PontoCidadania – Há muita informação. Para quê?

Evento promovido pelo Pnud debate tecnologias que possam incrementar o uso dos grandes bancos de dados para solução de demandas concretas dos cidadãos. 


Evento promovido pelo Pnud
debate tecnologias que possam incrementar o uso dos grandes bancos de
dados para solução de demandas concretas dos cidadãos.
  Fernando Couto

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) abriu, em
Brasília, no dia 21 de setembro, o ciclo de eventos “Tecnologias
Parceiras”. No 1º Encontro do Ciclo Tecnologias da Informação e
Comunicação como Ferramentas nas Políticas Públicas, instituições que
desenvolvem soluções nas áreas de políticas públicas e de
Desenvolvimento Humano Sustentável (DHS) debateram seus projetos para
eventuais parceiros. Foram apresentados softwares
e projetos que buscam melhorar o aproveitamento das informações
coletadas para a criação de políticas, detecção de fraudes e formação
de indicadores sociais.


Site
do Inpe com imagem do foco de queimadas na região do Amazonas; imagem
de de satélite de Florianópolis; concepção artística do satélite
CBERS-2 em Órbita.

A explosão dos dados que, paradoxalmente, leva-nos hoje, em muitas
áreas, a uma crescente falta de informação, foi talvez o grande fio
condutor do debate promovido pelo Pnud, que reuniu cerca de 40
consultores participantes. E que trouxe ao palco algumas tecnologias
dirigidas a fazer a ponte entre o poder da tecnologia e a aplicação
concreta de políticas públicas. Entre elas, o sistema Tamanduá, para
peneirar grandes bases de dados. Parece consensual, para os
debatedores, que, em praticamente todas as áreas do conhecimento,
existe abundância de dados e falta de informação. O fenômeno dos
grandes e megabancos de dados vem esbarrando na dificuldade de
aplicabilidade prática. Um exemplo citado foi a falta de senso com que
funcionam os caixas eletrônicos. A mãe de um PhD em Ciência da
Computação, com quase 70 anos de idade, simplesmente desesperou-se ao
perceber que o banco se recusava a receber sua senha, porque ela gastou
dois ou três segundos a mais entre digitar a sua senha e o seu código
eletrônico.

O Tamanduá, segundo seu idealizador, o professor PhD Wagner Meira
Júnior, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é uma
plataforma de serviços de mineração de dados, para apoio a gestão e
decisão governamentais. Suas principais aplicações estão voltadas para
a área de compras e contratações no governo federal, em atividades como
análise de execução orçamentária, detecção de padrões de compras (para
identificação de distorções e fraudes), acompanhamento de gestão de
estoques e de consumo de bens, racionalização dos cadastros de
materiais e construção de modelos georreferenciados de estimativa de
custo de produto. A extensão de seu uso para outras finalidades está
aberta, diz o pesquisador, uma vez que a versão atual admite a
parametrização das regras de associação usadas no processo de mineração
de dados via  .


De acordo com Wagner, os serviços de mineração de dados surgiram em
função da alta taxa de informatização alcançada nos últimos anos, que
conduziu à chamada explosão combinatória de dados em grandes bases. E
também a outros fenômenos, tendo como conseqüência o excesso de dados e
pouca informação. Ou seja, altos volumes de dados distribuídos em
muitos bancos de dados não integrados, aumento substancial do número de
usuários, pessoas que não sabem bem o que procuram, dados originalmente
ruins, falta de pessoal qualificado. Nesse caso, diz Wagner, “o que
abunda prejudica, sim”.

Ele explica que a mineração de dados aparece, então, como um processo
para determinar, por meio de técnicas de computação, conhecimentos
novos e potencialmente úteis, a partir de grandes bases de informações.
As técnicas de mineração são aplicadas aos dados, produzindo diversos
padrões. Os padrões são avaliados, gerando o conhecimento procurado, em
língua de gente. A mineração, em função de sua escalabilidade,
aplica-se a qualquer banco de dados, desde o de supermercado, com 5 mil
produtos na prateleira, até os grandes, como os armazéns de dados do
Serpro, do IBGE, do Tribunal de Contas da União, do Pregão Eletrônico,
até do Sistema Único de Saúde.

“Então, no nosso sistema, que desemboca no projeto Tamanduá, oferecemos
uma arquitetura orientada para serviços e baseada em padrões abertos, e
acesso através de interface www”, diz o professor da UFMG. Ou seja, com
o Tamanduá, pode-se construir uma plataforma escalável de serviços de
mineração de dados reais para suporte de decisões.

Domingo no parque


Região de Buenos Aires e do
Rio da Prata, na base de
dados do Inpe.

