Falta de carta magna mundial ameaça a internet global, diz Tim Berners-Lee

24/04 - Segundo criador da web, espionagem em massa da agência de segurança nacional dos EUA contribuiu para aumentar engajamento político em torno dos direitos humanos na internet.

 

Da redação, com Arena

24/04/2014 – A mesa “#WEB25 e uma carta global para a internet”, encerrou os debates no segundo dia de #ArenaNETmundial. Composta por Frank La Rue, relator especial da ONU para o direito à liberdade de expressão e opinião, Tim Berners-Lee, o inventor da World Wide Web, Demi Getschko, o “pai da internet no Brasil”, Gilberto Gil e o deputado federal Alessandro Molon, que assumiu a relatoria do Marco Civil da Internet na Câmara, debateu os 25 anos de existência da web.

La Rue ressaltou o papel da rede como um recurso essencial à liberdade de expressão. “A internet não pode ser um privilégio de uma minoria, pois isso acentuaria a fratura entre os ricos e pobres. Todos os direitos que reconhecemos offline devem valer online”, declarou. Ele defendeu foco na universalização do acesso ao conteúdo, sem censura e limitação, à infraestrutura, à conexão.

Ele indicou três tópicos que mais lhe chamaram a atenção no Brasil. Primeiro, o Comitê Gestor da Internet, cuja estrutura multiparcerias é um modelo de inclusão e democracia. Segundo, o movimento da sociedade em torno do Marco Civil. Finalmente, o discurso da Dilma no plenário da ONU. “Dilma levou os princípios de governança da internet do CGI.br e apresentou algo muito simples: que a internet deveria ter um foco em direitos humanos. Disso decorria a necessidade de se garantir a universalidade. Garantir a universalidade significava garantir a diversidade cultural. E para isso precisaríamos garantir a neutralidade. A rede não pode ser feita em função de quaisquer interesses de grupos econômicos ou de países. Ela tem que ser para uso de toda a humanidade”, falou.

Tim Berners-Lee comentou os riscos que a falta de uma Carta Magna traz para a internet. Ele se declarou impressionado, pois sempre achou que seria difícil ter tantos políticos interessados na internet. Mas, efetivamente, o caso de espionagem global da NSA acabou demonstrando que os perigos são reais.

“O perigo é não termos um conjunto de princípios fortes, que garantam que a Internet seja como deve ser. O Brasil iniciou esse processo, mas vai ser muito mais difícil ter essa conversa em outros países”, avaliou Tim. “O que é específico da internet brasileira no Marco Civil? O que é universal? Então poderemos levar essa discussão internacionalmente. Eu vejo a Internet como uma coisa não-nacional”, ressaltou.

O mediador da conversa, Ricardo Poppi, coordenador-geral de novas mídias e outras linguagens de participação da Secretaria-Geral da Presidência da República lançou então a pergunta a Gilberto Gil: “você foi considerado um visionário ao defender a Internet e a cultura digital dentro do governo brasileiro. O que tem a dizer sobre isso?”

“Eu talvez tenha sido um visionário”, refletiu Gil, “não por saber tudo sobre a Internet, mas porque, como poucos, eu admitia que não entendia nada! Então tive que buscar, com toda generosidade, esse conhecimento. E trouxe para dentro do governo essas questões, esse debate”, reconheceu Gil. “E tudo isso começou lá atrás, com o governo Lula, que estimulou o surgimento de um Marco Civil”.

Alessandro Molon destacou o papel dos membros da mesa na construção do Marco Civil. Tim Berners-Lee, por exemplo, acompanhou de perto todo o processo e deu declarações fundamentais em momentos importantes, manifestando o seu apoio à lei e mostrando a todos o quanto ela colocava o Brasil na vanguarda do movimento por uma Internet livre.

Sobre Gil, Molon recordou que ele foi o grande incentivador da cultura digital no governo federal, e que, para a elaboração do texto da lei, o Ministério da Justiça utilizou uma plataforma de colaboração desenvolvida pelo Ministério da Cultura. Já Demi Getschko foi, segundo Molon, o grande professor. Como membro honorário do CGI.br, foi ele que esclareceu os congressistas quanto às muitas questões técnicas e humanísticas envolvidas no Marco Civil, permitindo que tivessem uma compreensão mais clara do seu verdadeiro significado.

Molon arrancou aplausos do público ao mencionar a necessidade de se lutar por políticas que estimulem a cultura do software livre. E finalizou dizendo que “foi um longo caminho para chegarmos até aqui, mas devemos entender o Marco Civil como um primeiro passo para a Internet que queremos”.

Getschko destacou a capacidade da Internet em se defender a si própria. Por exemplo, a censura, quando ela surge, é identificada como um problema e rapidamente a rede busca soluções para se desviar desse problema. Isso em todo caso, não nos isenta da necessidade de protegê-la contra os ataques que possam surgir, e é nesse sentido que vem o Marco Civil.

“O consenso não é a unanimidade. 80% concordam, 10% têm ressalvas, e outros 10% discordam, mas acham que não vão morrer se aquela decisão for tomada dessa forma. Então o consenso é uma decisão contra a qual não há uma oposição forte demais”, disse.