Congresso reúne especialistas para discutir a Educação e o papel do professor em tempos de cibercultura.
Leandro Quintanilha e Verônica Couto
A renovação da escola passa pelo casamento da Pedagogia com a Teoria da Comunicação
O apresentador do telejornal da noite, o político fazendo discurso no
comício, o professor dando aula. Todos têm algo em comum: o modelo de
comunicação, em que um fala, e muitos escutam. E é esse modelo, ou
paradigma, há décadas utilizado pela sociedade para transmitir
informação, que promete estar chegando ao fim, segundo os educadores
presentes ao III Congresso Íbero-americano EducaRede: Educação,
Internet e Oportunidades, promovido pela Fundação Telefônica, no final
de maio. No seu lugar, o que se espera são novas formas de produzir
conhecimento em conjunto com os alunos, baseadas na dialógica ou na
interatividade, surgidas a partir do uso de interfaces digitais –
computadores conectados à internet, comunidades virtuais, games, blogs, flogs e videoblogs, fóruns, sites colaborativos.
“Não é uma mudança pequena. Na internet, nos fóruns, a pessoa está
atuando, respondendo, presente em pensamento; diferente daquele aluno
que pode estar fisicamente na sala, mas pensando em outra coisa. O
ambiente do silêncio é substituído pelo do diálogo, pela comunicação
intensa”, afirmou Vani Moreira Kenski, diretora da Site Educacional,
empresa incubada no Cietec/Ipen, da USP. Os grandes inspiradores da
“nova escola” são autores como Paulo Freire ou Pierre Lévy.
E por que, agora, a escola poderia mudar? Porque só agora, diz Marco
Silva, professor da Uerj e da Unesa-Rio, a tecnologia tornou
disponíveis as interfaces para quebrar o paradigma da comunicação, e
oferecer a professores e alunos a perspectiva da autoria dos conteúdos.
“A cultura do online,
a cibercultura, vai desenvolvendo uma postura nova — fazer Skype,
Orkut, Messenger, postar suas coisas, colocar seus interesses. Cria-se
uma comunidade internacional de colaboração”. Essa demanda, na opinião
de Marco e de Vani, colocou sob pressão a pedagogia da transmissão, em
que um fala, o outro escuta. “Esses teóricos importantes da educação
sempre nos chamaram a atenção para esse problema, mas não desenvolveram
uma teoria da comunicação para dar suporte a suas propostas. Com a
cibercultura, temos uma convocatória prática. É preciso fazer o
casamento da Pedagogia com a teoria da Comunicação”, diz Marco.
Por isso, o professor da UERJ destaca que a inclusão digital do professor, deve ir além do e-mail e da declaração do IR. “Se ele aprender a lidar com blogs, chats,
fóruns, trazê-los para a sala de aula, vai potencializar sua prática
docente.” E esse processo de inclusão requer, diz ele, incentivos de
ordem salarial, de infra-estrutura e de capacitação, que incluam
oficinas práticas.
No novo modelo, há um papel fundamental reservado ao professor: “criar
a ambiência para que o conhecimento se construa”, afirma Marco. “A
contribuição mais importante da escola para a formação do cidadão é o
exercício da participação. Por que a cidadania é tão precária na nossa
sociedade? As pessoas são fechadas nos seus consumos, porque não
aprenderam, na escola, a participar. E é lá que se aprende, não há
outras instâncias. Estamos num momento bastante favorável à
revitalização da escola.”
Nesse processo de renovação, em que o ambiente do silêncio é
substituído pelo diálogo, Vani adverte que é também preciso “disciplina
e compromisso”. “Faltam valores na educação, mais importantes do que o
conteúdo. No começo de uma aula, sempre tento criar um código de ética
com os alunos. Escola aberta é acesso à informação, aonde ela estiver.
Mas são necessários valores, regras, compromissos. Como em qualquer
comunidade”. Essa formação de valores, explica a educadora, envolve,
inclusive, “a análise crítica do que os jovens vivenciam na internet”.
Para a diretora da Fundación para el Desarrollo de los Estudos
Cognitivos da Argentina, María Irma Marabotto, que participou da
reforma da educação pública argentina em 95, o professor deve
desenvolver uma mediação equilibrada entre a tecnologia e a didática.
“Com a hiperinformação, vivemos hoje uma profunda crise de
significado”.
A ênfase no reconhecimento de saberes não-formais e na participação dos
alunos é a base do que o professor Marco chama de “a pedagogia do
Parangolé”. Os parangolés são capas labirínticas, em camadas, criadas,
na década de 60, pelo artista plástico Hélio Oiticica. A idéia era
questionar o quadro estático, o suporte tradicional – e o modelo da
apresentação. “O parangolé não é para você contemplar. É para você
completar’, declarava Oiticica. “Esse é o princípio da Pedagogia do
Parangolé”, resume Marco.
O professor Fernando Moraes Fonseca Júnior, coordenador do Laboratório
de Tecnologias na Educação da Fundação Vanzolini e responsável técnico
do EducaRede Brasil, acredita que a forma mais produtiva de trabalhar
as interfaces digitais em sala é a organização por projetos, que
estruturam, de alguma forma, a construção do conhecimento. “Com a
internet, abre-se uma porta, pela qual entra grande quantidade de luz;
sem óculos adequados, ficamos cegos.”
A Fundação Telefônica lançou, durante o III Congresso Íbero-americano
EducaRede, a “Coleção Educarede: Internet na Escola”, que sintetiza os
cinco anos do projeto no Brasil. Cada um dos cinco volumes aborda um
tema: “Inclusão digital na escola”; “Ensinar com internet: como
enfrentar o desafio”; “Sala de informática: uma experiência
pedagógica”; “Letras e teclado: oficina de textos na web”; “Comunidades
virtuais: aprendizagem em rede”. O evento reuniu 1,5 mil participantes,
em São Paulo. Para o presidente da Fundação, Sergio Mindlin, o mais
relevante, no balanço, foi a presença dos professores, “que ficaram
dois dias tão dedicados, discutindo uma questão que é tão
importante: como as novas tecnologias podem ser aplicadas de forma
pedagógica e como transformar essa escola em uma escola nova”.
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www.vanzolini.org.br
www.paulofreire.org.br
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_L%C3%A9vy Ou entre em http://pt.wikipedia.org, escolha o idioma português e busque Pierre Lévy.