Até agora, destaca Wagner, os pesquisadores aprenderam com as
dificuldades, mas ainda falta muito mais. “Descobrimos, por exemplo,
que, atualmente, a maioria do parque computacional do governo é
proprietário, a maioria dos registros no país é feita à mão, o que nos
leva a uma conclusão: nestas condições, o que temos não é gestão, é
incêndio”. Para se ter uma idéia, recentemente, a UFMG, cuja sede está
em Belo Horizonte, fez uma avaliação do cadastro dos seus 100 mil
estudantes, feito ainda manualmente. “Sabem de quantas formas
diferentes escreveram a palavra Belo Horizonte? Exatamente 56 maneiras
diferentes”, conta Wagner. No trabalho de implantação do projeto, há
outras descobertas, como a determinação do horário mais periogoso nas
favelas de Belo Horizonte. Na mineração e cruzamento de dados das
comunidades pesquisadas, verificou-se que a maior incidência de crimes
de homicídio é entre 14h e 16h dos domingos.

Para o professor, são muito amplas as perspectivas do projeto Tamanduá,
que vai transferir tecnologia, processos e metodologia para as empresas
melhorarem sua eficiência computacional, com apoio da Financiadora de
Estudos e Projetos (Finep). A Finep também poderá liberar recursos para
as empresas que queiram adotar o projeto Tamanduá e aumentar sua
eficiência gerencial.


Primeiras imagens do Brasil
coletadas pela câmera CCD do
satélite CBERS-2: região
noroeste do Estado de São Paulo.

Segundo Francisco Gaetani, coordenador da área de governo do Pnud, os
sistemas de informação situam-se hoje no cerne das ferramentas dos
governos. Eles seriam, cada vez mais, os grandes consumidores de TICs
em função das diversas políticas públicas, no que Gaetani  chama
“mar­ketização” dos serviços públicos. O desafio que o governo
enfrenta, hoje, na sua opinião, é mobilizar esse ativo estratégico e
controlar a atuação dos atores privados, a demanda pela terceirização.
“O poder de decisão está cada vez mais fora do governo”. Por isso,
afirma, as comunidades e os especialistas devem ser capazes de gerar
consensos sobre as melhores práticas para fortalecer a esfera pública.
“Temos que adequar os sistemas de informações tecnológicas a
infra-estrutura já existente, política de informática e políticas
públicas”.

A elaboração, planejamento, avaliação e disponibilização dos resultados
das políticas, assim como a capacitação dos agentes envolvidos, são
processos complexos que, cada vez mais, exigem o apoio das TICs. O que
o Pnud procura, nos países onde atua, é identificar as tecnologias
(TICs para o desenvolvimento, ou TICD) que possam contribuir de forma
concreta para esses processos. Assim, inspirado pelo trabalho do
Asia-Pacific Development Information Programme (APDIP) — com sua rede
internacional de software aberto, a IOSN, o Pnud está criando, agora, o Centro Regional de Software
Livre e Aberto da América Latina e Caribe (CRSLAC), com o apoio do
governo federal, do governo estadual de Minas Geras e da Universidade
Federal de Minas Gerais, onde ficará hospedado.

Diversas inovações levantadas pelos estudiosos têm grande potencial e
estão sendo usadas por governos e instituições, mas sem conseguir um
nível de maturidade e entendimento para sua fácil disseminação.
Questões como interfaces não amigáveis, falta de documentação 
apropriada, disponibilidade de plataformas diversas (Linux e Windows),
e necessidade de versões multilíngües são obstáculos à sua aplicação
maciça. Para superar essas barreiras e estender o alcance dos produtos,
o CRSLAC pretende fomentar as parcerias entre instituições com demandas
semelhantes para o avanço de seus projetos.

Uma visão geográfica


O TerraView, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de
São José dos Campos (SP), foi apresentado pela coordenadora da divisão
de processamento de imagens, professora Núbia Vinhas, gerente de
desenvolvimento do projeto TerraLib. Trata-se de um aplicativo
construído sobre a TerraLib, uma biblioteca de software
aberto voltado para o geoprocessamento de dados. Seu principal objetivo
é apresentar à comunidade um fácil visualizador de dados geográficos,
com recursos não só de consulta, mas também de análise desses dados,
com ferramentas que incorporam, na fase atual, o aspecto temporal e
espacial.

Segundo Núbia, a divisão de processamento de imagens do Inpe trabalha
com a noção de territórios digitais e sistemas de análise dos dados de
processos físicos e sócio-econômicos espaciais, junto com o SIG,
Sistema de Informação Geográfico. É lá que se desenvolvem, através do
sensoriamento remoto operado pelos satélites CBER 1 e 2, o mapeamento
do desmatamento da Amazônia e o monitoramento das queimadas em todo o
Brasil. Um grande banco de dados que alimenta o trabalho e as políticas
de preservação ambiental do Ministério do Meio Ambiente. De lá, também
saem os dados e as imagens para subsidiar o planejamento de novas
linhas de metrô, o sensoriamento do número de moradores em favelas por
bairros, a geocodificação de endereços via satélite, o mapeamento para
o IBGE, para o Exército e muitos tesouros geo-espaciais.


http://www.dpi.inpe.br/terraview/index.php

http://tamandua.speed.dcc.ufmg.br/ — Portal do Sistema Tamanduá, na UFMG.

www.pnud.org.br
– Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud)