06/03/2012 – Organizações da sociedade civil que defendem a democratização da comunicação no Brasil divulgaram hoje (dia 6) suas propostas conjuntas nas consultas públicas promovidas pela Agência Nacional do Cinema (Ancine) para a regulamentação da lei 12.485, que estabelece novas regras para o setor de TV por assinatura.
No documento, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e o coletivo Intervozes enfatizam a importância do papel regulador da Agência, contrapondo-se à “Declaração dos direitos dos cineastas”, publicada recentemente por um pequeno grupo de diretores de cinema. O manifesto afirma que a Ancine não deveria misturar as atribuições de normatização, fomento e fiscalização.
Um dos temas centrais tratado pelas organizações nas consultas públicas da Ancine é a possibilidade de dispensa das cotas de produções brasileiras independentes na programação das TVs por assinatura. Na lei 12.485, tal dispensa está prevista “em caso de comprovada impossibilidade de cumprimento integral”. O temor das entidades é que a cota não seja cumprida em virtude da inadequação ao perfil da programação do canal. Por isso, propõem a retirada desse critério e a inclusão de outros que procuram restringir as possibilidades de dispensa.
Leia abaixo as propostas das organizações:
CONTRIBUIÇÕES APRESENTADAS EM CONJUNTO POR BARÃO DE ITARARÉ, INTERVOZES, CUT E IDEC ÀS CONSULTAS PÚBLICAS DA ANCINE SOBRE A LEI 12.485, APOIADAS POR ARPUB, FITERT E SINDICATO DOS RADIALISTAS SP
Propostas de modificação para instrução normativa que regulamenta a Lei 12.485
Art. 24
Sugestão: No cumprimento das obrigações previstas nesta Seção, a programadora deverá observar o que segue:
I – a partir de 13 de setembro de 2015, pelo menos a metade dos conteúdos audiovisuais BRASILEIROS E METADE DOS CONTEÚDOS PRODUZIDOS POR PRODUTORA BRASILEIRA INDEPENDENTE devem ter sido produzidas nos 7 (sete) anos anteriores à sua veiculação;
Justificativa: O detalhamento para precisar quais são as obrigações das programadoras no cumprimento das cotas de conteúdo brasileiro produzido por produtora independente é indispensável para que os princípios fundamentais que regem esta regulamentação – consignadas no Artº 2º incisos I, II, IV e V sejam respeitados. Da maneira como está redigido no Inciso I deste artigo, pode haver a interpretação de que o cumprimento das obrigações seja relativo ao total das 3h30 (três horas e trinta minutos) de programação semanal e não a cada porção que compõe este tempo, qual seja: 105 minutos para conteúdo brasileiro e 105 minutos para conteúdo brasileiro produzido por produtora independente.
Art. 26
Sugestão: Manutenção, como estão, dos incisos V e VI e do parágrafo 3°
Justificativa: Julgamos fundamental reiterar esse dispositivo previsto na regulamentação da Ancine, por considerar que ele está em estreita consonância com os princípios fundamentais que orientam a Lei 12.485 em seu artigo 3º incisos I e II. A promoção da diversidade de fontes de informação é iniciativa das mais relevantes para uma sociedade democrática. Tratando-se de atividade econômica que determina em grande medida os recortes editoriais de acordo com a orientação dos grupos que detém a propriedade do canal jornalístico, garantir que o assinante tenha opção de acesso à informação diversa – em canal programado por programadoras que não detenham relações de coligação e controle entre si –, é indispensável para a execução dos princípios consignados na lei.
Art. 33
Sugestão: modificação de texto – Em caso de comprovada impossibilidade de cumprimento integral do disposto no art. 21 ou no art. 26, o interessado deverá submeter solicitação de dispensa à Ancine, que, caso reconheça a impossibilidade alegada, pronunciar-se-á sobre as condições e limites da dispensa parcial do cumprimento das obrigações, conforme regulamento específico.
