Professores apostam no potencial
pedagógico dos blogs, como incentivadores do hábito de escrever – com
correção e com conhecimento do tema – além de estimular o debate e
desenvolver o senso crítico. O edublogs proliferam no país, em diversos
níveis de ensino e em todas as camadas sociais.
Leandro Quintanilha
Em Blogsfera M@rli, professora,
reúne os links de sete edublogs
que mantém com alunos.
Os blogs surgiram nos anos 90 como um ícone da liberdade de
expressão na internet. Hoje, essas páginas de livre publicação contam
com cerca de 48 milhões de adeptos – e ainda mais prestígio. É que,
além de serem fáceis de usar e democráticos por natureza, os blogs se
revelam, agora, promissores aliados virtuais dos professores. Na era da
inclusão digital, os edublogs representam uma espécie de vanguarda
teórico-pedagógica, adaptável a qualquer disciplina, nos diversos
níveis de ensino, em todas as camadas sociais.
Para a acadêmica Zilá Moura e Silva, doutora em didática pela USP, o
fenômeno tem feito com que alunos e professores escrevam mais e melhor.
“As propostas tradicionais de escrita na escola são muito artificiais.
Em geral, as pessoas têm dificuldade em discorrer de forma mais
aprofundada sobre um tema”, avalia. Isso ocorre, segundo Zilá, porque
os alunos não são estimulados a escrever com envolvimento. Com a
possibilidade de publicação, o entusiasmo e o empenho são maiores. E a
prática gera uma familiaridade progressiva com a escrita: quanto mais
se produz, mais se deseja fazê-lo. “Autoria gera auto-estima”, observa.
A professora de Língua Portuguesa Marli Fiorentin concorda: “Os alunos
ficam entusiasmados ao perceber que suas idéias têm valor”. Ela dá
aulas para o ensino fundamental na Escola Estadual Padre Colbachini, em
Nova Bassano, cidade com cerca de 10 mil habitantes no interior do Rio
Grande do Sul. Só descobriu a blogosfera no começo do ano passado e já
mantém sete edublogs. “Com as páginas na internet, os alunos ficam mais
motivados a ler e escrever”, constata.
Blog Contos da Escola, estudantes
de Letras coloca a educação em
debate. O cuidado com o texto também é maior. “Em relação à forma e ao
conteúdo”, afirma Raquel da Cunha Recuero, professora dos cursos de
Comunicação da Universidade Católica de Pelotas e doutoranda em
Informação e Comunicação. Para ela, esses espaços-autoria são um
antídoto para a chamada geração Ctrl C + Ctrl V (atalhos do teclado
usados para copiar e colar textos). “O aluno passa a apurar melhor as
informações disponíveis na internet, para construir textos de
qualidade”, observa a professora. Escrever seus próprios textos e ler a
produção dos colegas são hábitos, afirma, que geram um ciclo positivo.
“Ao tentar se superar, eles aprimoram o senso crítico”, diz.
A vida como ela é
Os edublogs favorecem o trabalho em equipe e a construção colaborativa
do conhecimento, afirma Sônia Bertocchi, pesquisadora do Centro de
Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, de São
Paulo, e coordenadora do Núcleo de Interatividade do portal EducaRede.
Sônia é a criadora do Lousa Digital, um blog de discussões sobre o uso
pedagógico da internet. “Procuro auxiliar o professor na sua prática
diária: indicar novos recursos, apresentar projetos bem-sucedidos e
promover a interação entre educadores geograficamente distantes, além
de divulgar eventos relacionados”, descreve.
Trabalho semelhante é realizado por uma professora em formação, a
redatora e estudante de licenciatura em Letras Débora Batello, criadora
do Contos da Escola. “Educação não é só lousa e gis. O professor tem
que encontrar meios para estimular os alunos”, afirma. O público-alvo
de seu blog são professores e aspirantes à carreira. Os temas propostos
vão além da relação entre educação e tecnologia. Polêmicas como
sistemas alternativos de avaliação e a política de cotas para negros e
estudantes de escolas públicas nas universidades são alguns dos
assuntos abordados. Nos comentários, os leitores desenvolvem o debate.
