Iniciativa privada, benefício público
Universidade gaúcha promove a inserção sociodigital a partir de parcerias com grandes empresas de tecnologia
Anamarcia Vainsencher
ARede nº 86 – novembro de 2012
A CIDADE DE São Leopoldo, na região metropolitana de Porto Alegre (RS), vive em contradição. Polo tecnológico, sedia inúmeras multinacionais de tecnologia, que se instalaram ali de olho nos profissionais formados pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Essas empresas são responsáveis pela maior parte do PIB municipal, fortemente baseado no setor de serviços. Mesmo assim, apenas 32,8% das escolas de ensino fundamental tinham acesso à internet em 2005, segundo o estudo Objetivos do Milênio.
Foi esse número que motivou o Centro de Cidadania e Ação Social (CCIAS) da Unisinos a criar o Eu-Cidadão – Inclusão Digital e Cidadania, programa com o objetivo de reduzir a desigualdade digital. Bem-sucedida, a iniciativa segue firme em funcionamento, estimulando o acesso às tecnologias de informação e comunicação (TICs) a partir do acesso livre a máquinas conectadas à internet. Os computadores ficam à disposição para pesquisar, ler notícias, digitar documentos e currículos, enviar e-mails, gerenciar contas bancárias, entre outras coisas.
Mas não é qualquer um que pode se beneficiar. O foco é bem claro e definido. O projeto atende pessoas indicadas pela Rede Socioassistencial de São Leopoldo, estudantes de escolas públicas e bolsistas do Programa Universidade para Todos (Prouni), do governo federal, na Unisinos, além dos integrantes de programas sociais da universidade. Para participar, é condição ter renda familiar per capita igual ou inferior a três salários mínimos.
Em agosto de 2011 o programa ganhou novo fôlego graças ao apoio da SAP – uma das multinacionais de tecnologia do vale do Rio dos Sinos. A empresa doou 30 computadores e passou a incentivar seus funcionários a se tornar voluntários no Eu-Cidadão, ondem vão para ensinar um pouco do que sabem a quem está começando – muitas das vezes – do zero.
“Um diferencial importante do Eu-Cidadão é o nível de qualificação do corpo técnico-profissional, formado por voluntários da parceira SAP Latin America e por estagiários da Unisinos”, conta o assistente social Paulo Ricardo de Oliveira Dias, coordenador do projeto. A SAP é responsável pela transferência de tecnologia e pelos recursos humanos do projeto.
Segundo Dias, o voluntariado é um ponto de destaque: “Temos mais de 40 voluntários inscritos em nossos bancos de dados, e outros 20 colaboradores da SAP”. Além do coordenador, o projeto tem um assistente administrativo e três estagiários. Os computadores do Eu-Cidadão também podem ser usados para a elaboração de trabalhos de conclusão de curso, para trabalho voluntário e para o voluntariado acadêmico.
Os custos de manutenção das máquinas e do espaço são bancados pela Associação Antônio Vieira, mantenedora da Unisinos. Em 2011, entre recursos humanos, espaço físico, materiais e serviços, o desembolso da Associação foi de pouco mais de R$ 44 mil. No período, foram atendidas 217 pessoas, a maioria (79%) de trabalhadores (empregados e desempregados) em busca de aperfeiçoamento profissional; crianças e adolescentes formavam o grupo restante.
Esse público passou por 30 horas de capacitação, com oficinas realizadas uma vez por semana, em três turnos. As aulas foram de informática básica em Windows, Word, Excel, internet, CorelDraw e Photoshop. Também em 2011, o projeto foi ampliado, estendendo-se ao laboratório do CCIAS, localizado no centro de São Leopoldo.
Pelas parcerias firmadas com a SAP e com o distribuidor Luk & Luk, o Eu-Cidadão promoveu oficinas em várias instituições, entre as quais, o Centro de Atendimento Socioeducativo em Semiliberdade, o Programa Esporte Integral, a Casa de Acolhimento Lar São Francisco, a Comunidade Terapêutica Zé Maria, o Centro de Referência em Assistência Social da Região Centro, escolas municipais, o Sindicato dos Pensionistas. As turmas são formadas de acordo com a procura, após divulgação na rede socioassistencial do município.
No futuro, a intenção é oferecer mais. Já está em estudo a criação de um telecentro, no qual a comunidade poderá acessar a internet gratuitamente. O espaço terá monitor em tempo integral. Botar esta ideia em pé depende de novas parcerias e investimentos. Por enquanto, apenas a SAP manifestou interesse, mas outras devem se juntar à empreitada. “O telecentro deve sair em 2013”, anima-se o coordenador.