§ 1º A Ancine poderá reconhecer a impossibilidade de cumprimento integral do disposto no art. 22 desta IN, levando em consideração, os seguintes fatores:
I – porte econômico da empresa, consideradas suas relações de vínculo, associação, coligação ou controle;
II – atuação no mercado audiovisual brasileiro há menos de (um/dois) anos
III – (RETIRADO)
IV – número de assinantes do(s) canal(is) de programação.
INCLUSÃO: V – ser programadora com sede em país do Sul Global com o qual o Brasil mantém acordo de cooperação, com programação majoritariamente baseada em produções realizadas em países com as mesmas características
§ 2º A Ancine poderá reconhecer a impossibilidade de cumprimento integral do disposto no art. 26 desta IN, levando em consideração, entre outros, os seguintes fatores:
I – número de assinantes da empacotadora;
II – porte econômico da empresa, consideradas suas relações de coligação, associação e controle.
INCLUSÃO: III – ser empacotadora com atuação limitada a uma das regiões administrativas do país
§ 3º Em quaisquer dos casos previstos neste artigo, a empresa deverá fundamentar o seu pedido, que poderá ser negado ou acatado integral ou parcialmente pela Ancine em decisão motivada, POR TEMPO DETERMINADO, CONFORME REGULAMENTO ESPECÍFICO.
Justificativa: Cumprindo com o determinado no Artigo 21 da Lei 12.485, a Ancine deve estabelecer os critérios que serão observados para conceder a dispensa das obrigações das cotas de conteúdo brasileiro e quais os limites para estas. Conforme colocado no caput do Art. 33 desta IN, o tema será tratado de forma mais pormenorizada em regulamento específico que será posteriormente colocado em consulta pública. Desta forma, esta IN define alguns parâmetros gerais mínimos que, conforme consta da exposição de motivos elaborada pela Ancine, servirão de baliza para que as empresas saibam em que situações elas poderão inicialmente requerer a dispensa das obrigações de veiculação prevista na lei. Parece-nos que o principal parâmetro utilizado pela agência, com o qual estamos de acordo, é o da garantia da competitividade visando o ingresso de novos agentes econômicos no mercado do audiovisual de acesso condicionado.
Entre os aspectos econômicos, incluir o perfil de programação como fator a ser avaliado para concessão de dispensa das obrigações pode criar uma situação que coloque os objetivos da lei 12.485 em risco. Ao sugerir que um canal possa ser dispensado das cotas por motivos como esses, a agência desestimula a criatividade dos programadores na busca de programação brasileira e independente que combine com seu perfil de canal, e abre um enorme flanco para que aquilo que a lei prevê como exceção seja considerada possibilidade corrente.
Em segundo lugar, deve ser excluída a expressão ‘entre outros’. Se o objetivo da inclusão do artigo é mencionar os casos em que será analisada a dispensa de cotas, então não faz sentido deixar outras possibilidades em aberto. Em terceiro lugar, deve se retirar a expressão ‘dispensa integral’. Não há casos de impossibilidade que justifiquem a dispensa integral das cotas – isso descaracterizaria o espírito da lei –; qualquer dispensa deve ser apenas parcial.
É preciso ainda delimitar mais claramente qual tempo de atuação no mercado brasileiro poderá ser considerado para dispensa de cotas, a fim de ampliar a previsibilidade regulatória. A sugestão é fixar este tempo em um ou dois anos.
Além disso, propomos também dois novos fatores de análise para dispensa de cotas. Para a dispensa de cotas de programação, a sugestão é incluir como possível critério a origem da programadora, favorecendo aquelas baseadas nos países do Sul Global com os quais o Brasil mantém acordos de cooperação (como Mercosul, IBAS etc.). Esse critério faria com que a dispensa de cotas pudesse ser usada como estímulo ao intercâmbio cultural entre estes países.
Para a dispensa de cotas de canais, a sugestão é incluir como critério as empacotadoras que atuam apenas em uma das cinco regiões do Brasil. Isso deixaria mais claro o objetivo de usar essa dispensa para fomentar a competição no mercado da TV por assinatura.
