ARede nº56, março de 2010 – A dificuldade de se encontrar profissionais capacitados na plataforma livre é um questionamento recorrente quando se propõe a utilização ou somente a experimentação de novas tecnologias. De um modo geral, as escolas, centros de treinamentos e universidades reproduzem bons técnicos/analistas de “produtos/marcas”. Formar profissionais em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) pressupõe que os educandos, de posse desse conhecimento, possam não somente operar os produtos de marcas multinacionais, mas também ter o interesse em questioná-los, propor mudanças e melhorias, criar relações entre seus conhecimentos prévios e a solução de problemas complexos do seu cotidiano. É necessário um grande movimento para que essas entidades promovam um ambiente favorável para a construção de competências, habilidades e, consequentemente, de novas tecnologias.
O desenvolvimento industrial e tecnológico trouxe uma série de consequências sociais que refletiram na situação educacional, entre elas a mudança nos “meios de produção”, com a desvalorização do capital pelos recursos naturais e força de trabalho, para uma grande valorização dos bens intangíveis, como o conhecimento.
As universidades e escolas de qualificação profissional ainda se orientam segundo uma organização e uma metodologia de ensino de décadas atrás. Se comportam como grandes centros de treinamento, para suprir as demandas técnicas do mercado. Mercado este que cada vez mais pressiona os currículos das universidades e escolas, para atender suas necessidades operacionais. Com essa nova organização, criou-se a cultura do imediatismo e do resultado rápido por parte dos educandos.
Por outro lado, algumas organizações não governamentais que se propõem a oferecer treinamentos e cursos de qualificação profissional na área de TI também replicam o que o mercado já faz há muito tempo, oferecendo treinamentos no padrão cópia e cola (taylorista-fordista), pelo qual os cursos não estimulam o pensar, o empreendedorismo e a sustentabilidade local. Essas entidades sociais sempre tiveram como missão a busca pela justiça social e pelo convívio em comunidade. Mas por que se permitem oferecer cursos contra seus próprios ideais?
Diante desse cenário, “mercado e resultado rápido”, a formação é condicionada a conhecimentos e habilidades específicas, que não modificam a atitude em relação à pesquisa. Nesse sentido, cada vez mais ferramentas com códigos pré-configurados abstraem conhecimentos e conceitos tecnológicos, criando uma sensação no educando de domínio sobre a tecnologia. No entanto, cria-se uma dependência dessas ferramentas e rotinas.
Quando a formação se apoia principalmente nessas ferramentas automatizadas, resultados de “montagens” e configuração de sistemas, as tarefas se tornam fáceis para os educandos. Pouco se cria e a prática profissional se torna refém de roteiros pré-determinados, onde o educando não é estimulado a entender os conceitos e padrões técnicos, e sua preparação não promove situações problemas. Nesse ambiente de aprendizagem, fica mais difícil para os educandos apreciarem o valor dos conceitos, da análise, a compreensão, e tomarem decisões sobre a realidade que os cerca.
Rodolfo Avelino é professor da Universidade Cidade de São Paulo,
educador da ONG Coletivo Digital e componente da organização do Congresso Internacional de Software Livre (Conisli).