Na escola

Lições para todos

Colégios particulares liberam conteúdos na internet e estimulam o compartilhamento de práticas pedagógicas

Bárbara Ablas


ARede nº73 setembro de 2011
– A tecnologia, por si só, não realiza milagres pela educação do país. Mas tecnologia aliada a conteúdo de qualidade, livre e gratuito na web, faz muita diferença. As diversas iniciativas de Recursos Educacionais Abertos (REA – ver edição 71), estão aí para comprovar. Por isso ganham força no país, atraindo o interesse de instituições de ensino públicas e privadas. Em São Paulo, por exemplo, dois dos colégios particulares mais tradicionais da capital, Dante Alighieri e Visconde de Porto Seguro, estão socializando os conteúdos didáticos produzidos por suas equipes de educadores.

Em junho, o Porto Seguro lançou o ambiente Porto OpenCourseWare (OCW), uma plataforma digital com material pedagógico disponível ao público, sob licença Creative Commons. Qualquer internauta pode ler, copiar, modificar, distribuir e adaptar os recursos educacionais produzidos pelo colégio e oferecidos de graça na rede mundial.“Nosso objetivo foi desenvolver um portal colaborativo e não apenas um banco de conteúdos”, enfatiza Renata Guimarães Pastore, diretora de Tecnologia da Educação do colégio.

O Porto OCW ainda está no início. A ideia é oferecer exercícios, planos de aulas e estudos em formato multimídia, como áudios, vídeos, imagens e animações. Também deverá haver a tradução desse material para os alemão, espanhol e inglês, línguas que já são ensinadas dentro do currículo. No momento, porém, a plataforma tem apenas três recursos educativos: dois nos níveis do ensino fundamental I e II e outro para a educação infantil. A iniciativa permitiu ao colégio se associar ao consórcio Open Course Ware (OCW), que reúne mais de 200 universidades e instituições de ensino de todo o mundo, e oferece cerca de seis mil cursos abertos para download gratuito, em 
12 idiomas. O Porto Seguro é a primeira escola de educação básica a integrar o consórcio.

A participação dos professores no Porto OCW é voluntária. A proposta não é obrigá-los a publicar conteúdos na internet. Mas a escola aproveita as oficinas de tecnologia que promove para incentivar a adesão dos docentes ao projeto. Como os materiais didáticos implicam utilização de conteúdos de autores comerciais, os professores são orientados na questão dos direitos autorais, do uso das licenças livres e da publicação de materiais em formato digital. Além disso, os autores podem recorrer ao suporte da assessoria jurídica do colégio caso tenham dúvidas sobre o que pode ser usado no material que vai para a internet. “Os termos de uso do portal estão de acordo com o que existe no mercado e respeitam a Lei de Direito Autoral”, explica Luiz Martins, coordenador do departamento jurídico do Porto Seguro.

Para o professor de biologia do ensino médio do Porto Seguro, Flávio Roberto Marini Filho, a experiência enriquece o processo de ensino e aprendizagem: “Ao ser acessado por outras pessoas, seu trabalho pode voltar modificado, e até melhorado”. Mas alguns professores ainda têm receio de liberar seu material. Marini observa que não há porque temer as licenças abertas, que permitem que o material didático seja remixado: “Na prática, já fazemos isso em sala de aula porque estamos sempre modificando e reutilizando conteúdos”.

No Porto OCW, podem ser baixados, por exemplo, o Sudoku de Literatura, uma atividade lúdica que desafia o raciocínio lógico e ajuda a aprender conceitos gramaticais. Há também a atividade Brincando com Volpi, para crianças recriarem pinturas, depois de conhecer um pouco sobre o artista. E o Bingo, que pode ser usado em diversas propostas pedagógicas de aprendizagem de letras e números.

Conteúdo multimídia
No colégio Dante Alighieri, a proposta é transformar tudo que é produzido por alunos e professores em recursos educacionais abertos, diz Valdenice Minatel Melo de Cerqueira. Ela coordena o projeto REA Dante, que foi ao ar também em junho. O projeto sistematizou um processo de colaboração que já existia, pois alguns conteúdos eram compartilhados via Youtube e redes sociais, mas ficavam restritos à comunidade escolar. Com o ambiente virtual, outras instituições de ensino podem acessar, modificar e adaptar aulas que os docentes do colégio utilizam com seus alunos. Entre os recursos disponíveis na rede, existem roteiros e oficinas voltados à produção de conteúdos multímidia e de comunicação. Há tutoriais, por exemplo, de como fazer uma propaganda e de como fazer uma reportagem.

O Dante também busca incentivar o uso de ferramentas e softwares livres. Os alunos do 6º ano, por exemplo, realizaram uma releitura do livro A ilha perdida usando a linguagem de desenvolvimento scratch, que serve para construir jogos e animações. Outro recurso disponível para baixar e reutilizarno acervo REA do colégio é uma campanha sobre antitabagismo, produzida com o Moodle, uma plataforma de aprendizagem a distância em software livre. 
Além dos professores, os grandes aliados do REA acabam sendo os estudantes, que saem na frente quando o assunto é tecnologia. “Acho que os alunos já fazem REA e nem sabem, quando trocam e compartilham informação na internet”, comenta Verônica Martins Cannatá, professora de tecnologia educacional do Dante Alighieri. Ela acredita que os professores devem estar atentos às novidades trazidas pelos mais jovens, que passam boa parte do tempo conectados e baixando aplicativos, seja via computador, celular ou iPad. “O professor de hoje, em relação à tecnologia, precisa ser um pesquisador e estar aberto para aprender com o aluno”, avalia.

www.ocw.portoseguro.org.br

www.colegiodante.com.br/rea

Aulas abertas da Unicamp

Em abril de 2011, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em parceria com o Portal Universia, colocou no ar o OpenCourseWare Unicamp, inspirado no consórcio OpenCourseWare (OCW). A plataforma hospeda aulas de cursos de graduação da Unicamp, em formato digital, e sob licença Creative Commons.

O portal foi desenvolvido pela Pró-Reitoria de Graduação e o Grupo Gestor de Tecnologias Educacionais (GGTE). São 14 disciplinas de quatro áreas de conhecimento: Biológicas, Humanas, Exatas, Tecnológicas e da terra.

Todo o material, como apostilas, animações e fotos, são livres para baixar. Só não pode ser modificado. Também não há emissão de certificados ou diplomas para quem faz o curso. Antes de ficar disponível para download, o conteúdo das aulas passa por uma análise do GGTE, para evitar que as obras infrinjam as leis de direitos autorais.

“A ideia é que o conhecimento não fique entre os muros e as paredes da universidade, mas possa chegar até a sociedade”, diz o professor José Armando Valente, coordenador do GGTE. Além disso, o objetivo é dar visibilidade à produção acadêmica de alunos e professores, que também têm, como retorno, o incentivo de aperfeiçoar seu trabalho. “É uma vitrine em que o autor tem a oportunidade de rever seu material, atualizá-lo e melhorá-lo”, ressalta Valente.

www.ocw.unicamp.br {jcomments on}