Em relação ao parágrafo 3°: Como posto na exposição de motivos publicada pela Ancine para elucidar as escolhas feitas pela agência ao apresentar sua IN, a dispensa da obrigação da veiculação das cotas em virtude de fatores econômicos – “para incentivar a atuação de novos canais/programadoras no mercado audiovisual brasileiro”, “visando o incremento do ambiente competitivo e o aumento da diversidade da oferta de conteúdos audiovisuais e de canais de programação” – é uma “férias regulatória” para permitir que os novos agentes econômicos experimentem o mercado brasileiro sem ter que incorrer num alto custo inicial. Estamos de acordo com o instrumento indutor, mas ele deve ter caráter provisório e de adequação destes agentes ao mercado brasileiro e às exigências regulatórias do país. Portanto, é fundamental que este caráter esteja explicitado na IN.
Art. 34
Sugestão: EXCLUSÃO
Justificativa: Ao propormos a exclusão do inciso III do parágrafo I do artigo 33, fundamentamos nossa justificativa na necessidade de se ampliar o debate sobre o conceito de perfil de programação e, derivado disto, o que pode ou não ser considerado pela Ancine de “divergência significativa do perfil de programação a que se propõe o canal”. Alguns exemplos são citados na exposição de motivos: “existem no mercado canais especializados exclusivamente em ‘animação para jovens e adultos’ ou ‘filmes antigos’. No primeiro caso poderia haver dificuldades no cumprimento das obrigações de conteúdos audiovisuais brasileiros, no segundo caso o cumprimento poderia ser impossibilitado pelo dispositivo, presente na lei, que diz que metade dos conteúdos teriam que ter sido produzido nos últimos sete anos”.
Acreditamos que este debate deve ser aprofundado em regulamento específico, como já propõe, inclusive, a Ancine. Antecipá-lo sem o devido tempo para maturação de alternativas seria criar um precedente regulatório que posteriormente se torne desnecessário. Vejamos um ponto de vista diferente do que propõe a Ancine nos casos tomados como exemplo.
No primeiro, supor de antemão que o mercado nacional de animação não teria condições de abastecer canais especializados talvez seja algo precipitado. Este mercado vem crescendo muito nos últimos anos e, inclusive, tem sido alvo de interesse de grandes conglomerados internacionais de comunicação. Os mesmos desafios econômicos que a lei coloca para o setor do audiovisual brasileiro e para as produtoras independentes será enfrentado por todos os segmentos, inclusive o da animação, não sendo este argumento, em nossa opinião, suficiente para solicitação de dispensa das obrigações de veiculação previstas na lei.
No segundo caso, dos canais de “filmes antigos” o debate realizado com mais especificidade em IN própria para o assunto pode trazer alternativas para que o desejo do legislador – e da sociedade brasileira – de promover o conteúdo audiovisual brasileiro, ao aprovar depois de amplo debate a lei 12.485, seja respeitado. A lei tem um componente de dinamização da economia do audiovisual brasileiro, mas tem também um explícito viés cultural. Uma alternativa, que pode ser colocada aos canais especializados em filmes antigos, é cumprir uma parte da cota – sem a necessidade de transferi-la para outro canal – com filmes antigos brasileiros. O que se coloca para a reflexão com este argumento é: não existem outros caminhos regulatórios para garantir o espírito da lei sem ferir as características próprias do mercado de TV por assinatura e sem criar mecanismos complexos de transferência de obrigações entre canais que podem ser utilizados para desvirtuar o que se pretende com a lei? A justificativa, então, para a exclusão deste artigo está em consonância com o que propomos para o artigo 33 – fazer este debate de forma mais aprofundada no momento apropriado.
Além dos problemas já citados, a possibilidade de transferência de cotas gerará uma tendência a que os canais de maior valor agregado, que têm mais prestígio entre os usuários, transfiram cotas para os canais de menor valor agregado. Isso pode fazer da ausência de obrigações de cumprimento de cota um fator que aumenta a diferença entre os canais de maior e menor valor agregado, transformando as cotas em fator de ‘desprestígio’. Assim, se mantido o artigo, o que nos parece uma opção equivocada, devem ser incluídos entre os critérios para transferência de cota a análise do valor agregado dos canais, e serem colocados como referência um perfil similar de programação e a distância entre os canais no lineup.
