Prêmio ARede 2014 – Personalidade do ano
Marco Civil é garantia da democracia na rede
O deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ) teve, como relator, papel relevante no debate do marco civil da internet, que foi aprovado graças ao empenho pessoal da presidente Dilma Rousseff.
Texto Lia Ribeiro Dias | Foto Laycer Tomaz
ARede nº 101 – especial novembro de 2014
O QUE LEVOU o deputado federal Alessandro Molon, do PT do Rio de Janeiro, a lutar pela relatoria do Marco Civil da Internet, foi sua convicção de que a neutralidade da rede é essencial para garantir a democracia na rede, de que todos os internautas tenham seus pacotes tratados da mesma forma, sem privilégio de uns sobre outros.
Em seu primeiro mandato na Câmara dos Deputados, Molon, eleito a Personalidade do Ano do Prêmio ARede de 2014, teve os holofotes dirigidos à sua atuação, tanto pelos militantes da liberdade na web, como pelos provedores de conexão que queriam alterar a redação do artigo referente à neutralidade.
“O prêmio é um justo reconhecimento”, afirma Beá Tibiriçá, diretora do Coletivo Digital, que acompanhou os embates no Parlamento em torno do Marco Civil. Ela conta: “Molon se manteve de pé em todas as indas e vindas do projeto. Negociação era seu nome quando a conjuntura exigia. Em outros momentos, ficava clara sua disposição para o confronto direto. Isso permitiu que o texto aprovado garantisse os três princípios básicos do movimento: neutralidade, privacidade e liberdade de expressão”.
A relatoria do Marco Civil da Internet – o projeto de lei do Executivo começou a tramitar no Congresso em 2011 e só foi aprovado em abril de 2014 – colocou Molon no centro das pressões. “Houve muita movimentação em função de visões divergentes, mas são movimentos legítimos”, diz ele, que antes de chegar a Brasília teve dois mandatos de deputado estadual pelo PT fluminense – na Assembleia do Rio de Janeiro, seu foco foram os direitos humanos e a segurança pública. E também a educação. Afinal, foi sua experiência como professor de História de escola pública que o levou à política.
“Descobri que a política era o caminho para influir na qualidade da educação, tirar a escola pública da precariedade, melhorar o ensino, a segurança, a relação com os pais de aluno”, relata ele. E para se preparar melhor para a arena da política, resolveu fazer a faculdade de Direito, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, onde hoje é professor.
Sua experiência na sala de aula e na rádio Catedral, uma rádio católica também no Rio de Janeiro, onde fez trabalho voluntário, desenvolveu suas habilidades para a comunicação. “Isso me ajudou na vida pública”, relata o mineiro de Belo Horizonte, militante católico, casado e pai de dois filhos, que em outubro completou 43 anos.
Apesar de seu reconhecido desempenho no papel de relator do Marco Civil, Molon diz que se não fosse o empenho pessoal da presidente Dilma Rousseff talvez o projeto ainda estivesse tramitando. “O episódio da espionagem dos dados de brasileiros, da própria presidente da República e de estatais pelo governo estadunidense, após denúncia de Snowden [Edward Snowden, analista de inteligência da National Security Agency – NSA], deflagrou o processo que levou à aprovação do Marco Civil”, avalia.
Agora, passadas as eleições presidenciais, seu empenho está dirigido ao processo de regulamentação da lei. Em sua avaliação, o processo deveria começar ainda antes do final do ano e vai seguir o mesmo caminho de construção coletiva que levou à formulação do Marco, conduzido no final da segunda administração Lula pelo Ministério da Justiça. Molon acredita que os dois pontos mais delicados são justamente a neutralidade da rede – ou seja, quais exceções podem ser admitidas sem reverter em privilégios – e a guarda de logs dos usuário.
Este item, o artigo 15 da nova lei, foi duramente criticado pelos ativistas da liberdade na rede. Molon entende, no entanto, que a regulamentação pode ser mais restritiva, estabelecendo exatamente que tipo e porte de empresa fica obrigada a guardar os logs, em quais circunstâncias. “Esse é um bom debate. Não serão incluídas na regulamentação coisas que não façam sentido, como obrigar que universidades e ONGs a guardar logs. E mesmo em relação a empresas poderá se estabelecer um corte”, diz ele.
Ele sabe que a regulamentação, que será feita com participação também pela internet, será um momento de novos embates em torno desses dois pontos mais polêmicos. Mas acredita que será possível construir uma boa regulamentação.
MEGA NÃO!
Alessandro Molon, então deputado estadual, começou a se envolver com as questões relativas à liberdade na rede e aos direitos dos internautas em 2009, quando foi lançada a vitoriosa campanha Mega Não! contra o projeto de lei (PL 84/99), apresentado pelo então senador Eduardo Azeredo, do PSDB mineiro, que tratava de crimes na internet. “Como advogado e militante dos direitos humanos, passei a ter conhecimento da importância que as primeiras leis relativas à internet fossem leis que garantissem os direitos dos internautas, e não que os criminalizassem. Daí, passei a participar do debate”, relembra.
Foi esse aprendizado que o levou a lutar pela relatoria do Marco Civil, que Tim Bernes Lee, um dos criadores da internet, definiu não como um projeto de internet, mas de direitos humanos na rede. “Sua promulgação pela presidente Dilma, na abertura do NET Mundial, em 23 de abril, foi um momento histórico”, relembra, citando as manifestações de apoio de personalidades estrangeiras e de nomes importantes no universo da internet.