licença Creative Commons traz, para as obras culturais, as mesmas liberdades que a licença GPL dá ao software livre. Ou seja, a liberdade de o usuário usar a obra cultural e distribuí-la, em sua forma original ou alterada. As licenças livres são importantes instrumentos para o desenvolvimento da cultura digital por meio da internet. A geastão Gilberto Gil colocou a cultura digital na agenda do MinC. Parece que a intenção da ministra é minar essa agenda.
A retirada da licença CC do site oficial do MinC foi apenas o primeiro passo, em um ensaio de fortalecimento, na política governamental, do conceito do direito autoral. Como é comum em mudanças de governo, a Casa Civil devolveu ao MinC o anteprojeto de revisão da atual Lei do Direito Autoral, que foi amplamente debatido na gestão anterior por três anos. Foram 80 encontros nacionais, sete seminários e consulta pública que recebeu 8.431 sugestões.
Portanto, a decisão da ministra Ana de Hollanda de montar outra equipe de consultores e juristas para formular uma nova proposta “que atenda a demanda da área” indica a clara orientação de mudança.
Há outro sinal preocupante. A principal meta do MinC para este ano é a construção de 400 Praças do PAC, centros culturais multimodulares, ideia que foi abandonada em 2004 em favor dos Pontos de Cultura. No lugar de se levar cultura para a periferia adotou-se a política de reconhecer as iniciativas de produção cultural em todo o país, como agentes da cultura viva e não “audiência” da cultura oficial.
É hora de todos os defensores da cultura viva e da cultura digital se somarem à mobilização dos Pontos de Cultura para evitar que o MinC volte a ser veículo apenas da cultura de mercado, como ocorria até 2003.
Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial