Corinto Meffe
Em 1999, a Organização Mundial do Comércio (OMC) testemunhou o poder das comunidades virtuais. A Batalha de Seattle (EUA), como ficou conhecida, foi preparada com meses de antecedência por mais de 700 ONGs e comunidades na internet. Mais de 50 mil pessoas foram às ruas, firmando a oposição da sociedade civil mundial à formação de um mercado dominado pelas corporações transnacionais. Depois de Seattle, outros movimentos tornaram-se nós de inúmeras redes virtuais A internet torna-se, hoje, uma alternativa de articulação para tais movimentos, que se apropriam das características da grande rede: comunicação multiusuários, produção colaborativa, garantia do anonimato. São características que aos poucos são incorporadas pelas organizações e movimentos sociais e transformam a sua forma de atuação. As implicações da interação do mundo presencial e virtual ainda estão longe de ser plenamente conhecidas.
Em paralelo ao avanço das comunidades virtuais, desenvolve-se um conjunto de transformações na sociedade marcadas por mudanças econômicas, políticas e sociais, como a criação de grandes blocos econômicos, a hegemonia das abordagens liberais, a economia digital e a explosão do ciberespaço. A grande rede convive com tais transformações, mas os movimentos sociais e individuais são responsáveis pela caracterização do espaço resultante. Algo como a identidade do ciberespaço.
Considera-se que as comunidades virtuais poderão contribuir de forma significativa para a prática da cidadania, dando abertura a novos modelos políticos e econômicos. Um dos desafios é como desenvolver e disseminar o uso dessas comunidades para que cumpram esse papel de forma efetiva.
As novas relações sociais estruturadas no mundo virtual evidenciam a formação de novas redes. Ao contrário da crise de representatividade dos movimentos sociais, existe uma tendência de que novas organizações e mobilizações possam ser criadas com base em outros princípios, entre eles a colaboração, a meritocracia e a participação. O melhor cenário aponta que esses valores serão regra e não exceção. Entretanto, surge um dilema referente à estrutura de formação dessas redes, verificada na análise da pesquisadora Christiana Freitas, da Universidade de Brasília (UNB), ao afirmar que “um dos grandes problemas que percebemos no comportamento do mundo presencial com relação ao mundo virtual é que os aspectos positivos do virtual chegam acompanhados dos mesmos vícios de origem das relações sociais tradicionais”.
Assim, mesmo com um cenário positivo, nada surgiu de novo depois da Batalha de Seattle, pois o que poderia se tornar um grande movimento social constante e articulado, como nunca antes se viu, aparenta se tornar um evento que beira o modismo ou algo isolado. O desafio não é trivial, pois precisamos superar o individualismo, as reuniões inócuas, o adiamento de questões prementes e substituí-los pela pró-atividade, objetividade, coletivização e colaboração nas ações.
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Corinto Meffe gerente de inovações
técnológicas da Secretária de
Logística e Tecnologia da InformaçãoPercebemos então que a Batalha de Seattle está longe de ganhar a guerra da transformação social. Infelizmente, toda essa articulação ocorre em países desenvolvidos ou em desenvolvimento, bem distantes da realidade de países periféricos. Assim, o desafio maior passa a ser o acesso à tecnologia da informação como um direito social, o combate à exclusão digital como uma bandeira de todas as organizações sociais e a reestruturação educacional, uma emergência.