10/02/2010 — No dia 08 de fevereiro o PE Body Count, site que faz a contagem dos homicídios que ocorrem em Pernambuco, estampou uma das mais tristes de milhares de histórias tristes sobre a violência no Brasil. A fotografia da matéria é de Maria Luiza Ferreira do Nascimento, catadora de lixo em Recife. Com um jaleco branco e uma rosa branca na mão, ela chora a morte de seu filho, Alcides Nascimento Lins.
Alcides tinha 22 anos e era aluno da Universidade Federal de Pernambuco. Passou no vestibular como primeiro colocado entre os alunos vindos da rede pública. Ele iria se formar em biomedicina este ano. Era motivo de orgulho para a mãe e para a Vila Luzia, comunidade do bairro da Torre. “As mães de lá ganharam um rosto para mostrar aos filhos. ‘Tá vendo aquele ali. Passou no vestibular’, diz a matéria do PE Body Count.
Alcides foi morto, com dois tiros, em frente à sua casa, na presença da mãe e de três irmãs, por pessoas que procuravam outra vítima. “Encontrei com a mãe dele, dona Maria Luiza, hoje pela manhã. Ainda estava vestida de orgulho, com o jaleco branco do filho. Faltava bem pouquinho para ela dizer ao mundo que era mãe de um biomédico. Pouquinho para dizer que não era mais uma. Contou todo o sofrimento. Disse que ainda se agarrou com os assassinos. Mas não teve jeito. Conseguiu evitar apenas o terceiro tiro. Os dois primeiros já haviam interrompido o seu maior sonho. Maria Luiza voltou a ser mais uma. Hoje é 8 de fevereiro e 386 mães choraram, apenas neste ano, a morte de um filho”.
401 mortos
Hoje, dia 10 de fevereiro, o contador de homicídios do PE Body Count está em 401 mortes. No ano passado foram mais de 4 mil. Números de guerra, mas menores do que os de 2008. No dia 5 de janeiro, o PE Body Count e a Pastoral da Saúde da Arquidiocese de Olinda e Recife plataram árvores simbolizando as 508 vidas poupadas no ano passado, em relação a 2008, no Bosque da Esperança, em Recife. A cerimônia contou com a presença do governador Eduardo Campos.
O Pe Body Count começou a funcionar em maio de 2007 e ganhou o prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos na categoria internet em 2007. “Já pintamos corpos em locais de homicídios, fincamos cruzes na praia, instalamos o primeiro contador fixo de homicídios do mundo e choramos nossos mortos com lenços, representando o mar de lágrimas. Isso se chama controle social”.
Ao contar os homicídios e dar nome e rosto às vítimas da violência, a iniciativa pretende ajudar na busca de saídas coletivas para o problema. A dor de dona Maria Luiza já não tem mais solução. Mas ainda há Haitis no Brasil, como mostra a matéria publicada no Jornal do Comércio por João Valadares, um dos organizadores do site, no dia 31 de dezembro. A teimosia dessa gente em viver tem a mesma raiz da teimosia que levou Alcides à universidade. Elas procuram soluções para a vida, para não ter que chorar os mortos.