Consulta pública em forma de perguntas
Pergunta 1.
Sugestão: Nesta IN, prever apenas uma regulamentação posterior sobre as questões relacionadas à reprise, em uma IN específica que seja publicada até um ano depois da entrada em vigor da lei. Esta regulamentação específica deve considerar, entre outros fatores:
– número máximo de exibições da obra dentro de um certo período
– período máximo de exibição da obra para efeito de contagem das cotas
– possibilidades de canais diferentes da mesma programadora utilizarem as mesmas obras para contagem de cotas
– impedimento de modalidades de ‘cumprimento criativo’ (creative compliance) que contrariem os princípios de diversidade da lei
Justificativa: Neste momento, não há estudos consistentes que permitam prever o comportamento do mercado e a reação dos usuários. Antes de normatizar, é preciso avaliar o comportamento dos agentes econômicos e observar o interesse do usuário. Deve-se, então, prever, nesta IN, uma regulamentação posterior sobre as questões relacionadas à reprise, em uma IN específica que seja publicada até um ano depois da entrada em vigor da lei. Esta regulamentação específica deve considerar, entre outros fatores:
– número máximo de exibições da obra dentro de um certo período
– período máximo de exibição da obra para efeito de contagem das cotas
– possibilidades de canais diferentes da mesma programadora utilizarem as mesmas obras para contagem de cotas
– impedimento de modalidades de ‘cumprimento criativo’ (creative compliance) que contrariem os princípios de diversidade da lei
Pergunta 2.
Sugestão: Não mais que 30 minutos a cada 2 horas, contando os intervalos entre as horas cheias em qualquer período do dia
Justificativa: O tempo de publicidade deve ser contado levando em conta a percepção do usuário, que não passa todo o dia em frente à televisão. Ao mesmo tempo, deve ser também levado em conta o tipo de programação veiculada na TV por assinatura, que em geral tem programas de até duas horas de duração (filmes, eventos esportivos etc.). Assim, é importante que a publicidade no horário nobre não possa contar com mais de 30 minutos a cada 2 horas, contando os intervalos entre as horas cheias.
Propostas para a consulta pública sobre texto de modificação da IN 91
Art. 3
Sugestão: Alteração no Art. 1º, inciso XLV. A pessoa jurídica na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e poder de eleger a maioria dos administradores OU SOCIEDADE NA QUAL ESTES DIREITOS PERMANENTES DE SÓCIOS ESTEJAM SOB CONTROLE COMUM OU SEJAM EXERCIDOS MEDIANTE A EXISTÊNCIA DE ACORDO DE VOTOS, INDEPENDENTEMENTE DO SEU PERCENTUAL DE PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL VOTANTE.
Justificativa: O texto presente na proposta de IN publicada pela Ancine está baseado na Lei das S/A. Essa opção pode nublar relações de controle existentes de fato e que podem desvirtuar o espírito da lei. Um exemplo é o poder de veto de acionistas minoritários na definição de inclusão de canais no lineup por empacotadoras. Parece-nos imprescindível deixar explicito na caracterização de controle adotada pela Ancine que o acordo de votos que preveja ações que configurem preponderância nas deliberações sociais de uma empresa sejam considerados para indicar relações de controle. A fim de manter a segurança jurídica buscada pela agência, a proposta adota a redação da resolução 247 da Comissão de Valores Mobiliários para definir Pessoa Jurídica Controlada.
