08/07/2011
Do blog Hiperfície
Há uma semana, o Brasil viveu um dia que já pode ser lembrado como histórico em função do seu valor simbólico. No dia 1º de julho o Ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante Oliva, se reuniu com um grupo de hackers e ouviu diversas propostas e pedidos para que o governo reconheça e se valha efetivamente do potencial de desenvolvimento que a tecnologia oferece.
O encontro foi articulado pelo pessoal da Transparência Hacker e ocorreu durante o 12º Fórum Internacional de Software Livre, na cidade de Porto Alegre. Após dar uma palestra (e atravessar um mar de jornalistas), o ministro se encontrou (a portas fechadas) com um grande grupo de pessoas que lutam pelo software livre e adota a liberdade e a colaboração como filosofia base para a tecnologia, entre os quais os já famosos Sérgio Amadeu, Alexandre Oliva e Nelson Pretto.
E justamente o mais importante foi que todo mundo pode falar, e não apenas os líderes já conhecidos. A comunidade hacker pode não apenas ser ouvida, ou ouvir o ministro, mas dialogar de forma bastante franca com um integrante do primeiro escalão do governo federal. Essa aproximação fez lembrar o reconhecimento da cultura digital como parte da cultura brasileira, promovido pelo Ministério da Cultura a partir da gestão de Gilberto Gil e agora ameaçado pela Ministra Ana de Hollanda. E por isso temos um momento histórico.
O Ministério da Ciência e Tecnologia tem condições de alavancar o Brasil para além da riqueza, de fomentar o desenvolvimento do conhecimento que catapulte o país para outro patamar no qual a quantidade de dinheiro produzida seja bem menos relevante que a qualidade de vida das pessoas, e que elas possam contar com uma ecologia de saberes a seu favor, e não apenas o pensamento metológico científico universitário.
Essa “monocultura” do conhecimento pela ciência desperdiça a riqueza do saber tradicional, tanto quanto a “monocultura” da indústria musical desperdiça as manifestações culturais espontâneas da sociedade. Em ambas a busca pelo lucro desvirtua as atividades que deveriam ser mais importantes, e o que deveria ser mais valorizado é menosprezado.
O ministro que declarou entender a diferença entre hackers e crackers aceitou o convite e abriu um canal de diálogo com a comunidade hacker. É nossa oportunidade para convencer o Estado que a estrada vai além do que se vê, que há saber também fora dos muros da educação formal assim como há tecnologia fora do mercado, tudo retomando a lição de que a cultura não se limita ao que é industrializado.
Por tudo considero muito importante que a conversa que ali ocorreu extrapole aquele momento, aquele lugar, aquelas pessoas, e faça parte do contexto nacional das ciências e tecnologia. Por isso fiz questão de registrar em vídeo o máximo do que foi falado, para que qualquer pessoas possa cobrar coerência do ministro e exigir que os compromissos ali assumidos sejam entendidos como deveres a serem cumpridos. A publicização desse evento intensifica o seu significado, por que amplia seu alcance no tempo (para além daquele 1º de julho) e no espaço (para além daquela sala fechada).
Ver os vídeos, ouvir o áudio, participar da elaboração da carta ao ministro: são caminhos para ajudar o Brasil a reconhecer institucionalmente o que ele já produz de bom e direcionar melhor os gastos públicos para que o país possa se desenvolver de verdade, e não apenas crescer seguindo os modelos que não deram tão certo assim em outros países.
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