opinião

Graffiti: na periferia e na galeria

Antonio Duque de Souza Neto, o “Tota”.

ARede nº 79 – abril de 2012

Há 22 anos fiz uma escolha difícil, entre muitas atividades: o graffiti/street art, como sua principal voz. Vivo uma eterna fase de aprendizado, em pouco tempo de arte. Mas o suficiente para acompanhar de perto, em duas décadas, duas distintas gerações dessa arte.

Lembro-me da cena do graffiti dos anos 1990, ano em que o hip hop contagiava a todos jovens. Foi aí que o graffiti ganhou uma força incrível, sobretudo espaço em instituições, devido à criação de oficinas dessa arte para jovens, bem como incentivou o surgimento de grupos organizados, também chamados de crews. Criava-se um diálogo entre poder público e sociedade civil, o que mais tarde garantiria fomento e políticas públicas envolvendo a turma do graffiti e seus adeptos.

A marca do graffiti hip hop existe até hoje, pois suas letras distorcidas, quase ilegíveis, como por exemplo os Wild style, os throw-up, bem como os pieces e os personagens-bonecos seduzem até o presente momento, talvez por se tratar de desenhos feitos sem muitas regras, mas com muita dedicação.

Mas chegando ao final dos anos 1990, depois de uma década de politização, mobilização em oficinas, os artistas de plantão queriam mais. Foi então que muitos writers (escritores de graffiti) voltaram a estudar e a se interessar por mais conhecimento. Uns passaram a prestar vestibular e estudar em faculdades de arte. Surge um novo estilo de graffiti, não mais com exclusiva influência do hip hop, mas agora com uma pitada de artes plásticas, ou melhor, pintura acadêmica. As letras distorcidas, em partes, passaram a dividir lugar com pinturas abstratas e escorridas. Foi isso que garantiu o uso de novos temas. O graffiti não mais falou só de causas sociais, mas também de temas lúdicos, psicodélicos, surreais etc.
Inicialmente, essas duas classes do graffiti – o hip hop/rua e a acadêmica – viviam em conflito, pois quem era do hip hop não via agregar nada com a influência da academia na rua porque dizia que o graffiti veio e devia ficar só na rua, e não ir beber em fonte de escolas. Por outro lado, quem foi para a faculdade não via prosperar nada que vinha da parte do hip hop. Foi muito boa essa divergência, pois um acabou por completar o outro. O pessoal do hip hop apresentou, para quem vinha da academia, a rua, os perigos, a atitude de bater de frente contra a oposição. E a academia os ensinou a defender seus interesses com mais argumentos e tranquilidade e as diversas forma de fazer parcerias com pessoas de outras classes sociais: não mais só de periferia para periferia…

Atualmente o graffiti, depois de muitas experiências, consegue aproveitar muito bem essas vivências, pois muitos artistas do hip hop, hoje, atuam não só nas periferias, mas em galerias, viajam o mundo e a cada dia exploram  meios de comunicação inimagináveis. Da mesma forma, os formados por academias a cada dia se aproximam de uma realidade nunca vista, que os fazem aproveitar e valorizar o ser humano como se não houvesse o amanhã.

O graffiti ganhou espaço e, com isso, a grande batalha: o que deve permanecer é o coletivo e não o individual.

Tota é arte-educador, grafiteiro e artista plástico.

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