Microsoft mostra, mas não abre.

A empresa anunciou que vai publicar os  códigos de alguns produtos em seu site. Mas não abre mão das licenças de patentes.


A empresa anunciou que vai publicar os  códigos de alguns produtos em seu site. Mas não abre mão das licenças de patentes. 
Verônica Couto


O anúncio feito pela Microsoft, dia 21 de fevereiro, de que vai publicar no seu site os protocolos de comunicação e as interfaces de desenvolvimento de aplicações (APIs) de alguns de seus programas mais populares, não configura uma adesão ao mundo do software livre nem exatamente uma mudança de rumo. Basicamente, porque a empresa não abriu mão do modelo de patente para os produtos, que continua na base da sua estratégia. Ao contrário, quer fortalecer essas patentes, induzindo e facilitando seu licenciamento.

“Essa promessa da Microsoft de se abrir existe há dez anos. Quero ver as licenças. Se não tem licença nova, não há nada de novo, não há efeito prático”, diz o professor Pedro Rezende, da UnB, autor do artigo “Eucaristia Digital”, em que já criticava iniciativas open source anteriores da empresa.

Por estarem protegidos por licenças de patentes, os códigos publicados pela Microsoft não poderão ser usados, por exemplo, em programas que pretendam ser distribuídos sob a licença GPL, de software livre. A GPL não admite nenhum componente no software que não dê ao usuário liberdade para executá-lo, estudá-lo, redistribuí-lo e aperfeiçoá-lo. Ou seja, veto total ao recurso da patente.

“A Microsoft vai indicar no seu web site quais protocolos são cobertos por patentes e vai licenciar todas essas patentes em termos razoáveis e não-discriminatórios, a baixas taxas”, diz o anúncio da empresa. Serão publicadas mais de 30 mil páginas de documentação para Windows, que já estavam disponíveis mediante licenças especiais, além de protocolos de outros sistemas, como o Office 2007, programados para os próximos meses. O anúncio destaca, ainda, que a empresa está providenciando uma “promessa de não processar desenvolvedores de códigos abertos que distribuam esses protocolos em implementações não-comerciais”.

Para Alexandre Oliva, da Free Software Foundation Latin-America e desenvolvedor da Red Hat, a publicação dos protocolos e APIs “é uma isca, uma armadilha”. Porque, ao ter acesso aos códigos, o programador poderá ser “contaminado pela informação” e comprometer o futuro do seu sistema. Ele admite que, por comodismo,  muita gente poderá aceitar pagar pelo uso dessa informação, ou incorporar uma patente licenciada (eventualmente oferecida sem custo) ao seu produto, tornando-o, assim, proprietário. O anúncio da Microsoft envolve os produtos Windows Vista (e .Net), Windows Server 2008, SQL Server 2008, Office 2007, Exchange Server 2007 e Office SharePoint Server 2007.

Razões de peso

A Microsoft divulgou sua intenção de publicar códigos para facilitar a interoperabilidade de seus produtos no dia 21 de fevereiro, ou seja, três dias antes do início da reunião da ISO (Organização Internacional de Padronização) – entre os dias 25 e 29 —, que iria julgar o formato de documento OOXML, defendido pela empresa.

Para o pesquisador Sérgio Amadeu da Silveira, foi ação de marketing para impressionar os países participantes da reunião. O OOXML concorre com o padrão aberto ODF, e já havia sido rejeitado em primeira instância, em 2007. E por que é importante aprovar o OOXML na ISO? Porque, entre outras razões, uma lei do governo japonês deu preferência a produtos com certificação internacional.

Haveriam, ainda, outros motivos para o anúncio. Por exemplo, satisfazer a CFI (Corte Européia de Primeira Instância), que condenou a empresa por práticas monopolistas, em setembro do ano passado. O anúncio diz que as medidas são um “passo importante” para atender as obrigações estabelecidas no julgamento. Mas, para a Comissão Européia, segundo a agência de notícias Reuters, elas ainda não solucionam as alegações contra a empresa.

A Microsoft também está sendo processada pela Opera, da Noruega. Nesse caso, por não seguir as especificações da W3C — entidade internacional que normatiza os padrões usados na web — nos seus formatos de hipertexto. A empresa acusa a Microsoft de quebrar cerca de 30 regras do W3C no seu navegador internet.


www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/eucaristia.html
– Artigo do prof. Pedro Rezende, de 2004.

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