A professora Marli, de Nova Bassano, criou seu primeiro blog pedagógico
no ano passado, para uma turma de 8ª série: Vidas Secas – Da ficção à
realidade, inspirado na célebre obra de Graciliano Ramos. “A idéia
surgiu porque estávamos sofrendo com uma estiagem muito longa, aqui na
região, que nos afetou financeira e emocionalmente”, conta ela. Os
alunos analisaram o livro e pesquisaram sobre o contexto histórico em
que foi escrito.
No edublog Pedagogia na Rede,
professor compartilha experiências
da vida escolar.Na seqüência, Marli convidou alguns escritores profissionais para
colaborar com o edublog, como o mineiro Wellington Pino e os gaúchos
Caio Riter e Marcelo Spalding. Em um ano, a professora criou mais seis
edublogs. E um sétimo, o Blogosfera M@rli, reúne todos os links. Vários
do alunos mantêm, hoje, blogs pessoais.
O trabalho da professora Zilá com meios de publicação na internet
começou há dez anos – antes da “febre” dos blogs. Na Unesp de Bauru,
ela participou da criação do site Universidade Sem Fronteiras, que não
era exatamente um blog, mas reproduzia o conceito de autoria-publicação
ao colocar na rede os trabalhos de conclusão de curso (os TCCs).
Era só o começo. No correr dos anos, Zilá começou a adotar blogs
propriamente ditos no curso de formação de professores da Faculdade
Sumaré, em São Paulo, e no de gestores escolares da Uirapuru Superior,
de Sorocaba. “Comecei com provocações”, lembra. Ela criava um blog para
a turma no qual propunha problemas a resolver e discussões sobre
assuntos polêmicos. Deu certo. Com o tempo, os educadores passaram a
criar seus próprios diários virtuais, repassando o gosto da publicação
para seus alunos. Tal como aconteceu com Marli.
A palavra weblog é uma junção dos vocábulos do inglês web
(originalmente, teia; mas hoje também com a acepção de página da
internet) com log (diário de bordo). Tradução literal: diário na rede.
O blogs, como são hoje chamados, surgiram na década de 90 e,
atualmente, o número de adeptos aumenta num ritmo avassalador. O site
Technorati, que mantém sistema de busca específico para blogs, estima
haver cerca de 48 milhões dessas páginas em funcionamento. Mas, no
momento em que você lê esta reportagem, esse número já deve estar
defasado – a cada dia, são criados mais de 75 mil novos blogs, segundo
o instituto de pesquisa em tecnologia norte-americano Pew Internet.
Cerca de 11% dos usuários de internet do mundo são leitores habituais
de blogs. Estima-se que sejam publicados 1,2 milhão de novos textos,
por dia, o que equivale a 50 mil atualizações por hora.
www.pewinternet.org – Pew Internet
www.technirati.com – Technirati
Modelos e possibilidades
Os edublogs são páginas de publicação mantidas por teóricos da educação
e/ou professores, com ou sem a participação de alunos. Os temas variam
de teorias da educação, políticas públicas na área a assuntos
relacionados a disciplinas específicas. O professor pode usar a
plataforma para propor gincanas, debates, pesquisas, exercícios e
experimentos para os alunos. Mas há vários outros tipos de blog, com
fins artísticos, informativos ou de entretenimento, que podem servir de
inspiração e referência para os educacionais. Eis alguns:
Diários – O tema é a vida pessoal do autor, que relata fatos cotidianos.
Opinativos – Textos argumentativos que expressam a opinião
do(s) autor(es). O blog pode ter um tema central ou tratar de
generalidades. Alguns jornalistas mantêm páginas de publicação desse
modelo na rede.
Literários – Pode ser um espaço para a publicação de contos, crônicas, poesias e até romances, em capítulos, de autoria do criador.
Clippings – Apanhado de links e/ou recortes de outras publicações online.
De guerra – Relatos sobre a vida em países em situação de conflito.
Mistos – Misturam textos pessoais e informativos. Em geral,
combinam relatos pessoais e comentários do autor sobre notícias que
circulam na mídia.
(Baseado em artigo da acadêmica Raquel da Cunha Recuero)
Responsabilidade editorial
Pedagoga, advogada, especialista em Direito Digital e membro da
Comissão de Apoio ao Advogado Professor da OAB-SP, Cristina Moraes
Sleiman está envolvida na criação de uma política de educação digital
dirigida aos professores do Senac de São Paulo. Favorável ao uso
responsável de blogs na educação, ela alerta sobre cuidados importantes
a serem tomados na rede, como o respeito aos direitos autorais, quando
se tratar de material que não é de uso livre, e de imagem.
