23/08/2011
Do blog Notas Soltas
Os quatro amigos e familiares que acompanham este blog e este blogueiro/jornalista/pesquisador/consultor aqui sabem da importância que damos ao PLC 41/2010, o projeto de lei de acesso a informações públicas.
Leis de Acesso a Informações Públicas são, na prática (nos países onde se conseguiu redigir e implementar boas leis, ressalte-se), um dos garantidores da transparência governamental. E a transparência é fundamental para que os governos funcionem melhor.
Pois bem, o PLC 41 está no Senado. Depois de passar por 3 comissões, o texto empacou na Comissão de Relações Exteriores, cujo presidente, Fernando Collor (PTB-AL), avocou para si a relatoria.
Pois o ex-presidente, que não cumpriu seu mandato até o fim, tendo sido expelido da Presidência em fins de 1992 sob a acusação de corrupção, acaba de apresentar seu parecer. E o resumo é o seguinte: o substitutivo de Collor esvazia completamente o PLC 41, alterando pontos cruciais do projeto.
(Abaixo, falarei algumas vezes sobre “princípios basilares de um governo aberto. Na pág 7 deste livro estão os 9 princípios)
Alterações:
1 – Collor suprimiu a expressão “independentemente de solicitações”. O ex-presidente expelido argumenta que o princípio da publicidade já está expresso na Constituição e escreve: ”(c)laro que essas informações têm que ser solicitadas sob pena de se fazer com que a Administração venha a despender grandes recursos materiais, pessoais e temporais na divulgação de todas as informações que possam ser consideradas de interesse público”.
O ex-presidente esquece-se de que o PLC 41 serve EXATAMENTE para regulamentar o princípio da publicidade dos atos da administração pública. Com essa alteração, o projeto de lei DESTRÓI um dos princípios basilares das boas leis de acesso: o princípio da Obrigação de Publicar
2 – O ex-presidente suprimiu 3 parágrafos do art 7º que visam a garantia a veracidade dos dados e a evitar a manipulação de informãções por parte dos governantes. Ele argumenta que o assunto deve ser objeto de norma infralegal.
São estes os parágrafos que o ex-presidente quer suprimir (coloco também o caput, para melhor compreensão):
Art. 7º O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
(…)
IV – informação primária, íntegra, autêntica e atualizada;
V – informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços;
VI – informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos
Aparentemente, o ex-presidente quer deixar espaço para que os governantes possam definir enquadramentos para as informações. Fica claro que Collor não quer que a sociedade tenha acesso a informações primárias, que poderão confrontar propagandas governamentais enganosas. Aqui, o ex-presidente atinge outro princípio basilar de um governo aberto: a Divulgação Máxima
3 – O ex-presidente retirou a obrigação de se publicar na Internet
“Assim, buscamos aperfeiçoar o art. 8º, § 2º, do Projeto (…), retirando a obrigatoriedade de divulgação de informações na rede mundial de computadores (internet), transformado-a em possibilidade”
Outra vez, um atentado à divulgação máxima e à obrigação de publicar
4 – O ex-presidente suprimiu uma das inovações mais interessantes do PLC 41: a publicação de informações em formato eletrônico aberto, legível por máquinas.
5 – O ex-presidente alterou o conceito de “informação”
“Buscamos resgatar o conceito original de informação (art. 4º, I) que no âmbito da literatura das atividades de inteligência constitui um dado trabalhado, um produto final, para o qual não cabe qualquer suposição quanto ao seu processamento – retiramos, assim, a associação de informação a dados não processados”
Isso tem relação com a alteração que comentei no tópico 2
6 – O senador Collor também suprimiu o termo “controle social”
“Ali suprimimos o inciso V, uma vez que não há clareza no significado do ‘desenvolvimento do controle social da Administração Pública’. O que viria a ser esse controle? Como ele é exercido?”
Eis o inciso V do art 3º do PLC 41 (com o caput):
Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei se destinam a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:
(…)
V – desenvolvimento do controle social da administração pública.
7 – O ex-presidente também retirou a obrigação negativa dos governos sobre a exigência de motivação para pedidos de informação. Traduzindo: pelo PLC 41, qualquer pessoa pode pedir informações governamentais sem a necessidade de apresentar justificativa.
As melhores leis de acesso preveem essa garantia. Afinal, as informações que estão na mão dos governos pertencem a todos os cidadãos, que pagam os impostos que, por sua vez, financiam a Administração Pública. Portanto, os verdadeiros detentores das informações somos todos nós. Não precisamos justificar a razão para pedir uma informação que é nossa.
“Quanto ao art. 10 (…), suprimimos o § 3º, que veda “quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público”. Ora, todo ato deve ser motivado, inclusive para que se dê garantia à Administração de que esta não despenderá recursos públicos para atender a um pedido sem fundamentação. “
Aqui, o ex-presidente ataca outro princípio de um governo aberto: os custos para o acesso
Há outras alterações. Mas paro por aqui. Isso já é o bastante para descaracterizar completamente o espírito da proposta.
Lembrando que mais de 90 países já têm uma Lei Geral de Acesso a Informação Pública. O Brasil é uma das poucas democracias ocidentais a prescindir de uma legislaçao desse tipo.
E se depender do ex-presidente Collor, a Administração Pública brasileira continuará sendo um objeto opaco.
{jcomments on}