É importante salientar que a Lei das Sociedades Anônimas (6.404/1976), em sua redação original, optou por não estipular um critério quantitativo (por exemplo, de ações com direito a voto) para definir o exercício do controle de uma dada empresa. Ao contrário, a redação legal nos apresenta o conceito relativamente amplo de “preponderância nas deliberações sociais”, permitindo que a regulação defina os contornos específicos de tal preponderância, inclusive ressalvando as especificidades de cada órgão regulador. Foi o que fizeram, entre outros, a Comissão de Valores Mobiliários (Instruções 247 e 469), a Agência Nacional de Telecomunicações (Resolução 101), o Conselho Monetário Nacional (3619) e o Conselho Federal de Contabilidade (Resolução 1241). Em todos estes casos, o regulador não se limitou ao conceito legal, mas exerceu sua função regulatória, definindo, no âmbito de sua alçada, o que se entende por “preponderância nas deliberações sociais”.
Art. 4
Sugestão: Manutenção (com modificação de texto) do parágrafo 1°
§1º Nos casos em que um agente econômico já tiver realizado o registro completo de pessoa jurídica, se constatada, posteriormente, a apresentação de informações incorretas ou a omissão de informação relevante para a avaliação de ocorrência de controle ou coligação, a ANCINE poderá aplicar as sanções previstas no art. 14 da Lei 11.437/2006, observando-se o devido processo administrativo de que trata a Lei 9.784/1999, sem prejuízo da apuração da infração administrativa descrita no art. 22 da Medida Provisória 2.228-1/2001, e seu regulamento.
Justificativa: Este trecho da Instrução Normativa 91 trata da hipótese de que um agente econômico cujo registro é obrigatório na Ancine, por erro ou omissão, não dê à agência todas as informações necessárias para que ela apure suas relações de controle e coligação com outros agentes econômicos. Tal erro ou omissão pode levar a Ancine a classificar de forma imprecisa este agente econômico. Por exemplo, uma programadora que tenha vínculo societário (de coligação ou controle) com uma empacotadora e/ou distribuidora, e não informar tal vínculo à Ancine, poderá ser classificada como “programadora independente” sem o ser de fato e, a partir daí, auferir vantagens indevidas (como, por exemplo, a cota para canais de programadoras independentes, prevista na Lei 12.485).
Sendo assim, o que se espera de um órgão regulador é que, constatado o erro ou omissão por parte do agente econômico, seja aberto um processo administrativo, conforme disposto na Lei 9.784/1999, resguardando o direito ao contraditório, para apurar se houve dolo e definir, apenas se couber, as penalidades a serem aplicadas.
Embora a Ancine tenha anunciado a intenção de construir uma IN que consolide todas as sanções, parece-nos ruim deixar neste momento um vácuo regulatório que pode afetar a aplicação da IN 91. Se a proposta de exclusão não for por este motivo, mas por questão de mérito, parece-nos importante salientar que não há justificativa cabível para que a Ancine abra mão de instaurar o devido processo administrativo quando perceber que a informação fornecida pelo regulado está errada.
Óbvio que isso não significa nenhum tipo de rito sumário, porque a 9.784/1999 é muito clara ao definir que os processos administrativos deverão se basear em critérios republicanos, tais como: atuação conforme a lei e o Direito; atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé; adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público; indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão; observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados; e garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio.
Ao mesmo tempo, a lei também é clara ao dizer que é “vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei”. Ou seja, a Ancine não pode abrir mão de cumprir suas obrigações legais, inclusive punindo quando for o caso. Mesmo que os interesses potencialmente afetados possam ser de grande influência política e atuação oligopólica. Ou melhor, é justamente nesses casos que se espera a intervenção do órgão regulador.
Art. 5
Sugestão: Duas sugestões:
– Incluir no §2º – XIV – previsão, em estatuto, contrato ou acordo de acionistas, de poder de veto em qualquer matéria ou deliberação que trate especificamente das atividades de empacotamento ou programação.
– Manutenção do inciso IV do parágrafo 2°
Justificativa:
– Na versão anterior da IN 91, o poder de veto era parte da definição de controle. Na versão proposta pela agência, essa característica não aparece sequer como indício de coligação ou controle. É absolutamente fundamental que este aspecto volte a ser analisado como indício de preponderância nas deliberações sociais ou influência significativa, a fim de impedir controles ‘de facto’ que não sejam previstos ‘de direito’.