ARede –
Cristina – Toda obra artística, científica ou literária conta
com a proteção da Lei de Direitos Autorais. O fato de uma obra estar na
internet não quer dizer que esteja disponível para cópia. Deve-se
verificar a existência de algum tipo de licença de uso. Na ausência
dessa informação, deve-se entrar em contato com o autor e guardar o
e-mail com a autorização. Em relação às fotos, há de se preocupar,
ainda, com os direitos de imagem das pessoas envolvidas.
ARede –
Cristina – A Constituição Federal protege a honra, a vida
privada e a imagem das pessoas. Em caso de violação, a vítima pode
solicitar direito de resposta e indenização. O autor da publicação
ainda corre o risco de responder, penalmente, por calunia, injúria e
difamação. Muitos jovens fazem comentários depreciativos sobre colegas
e professores em blogs. Se forem menores de idade, a responsabilidade
pode recair sobre os pais.
ARede –
Cristina – Como se trata de uma ferramenta de apoio pedagógico,
não vejo necessidade. Em todo caso, seria conveniente que a escola
acrescentasse uma cláusula no contrato de matrícula sobre a utilização
de tais recursos.
ARede –
Cristina – Esse é um ponto crucial, apesar de poucos atentaram
para a questão. Devo lembrar que existe a questão da marca, nome da
empresa. Se ocorre um incidente envolvendo essa marca, a empresa pode
ser responsabilizada. Meu conselho é que a instituição defina, em seu
projeto pedagógico, diretrizes para utilização da ferramenta. Na
ausência dessas diretrizes, é conveniente que se tenha, ao menos,
autorização da coordenação.
ARede –
Cristina – A avaliação tem sido alvo de discussão há muito
tempo e, hoje, assume um papel muito mais abrangente. Busca-se um
processo de ensino-aprendizagem mais humanista. Cada pessoa tem seu
tempo e seu desenvolvimento. O blog, se bem trabalhado, pode ser um
grande aliado do professor. É um espaço mais descontraído, em que o
aluno se sente mais à vontade. Pode ajudar na percepção do professor
quanto ao desempenho individual de cada aluno.
ARede –
podem representar uma oportunidade para pais e professores orientarem
seus filhos/alunos sobre a importância de se comunicar com respeito e
responsabilidade?
Cristina – Sim. A internet expandiu os horizontes da
comunicação e trouxe, com ela, novas preocupações e riscos. A
conscientização para o uso responsável dos meios digitais é o melhor
meio para evitar problemas. Mas não podemos deixar que essas questões
sejam barreiras para a utilização dessa ferramenta, que, quando usada
de forma responsável, pode promover maravilhas.
Tarefa de sala
Como ocorre em toda atividade escolar, os alunos também precisam ser
orientados sobre como se comportar na rede. Eis alguns temas que devem
constar nessa conversa:
• A senha é uma identidade digital e não deve ser divulgada ou
emprestada a ninguém. Alterá-la regularmente é uma medida de segurança.
• Passar-se por outra pessoa é crime.
• Não se deve fornecer informações pessoais a quem não se conhece pessoalmente.
• Quem copia textos, imagens e trabalhos artísticos na rede pode estar violando leis de direitos autorais.
• É preciso cuidar para que imagens publicadas no blog não violem o direito de imagem dos outros.
• Espalhar fofocas, ofender ou ameaçar alguém pode causar problemas sérios e responsabilizar os pais.
• Ao publicar um texto próprio, é oportuno deixar claro se ele pode ou não ser reproduzido.
Edublogs
http://blogosferamarli.blogspot.com – Blogosfera M@rli (com os links para os outros seis edublogs criados pela professora)
http://contosdaescola.net – Contos da Escola
http://lousadigital.blogspot.com – Lousa Digital
http://matematicanasoitavas.blogspot.com – Matemática nas Oitavas
http://palavraaberta.blogspot.com – Paravra Aberta
http://pedagogianarede.blogspot.com – Pedagogia na Rede
http://sergioflima.pro.br/blog/blogs/index.php/blogefisica – Blog de Física
http://aprendendoaensinar.blogspot.com – Aprendendo a Ensinar
Provedores gratuitos
www.blogger.com.br – Blogger
www.blogspot.com.br – Blogspot
www.uol.com.br/blog – Uol Blog