Opiniåo

O que fazemos com as TICs?

Rodrigo Nejm


ARede nº73 setembro de 2011
– Sabemos que os novos dispositivos de comunicação têm sido incorporados com muita velocidade nas famílias, produzindo importantes mudanças institucionais, educacionais. Mesmo com a radical desigualdade social, nós, brasileiros, também presenciamos esse processo de incorporação massiva das TICs em diferentes estratos sociais e faixas etárias. Sabemos que as tecnologias potencializam novas relações com o saber, com a cultura, com a democracia e com o mundo, maximizando oportunidades de colaboração e inovação. Ao reconfigurar práticas sociais, as TICs também podem ampliar violências, perversões, ditaduras, crimes e violações aos Direitos Humanos. Como dispositivos, as TICs não são nem boas nem más, nem seguras nem perigosas, mas fruto do que fazemos com as ferramentas tecnológicas, como indivíduos, grupos e sociedade.

Certamente as configurações da infraestrutura, os jogos de poder na governança e as estratégias de controle  desempenham papel decisivo nas experiências dos usuários, direta ou indiretamente. Mas merece destaque a necessidade de consolidarmos referências consensuais para guiar a navegação dos milhões de atuais e futuros internautas brasileiros. Quais os referências das novas gerações para guiar suas interações, mediadas pelas TICs, quando as gerações mais velhas (pais, educadores e gestores) nem sempre oferecem referências compatíveis? Nesse cenário complexo, a SaferNet Brasil tem realizado ações educativas para promover o uso ético e responsável das TICs, especialmente da internet. Em complemento às ações de combate às violações aos direitos h umanos na internet, do canal www.denuncie.org.br, a SaferNet também se dedica à criação de recursos educacionais abertos, formação de multiplicadores e mobilizações para conscientização dos usuários.

Se a internet reconfigura as relações familiares, as escolas, as práticas políticas, a expressão das sexualidades e a cultura, nos parece vital reafirmar os direitos humanos como referências para que as inovações tecnológicas possam maximizar oportunidades e favorecer o exercício da cidadania. Consolidar a garantia dos direitos humanos não apenas pelo foco das violações, mas em sentido afirmativo de exercício de cidadania. Em especial no caso de crianças e adolescentes, não podemos considerá-los apenas alvos potenciais de crimes. Pois são, antes de tudo, sujeitos de direitos, com direito à liberdade de expressão, à cultura e à privacidade. As ações de proteção não podem ofuscar a promoção de outros direitos.

Crianças e adolescentes devem ser educados para construir sua autonomia e emancipar-se também digitalmente. Precisamos superar a noção de internet como “terra de ninguém e da impunidade absoluta”. Essa percepção alimenta processos autoritários e um vigilantismo que pode legitimar violações de direitos em nome da defesa de outros direitos. Iniciativas como a do Marco Civil da Internet no Brasil procuram consolidar consensos baseados na liberdade e nos direitos humanos para poder regulamentar a internet no país. As ações de prevenção da SaferNet Brasil, em cooperação com instituições públicas e privadas, buscam  contribuir para que possamos educar nossas crianças e adolescentes (e mesmo educadores e pais), desde o primeiro clique, para terem responsabilidades e consciência cidadã no exercício de sua liberdade ao navegar.

Rodrigo Nejm é psicólogo, diretor de Prevenção da SaferNet Brasil.       www.safernet.org.br                                                   
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