– O artigo 5° da Instrução Normativa 91 é totalmente aderente à vontade da Lei das S/As, no sentido de permitir ao órgão regulador definir, respeitado o direito ao contraditório, o que ele entende, em sua respectiva seara, por “preponderância nas deliberações sociais” e “influência significativa”. Assim, o parágrafo 2° deste artigo menciona uma série de indícios que devem ser levados em consideração pela Ancine na hora de efetuar sua avaliação sobre as possíveis relações de coligação ou controle entre empresas. A listagem dos indícios é fundamental para resguardar a necessária previsibilidade do ato regulatório, permitindo que o agente regulado saiba com antecedência por quais critérios será avaliado.
A relação de indícios apresentada pela Ancine é praticamente uma adaptação dos critérios empregados pela Comissão de Valores Mobiliários (Instrução 247) e a Agência Nacional de Telecomunicações (Resolução 101) e já testados há anos em suas respectivas atuações regulatórias.
Contudo a Ancine propõe retirar um destes indícios (“recebimento permanente de informações contábeis detalhadas, bem como de planos de investimento”). Se ele é aceito por instituições com a CVM como referência, não há porque a Ancine retirar este indício. Assim, a área técnica da Agência terá o necessário subsídio regulatório para realizar estudos que comprovem, ou não, a existência de vínculos societários entre os agentes econômicos do audiovisual.
Por fim, se, como parece indicar em sua exposição de motivos, a Agência acredita que a presença de tal indício pode representar prejuízo para agentes econômicos de pequeno porte, torna-se necessário que a Ancine explique como poderia ocorrer este suposto prejuízo e se ele é superior ao risco de permitir a concentração vertical ao longo da cadeia produtiva da TV paga brasileira. Não cabe ao regulador apenas mencionar eventual prejuízo, sendo necessário que ele seja demonstrado da forma mais cabal possível.
Art. 20
Sugestão: Manutenção do parágrafo 4°
Justificativa: Os artigos 14 a 19 da Instrução Normativa 91 tratam do procedimento necessário para que um agente econômico faça seu registro na Ancine. Já o artigo 22 descreve como se dá o processo de revalidação deste registro, depois que forem transcorridos cinco anos.
Já os artigos 20 e 21 discorrem sobre a necessidade de manter atualizados os dados do agente econômico entre o seu registro e a revalidação deste. Trata-se de uma obrigação regulatória para diversos agentes econômicos, cujo registro/cadastro na Ancine é obrigatório, seja por força da Medida Provisória 2228-1/2001 seja por conta da Lei 12.485.
O parágrafo 4° do artigo 20 trata especificamente da possível sanção, respeitado o devido processo legal de que trata a Lei 9.784/1999, que sofrerá o agente econômico que, instado pela Ancine, não enviar os documentos complementares.
Por exemplo, caso a Ancine apure a possível existência de vínculo societário entre uma programadora e uma empacotadora ou distribuidora, a Agência tem a prerrogativa legal de solicitar outros documentos ao regulado. Ela pode requerer, entre outros, os acordos entre acionistas da empacotadora ou da distribuidora para comprovar se há, ou não, “preponderância nas deliberações sociais” ou “influência significativa”. Portanto, se há controle ou coligação. O que o parágrafo 4° do artigo 20 faz é definir que este agente econômico será punido, depois do devido processo administrativo, caso não envie os documentos requeridos.
Embora a Ancine tenha anunciado a intenção de construir uma IN que consolide todas as sanções, parece-nos ruim deixar neste momento um vácuo regulatório que pode afetar a aplicação da IN 91. Se a proposta de exclusão não for por este motivo, mas por questão de mérito, parece-nos importante salientar que a supressão deste artigo não fortalece a atividade regulatória da Agência, pois a Ancine continua podendo requerer os documentos necessários para a análise da relação societária, mas não mais poderá punir o seu não envio. Na prática, a Agência passa a depender da boa vontade do regulado, em evidente conflito com seu papel regulador.