Pioneiro no estudo das comunidades
virtuais, o filósofo defende o papel do educador como
administrador de conhecimento compartilhável.
Bruno De Vizia
Há 15 anos, o filósofo e teórico Pierre Lévy se sentia só, ao ser um
dos primeiros a falar de inteligência coletiva. Hoje, o conceito já
encontra boa aceitação nas universidades e na internet, mas ele ainda
se sente só. O motivo agora é a criação da “web semântica”, ou
seja, uma linguagem que traduza para computadores todos os significados
das línguas naturais (veja ARede nº 14). Levy esteve no Brasil, onde
participou de debates com educadores e representantes dos portais
EducaRede, mantido pela Fundação Telefônica, e Rede Social SP, que
reúne cem organizações sociais, empresariais e de governo.
Para o teórico, o Brasil é parte de um fenômeno global, de uma cultura emergente que é o crescimento das comunidades online.
E a criação de uma comunidade é uma ação cultural, um problema político
e de liderança. “Não se constrói uma comunidade como se constrói uma
casa, com um tijolo sobre o outro”, explica. Ele destaca que um sentido
compartilhado do que é importante faz-se necessário para o
florescimento de uma comunidade online. Neste aspecto, o novo
papel do educador é ajudar pessoas a aprenderem colaborativamente, não
apenas transmitir conhecimento. “Se pensarmos sobre as habilidades dos
educadores, elas têm mais a ver com a administração do conhecimento e
em como ajudar os aprendizes a se orientarem dentro do conhecimento, do
que ensinar a como funcionar online”, avalia Lévy.
Ele defende que a administração do conhecimento não seja
privilégio das empresas de alta tecnologia, e que seu corpo de
metodologias, experiências e instrumentos possam ser utilizados pelos
movimentos sociais, pelo setor público e pelo terceiro setor. O ponto
chave seria fazer a arquitetura do conhecimento para ajudar a todos a
contribuir e se orientar. Essa arquitetura “se parece mais com um
código genético, em que cada comunidade pode ser vista como uma espécie
de conhecimento, algo vivo e que tenha sua própria identidade”,
compara. E essa identidade não existiria sem uma memória coletiva, e,
na era cibernética, é papel dos novos educadores auxiliar a
participação e o crescimento de uma memória comum.
Por isso, Lévy se diz a favor dos computadores nas escolas, com acesso
livre à internet e em alta velocidade. Ele considera absurdo restringir
o acesso das crianças à essa “fonte extraordinária de conhecimento,
instrumento de colaboração e comunicação, um equipamento básico que dá
suporte a toda tecnologia intelectual de nossa época”. Na opinião do
filósofo, “o pensamento crítico e a capacidade de avaliar o valor da
informação precisa ser ensinado na escola”. Lá, diz ele, “deveria ser o
lugar onde a gente aprende a gestão do conhecimento”. O pensador também
rebate os argumentos dos que citam a exposição a conteúdos duvidosos
como um motivo para limitar o acesso de crianças à internet. “Claro que
há pornografia e crime na rede, assim como na sociedade. Mas, por
acaso, há alguém dizendo que as crianças não devem ir para a
sociedade?”