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editorial – Exemplo a ser seguido

editorial

 

Exemplo a ser seguido

 

ARede nº 98 –  maio/junho de 2014

Lia-Ribeiro-dias-diretora-editorial-arede-2014Por ser literalmente uma Constituição do mundo virtual, que estabelece os direitos e os deveres dos que integram o ecossistema da internet, o Marco Civil da Internet, aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pela presidente Dilma Rousseff, teve repercussão muito além das fronteiras nacionais. Elogios vieram de personalidades que ajudaram a criar a internet e de representantes de diferentes países reunidos no NETmundial, em São Paulo, em abril.

Considerada a mais ampla legislação da internet já aprovada no mundo, o Marco Civil é um exemplo a ser seguido por ser uma carta de princípios, que garante as liberdades fundamentais dos cidadãos na internet, como a liberdade de expressão, o direito à privacidade e o livre acesso à rede com o tratamento isonômico de todo tipo de tráfego, ou seja, o princípio da neutralidade. Tão logo o Marco foi aprovado, especialistas na área como o professor Ronaldo Lemos, do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (RJ), previram que a legislação brasileira teria poder de influenciar importantes decisões relativas à internet a serem adotadas no mundo.

Otimismo? Certamente, pois os embates em torno de temas como neutralidade da rede e direito autoral envolvem fortes interesses econômicos, e vão estar nas próximas pautas de discussões. Mas a previsão começa a se cumprir. Depois de a poderosa Federal Communications Commission (FCC), dos Estados Unidos, anunciar que iria rever sua posição sobre neutralidade, a comissão recuou em sua proposta, em parte. Pressionada por entidades da internet e mesmo por provedores de conteúdo, a FCC desistiu de permitir, como propôs seu chairman em abril, que empresas de conteúdo entregassem seu tráfego diretamente a operadoras de telecom, em acordo comercial com prioridade para o gerenciamento de seus dados. Mas no texto colocado em consulta pública em maio, a FCC permite acordos comerciais para aumento da velocidade de tráfego dos dados contratados.

Esta é uma história que ainda não se encerrou, mas o parcial recuo da FCC, da mesma forma que a proposta sobre neutralidade aprovada pelo Parlamento Europeu, indicam que a pressão por uma internet livre e neutra é forte o suficiente para enfrentar os lobbies empresariais. A aprovação do Marco Civil, sem dúvida, contribuiu para elevar o nível dessa pressão.

Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial

Uma visita a Piraí do Norte e Nilo Peçanha, as duas primeiras cidades do programa Cidades Digitais, do Ministério das Comunicações (Minicom), mostra o quanto uma infraestrutura eficaz de comunicação pode transformar as realidades locais. Em Piraí do Norte, em vez de 350 kbps por máquina, via rádio, existem 12 pontos em estabelecimentos de governo e dois pontos em praças públicas com, em média, 1 Mbps integral. O município, que antes gastava R$ 3,5 mil por mês para conectar só os 54 computadores da prefeitura, hoje paga R$ 6 mil mensais por acesso de qualidade em toda a rede.

No entanto, a reportagem de capa desta edição mostra, para além dos casos de sucesso, as dificuldades enfrentadas pelas demais cidades do programa, na maioria municípios pequenos, com arrecadação marginal e orçamento apertado, que dependem totalmente dos fundos da União. A Secretaria de Inclusão Digital, do Minicom, garante que se empenha para “dar sustentabilidade ao projeto”, conforme explica Lygia Pupatto, titular da Secretaria. E buscou várias parcerias – Telebras, Serpro, Pronatec, Sebrae e governos estaduais.

O Cidades Digitais enfrentou outro desafio, de alterar a regulamentação. Até então, só cidades com empresas públicas com licença SCM podiam operar uma rede de cidade digital. Agora, redes gerenciadas por entes da federação ou por organizações sem fins lucrativos podem oferecer conexão. Uma das dificuldades das 80 cidades selecionadas no primeiro edital é justamente atender as exigências da Anatel. Outra é a negociação para uso dos postes. O preço de referência acordado entre Anatel e Aneel ainda depende de consulta pública, mas a SID mudou o modelo para as 262 cidades do segundo edital, que vai prever a fibra enterrada como norma – serão 90% de fibras subterrâneas e 10% aéreas.

À espera do Marco Civil
Até o fechamento desta edição, dia 29 de novembro, o Marco Civil da Internet não tinha sido votado – apesar da recomendação de regime de urgência feita pela presidente Dilma Rousseff. A neutralidade da rede continua sendo o entrave para um acordo que viabilize a tramitação do projeto de lei no Congresso. E as organizações sociais continuam mobilizadas na luta por uma internet livre, sem privilégios para alguns, com qualidade de acesso a todos.

Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial